Thames Borges, PhD, psicóloga, pesquisadora INSERM- Métodos e Culturas, Paris, França
Diante dos crescentes fluxos migratórios atuais, as psicólogas Thames Borges e Cigala Peirano e a psiquiatra Marie Rose Moro, publicaram um artigo na Revista Estudos de Psicologia (Campinas, v. 35, n. 2) sob o título “A clínica transcultural: cuidando da parentalidade no exílio”. A partir do relato de um atendimento clínico, apresentam um enquadre diferenciado de trabalho, tendo como referenciais teóricos a psiquiatria transcultural e a etnopsicanálise. A clínica transcultural está ancorada nos conceitos de complementaridade, universalidade psíquica e descentramento cultural desenvolvidos por Georges Devereux (1970) e readaptados na clínica conduzida por Tobie Nathan e Marie Rose Moro (1989). Tendo em vista que famílias desenraizadas podem ficar sem parâmetros para entender e lidar com o sofrimento quando estão em uma nova terra, propõem uma leitura transcultural do sintoma, associando tradições, representações e etiologias culturais a uma técnica terapêutica específica. Nesta, as ações de cuidado empreendidas pretendem englobar tantos aspectos ontológicos, através da busca de representações do si mesmo, de sua origem e identidade; como etiológicos, pela procura dos sentidos atribuídos às eventuais desordens internas. Assim, entendendo que a cultura nos traz uma forma específica de codificação das experiências vividas pelos indivíduos, este enquadre exige uma ampliação das possibilidades de leitura do sofrimento. Ao passo que levanta importantes questionamentos, como por exemplo: quando as pessoas viajam e mudam de cultura, como se modificam seus códigos internos? Como é entendido o sofrimento estando entre duas ou mais culturas?
No intento de aproximar-se mais efetivamente dessas questões, é fundamental que o psicoterapeuta não imponha um enquadre adequado unicamente à própria cultura, mas considere sempre os elementos e objetos simbólicos pertencentes às famílias com as quais trabalha. Já que este modo de atendimento não só exige a análise da transferência e contratransferência afetiva, mas também cultural e considerando que os próprios terapeutas carregam também as suas próprias culturas de origem, as autoras optaram por privilegiar um enquadre grupal, que possibilita uma maior abertura à alteridade do paciente.
A clínica transcultural apresenta-se, portanto, como uma prática psicoterapêutica que utiliza a leitura das teorias culturais como meio para compreender e conter os desequilíbrios emocionais que afetam pessoas em contextos de migração e desenraizamento. Assim, através de uma investigação clínica buscam o aprimoramento das formas de cuidar do sofrimento psíquico.
Referências
DEVEREUX, G. Essais d’ethnopsychiatrie générale. Paris: Gallimard, 1970.
NATHAN, T., MORO, M. R. Enfants de djinné. Evaluation ethnopsychanalytique des interactions précoces. In: LEBOVICI, S.; MAZET, P.; VISIER, J.-P. (Eds.). Evaluation des interactions précoces. Paris: Eschel, 1989. p. 307-340.
Para ler o artigo, acesse
BORGES, T. W., PEIRANO, C. and MORO, M. R. A clínica transcultural: cuidando da parentalidade no exílio. Estud. psicol. (Campinas) [online]. 2018, vol.35, n.2, pp.149-158. ISSN 0103-166X. [viewed 3 September 2018]. DOI: 10.1590/1982-02752018000200004. Available from: http://ref.scielo.org/zg4xvk
Links externos
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