Patrícia Nabuco Martuscelli, Doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo e pesquisadora associada do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) ao decretar a pandemia do novo vírus SARS-CoV-2 que causa a doença COVID-19 relembrou a importância de não deixar ninguém para trás. Contudo, refugiados que são pessoas forçadas a deixarem seus países por causa de perseguições, conflitos armados e graves violações de direitos humanos tendem a ser deixados para trás nas respostas governamentais à COVID-19 por não serem nacionais e não terem direito ao voto. A pesquisa “Refugiados e COVID-19 no Brasil”, desenvolvida pela pesquisadora Patrícia Nabuco Martuscelli do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (NUPRI/USP) tenta entender como refugiados têm vivenciado essa situação no país.
Entre 27 de março e 06 de abril de 2020, foram entrevistados 29 refugiados de diferentes nacionalidades vivendo nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro, dois dos estados mais afetados pela pandemia no país e que adotaram medidas recomendadas pela OMS para lidar com a pandemia. As entrevistas foram realizadas pela ferramenta de chamada de áudio do WhatsApp com o consentimento oral dos entrevistados. Esse material qualitativo apresenta uma fotografia única de como os refugiados estavam vivenciando a pandemia no país nas primeiras semanas em que as autoridades reconheceram a chegada da doença no país.
O artigo “Como refugiados são afetados pelas respostas brasileiras a COVID-19?” publicado na Revista de Administração Pública (RAP, vol. 54, no. 5), traz parte dos resultados dessa pesquisa. Migração e refúgio são competências do governo federal. Assim, esse artigo considera como as medidas adotadas pelo governo federal para responder à pandemia afetaram os refugiados entrevistados. Os resultados conjeturam as reflexões e experiências vividas pelos refugiados decorrentes de ações e inações do governo federal brasileiro.
Os refugiados são afetados principalmente pelo fechamento das fronteiras, direitos à saúde, documentação e assistência social que não foram devidamente considerados pelo governo brasileiro, direitos esses impactados principalmente no contexto da pandemia. O fechamento das fronteiras impediu a entrada de pessoas que poderiam solicitar refúgio, bem como há falta de clareza na possível entrada de familiares de refugiados com vistos de reunião familiar. Refugiados mencionaram a dificuldade de conseguir documentos dado que a Polícia Federal estava fechada e cancelou agendamentos impedindo assim, que refugiados acessassem diferentes direitos. Refugiados também expressaram o medo de ficar doente e de serem discriminados no acesso aos serviços de saúde. Por fim, não estava claro se refugiados poderiam acessar o benefício emergencial e como isso seria feito, especialmente porque o sistema de cadastro estava apenas em português e pedia o RG (documento que refugiados não possuem).
Os refugiados que vivem no Brasil e possuem direitos garantidos na legislação estão entre os diferentes grupos cujas particularidades não foram consideradas nas respostas do governo federal para a pandemia. A COVID-19 atinge a todos os brasileiros (direta ou indiretamente), contudo refugiados são ainda mais afetados por serem deixados para trás nas respostas governamentais e por não terem redes de proteção e apoio como os nacionais. A OMS lembrou a importância da solidariedade e de oferecer respostas para todos os afetados por essa pandemia. Essa pesquisa mostrou que o Brasil não tem feito isso em relação aos refugiados. O estudo ressalta a importância de analisar esse problema considerando a voz e a experiência dos refugiados que vivem no país. Essa é uma importante contribuição para entender em que aspectos refugiados são deixados para trás em países do Sul Global.
Para ler o artigo, acesse
MARTUSCELLI, P.N. Como refugiados são afetados pelas respostas brasileiras a COVID-19?. Rev. Adm. Pública [online]. 2020, vol. 54, no. 5, pp. 1446-1457. ISSN: 1982-3134 [viewed 09 December 2020]. https://doi.org/10.1590/0034-761220200516x. Available from http://ref.scielo.org/5hwmq6
Links Externos:
Revista de Administração Pública – RAP: www.scielo.be/rap
Site da autora: https://sites.google.com/view/patricia-martuscelli
Site do NUPRI: https://nupri.prp.usp.br/
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