Por que a entrega para adoção não substitui o aborto legal?

Roberta Siqueira M. Dieguez, doutoranda em Saúde Pública, Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP), SP, Brasil

Logo da InterfaceCom a criação da “Nova Lei da Adoção” (Lei nº 13.509/2017), toda gestante pode optar pela entrega voluntária do bebê para adoção. No Brasil, o aborto é permitido apenas em casos específicos: violência sexual, risco à vida da gestante ou anencefalia fetal. Apesar de serem direitos distintos, a entrega voluntária tem sido frequentemente promovida como alternativa ao aborto, inclusive nos casos previstos em lei, o que cria mais barreiras ao acesso ao procedimento no país.

Com base em pesquisas de mestrado e doutorado da Faculdade de Saúde Pública da USP, realizadas por Denise Silva e Roberta Dieguez e coordenadas pela professora Cristiane Cabral, o artigo Uso da entrega voluntária como barreira de acesso ao aborto legal em projetos de lei recentes no Brasil publicado na Interface (vol. 28, 2024) busca explorar a relação entre esses dois direitos em movimentos políticos contemporâneos que restringem direitos reprodutivos no Brasil.

Para isso, analisamos projetos de lei recentes que promovem a entrega voluntária como uma alternativa ao aborto legal, o que, na prática, cria um imperativo moral para limitar as decisões das gestantes que têm direito à interrupção legal da gravidez. Entretanto, a gravidez é um processo complexo, que afeta diretamente a saúde física e psíquica da gestante, não se resumindo ao nascimento de um bebê.

Por isso, quando se trata de um caso previsto em lei, cabe a ela a decisão de dar continuidade ou não a esse processo, a qual deve ser orientada por profissionais capacitados.

O artigo busca contribuir para as pesquisas em saúde pública que pretendem identificar e criar estratégias para enfrentar as barreiras ainda existentes para o acesso ao aborto legal no Brasil. Ao analisar leis e práticas que incentivam a entrega voluntária como alternativa ao aborto, destacamos a interferência de interesses políticos e morais que buscam restringir direitos reprodutivos já conquistados.

Fotografia de um bebê deitado nas mãos de um adulto

Imagem: Interface: comunicação, saúde, educação

Esses mecanismos, além de limitar a autonomia das mulheres, meninas e outras pessoas gestantes sobre suas decisões reprodutivas, afetam diretamente o acesso a serviços de saúde seguros e adequados, principalmente aquelas que foram vítimas de violência sexual​.

Portanto, destacamos a importância de monitorar o impacto dessas políticas na autonomia das mulheres e outras pessoas que gestam para entender melhor como políticas de incentivo à adoção podem moldar o cenário dos direitos reprodutivos.

A discussão também aponta para a necessidade de um diálogo constante entre saúde pública e legislação, visando assegurar que direitos já garantidos por lei não sejam restringidos por novas práticas institucionais ou discursos moralizantes.

Para ler o artigo, acesse

DIEGUEZ, R.S.M., SILVA, D.C. and CABRAL, C.S. Uso da entrega voluntária como barreira de acesso ao aborto legal em projetos de lei recentes no Brasil. Interface – Comunicação, Saúde e Educação [online]. 2024, vol.28, e230472 [viewed 05 February 2025]. https://doi.org/10.1590/interface.230472. Available from: https://www.scielo.br/j/icse/a/ZNLH3qddsnPNPVKtdYtfBnj/?lang=pt

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Como citar este post [ISO 690/2010]:

DIEGUEZ, R.S.M. Por que a entrega para adoção não substitui o aborto legal? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2025 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2025/02/05/por-que-a-entrega-para-adocao-nao-substitui-o-aborto-legal/

 

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