Sandra Gomes, Professora do Departamento de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Natal, RN, Brasil.
Francymonni Yasmim Marques de Melo, Bacharela em Gestão de Políticas Públicas e Mestra em Estudos Urbanos e Regionais, Natal, RN, Brasil.
Uma das questões que gera um debate acalorado no Brasil é o baixo desempenho escolar de alunos das escolas púbicas. Há quem argumente que o problema é a falta de prioridade da educação na agenda pública e o desinteresse da classe política pelo tema, assim como os baixos salários dos profissionais da área. Ainda que esses pontos sejam, muitas vezes, relevantes e pertinentes, os estudos sobre desempenho escolar são unanimes, em todo o mundo, em apontar que as condições socioeconômicas dos alunos têm o maior poder de influenciar o desempenho na escola. Em outras palavras, vir de uma família que vive em situação de vulnerabilidade social, com pais de baixa escolaridade (que, eles mesmos, não frequentam a escola por tempo suficiente), a insegurança alimentar e outras dificuldades podem gerar efeitos negativos na capacidade de aprendizagem de alunos.
Se os estudos confirmam que essas condições sociais herdadas são adversas, o que cabe aos gestores educacionais fazer? Imagine a seguinte situação antes de chegarmos à resposta. Se todos os alunos brasileiros, em qualquer escola do país, recebessem exatamente as mesmas condições de ensino, as desigualdades educacionais seriam eliminadas?
Para pensar essa situação, tem-se “duas propostas”, a primeira é conhecida como “princípio de igualdade”, isto é, uma distribuição igual para todos. A segunda é chamada de “princípio da equidade” que quer dizer priorizar os que estão em situação de desvantagem social para que se possa corrigir as desigualdades originais, isto é, aquelas que dependem da sua “sorte” do lugar de nascimento para que exista uma condição de igualdade real.
Argumenta-se que a primeira proposta, da igualdade pura, não seria suficiente, pois há uma parcela significativa do alunado brasileiro que está em condições tão desvantajosas que para que possa se igualar ao restante dos alunos – como os das escolas privadas – teriam de receber um tratamento diferenciado e prioritário. Por mais esquisito que isto possa parecer, é com um tratamento desigual que se pode gerar uma igualdade efetiva de oportunidades para crianças, adolescentes e jovens de todo o país. Essa questão e outras são discutidas no artigo “Por uma abordagem espacial na gestão de políticas educacionais: equidade para superar desigualdades”, publicado no periódico Educação & Sociedade (vol. 42).
Observa-se no estudo realizado que, para o caso do município de Natal, no Rio Grande do Norte, nem o princípio de igualdade pura e muito menos o de equidade são adotados pela gestão estadual e municipal de educação. Para ilustrar apenas com um dado (outros podem ser acessados no artigo completo), as escolas públicas de ensino médio e fundamental que têm um laboratório de ciências são poucas, apenas 24,5% do total. A distribuição não é igualitária e, para piorar, é também muito desigual, mesmo dentro uma mesma rede pública de ensino (municipal ou estadual). No caso das Zonas Administrativas Norte e Oeste da cidade de Natal, bairros com maior concentração de famílias em situação de vulnerabilidade social, ter um laboratório de ciências é uma raridade. Contudo, de acordo com os estudos já citados, seria justamente esse alunado que mais se beneficiaria, relativamente, em ter acesso a uma escola mais equipada e, em tese, mais atrativa para despertar a curiosidade científica e do conhecimento em geral.
Nesse sentido, o artigo discute que a gestão educacional não parece adotar princípios de correção das desigualdades sociais de origem, mas que, deveriam fazer isto. Para as autoras, essa não é uma discussão menor, pois há várias implicações, não apenas em termos de justiça social, como também para o próprio futuro do país, na medida em que, acredita-se, a escola tem enorme potencial de despertar e desenvolver habilidades diversas nos indivíduos e, especialmente, de transformar esses sujeitos em futuros cidadãos com capacidade de pensar, imaginar, estarem cientes de seus direitos, serem profissionais qualificados e criativos que possam criar transformações tecnológicas, científicas e sociais para toda a sociedade e para um país. Como um importante passo nessa direção, temos a adoção de princípios de equidade no recém aprovado fundo para a educação básica, o FUNDEB, pelo Congresso Nacional, que pode gerar os incentivos necessários para que a gestão pública adote esse olhar no planejamento de suas ações e, consequentemente, nos resultados educacionais e na justiça social.
A seguir, ouça o podcast de Francymonni Yasmim Marques de Melo discutindo sobre como superar as desigualdades educacionais no Brasil.
Referências
DUBET, F. et al. As desigualdades escolares antes e depois da escola: organização escolar e influência dos diplomas. Sociologias [online]. 2012, vol. 14, no. 29, pp. 22-70. ISSN: 1517-4522 [viewed 18 December 2020]. https://doi.org/10.1590/S1517-45222012000100003. Available from: http://ref.scielo.org/s4f7bt
RIBEIRO, L. C. Q., et al. Desafios urbanos à democratização do acesso às oportunidades educacionais nas metrópoles brasileiras. Educ. Soc. [online]. 2016, vol. 37, no. 134, pp. 171-193. ISSN: 1678-4626 [viewed 18 December 2020]. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302016157093. Available from: http://ref.scielo.org/26hqxz
Para ler o artigo, acesse
GOMES, S. et al. Por uma abordagem espacial na gestão de políticas educacionais: equidade para superar desigualdades. Educ. Soc. [online]. 2021, vol. 42, e234175. ISSN: 1678-4626 [viewed 18 January 2021]. https://doi.org/10.1590/es.234175. Available from: http://ref.scielo.org/6g2hgm
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