Reflexões sobre ética na obra de Peter Singer

Ana Bijóias Mendonça, Investigadora do Centre for Functional Ecology (CFE) – Science for People & the Planet, Department of Life Sciences, TERRA Associated Laboratory, University of Coimbra, Calçada Martins de Freitas, 3000-456, Coimbra – Portugal. Investigadora da Universidade Aberta (Open University), Lisboa – Portugal. 

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Em A interminável questão: por que (devo) agir moralmente? Análise do capítulo 12 de Ética Prática de Peter Singer, o autor revisita um capítulo fundamental da obra “Ética Prática” de Peter Singer, realizando um esforço hermenêutico notável ao analisar incisiva e detalhadamente os termos e argumentos utilizados no livro, enquanto interroga a razão de ser do seu uso. A clareza e o intuito de tal procedimento ficam bem visíveis logo nas primeiras linhas, tanto do resumo quanto do primeiro parágrafo do artigo. A forma como, por um lado, analisa e desmonta a argumentação e as teses de Singer, e por outro, enreda o leitor na dinâmica textual, elimina distrações e força uma leitura contínua e atenta. 

O texto começa questionando se a pergunta inicial é, em si mesma, uma questão ética, o que exige um exame profundo e aturado que vai além do impulso a respostas superficiais e pouco refletidas. Igualmente, o exercício de desmontagem da pergunta não leva sequer a uma resposta além desta: embora a pergunta tenha uma conotação ética, isso não significa que ela seja, em si, uma questão ética. A certa altura, essa interrogação primeira vai-se deslocando para a reflexão central sobre o sentido da vida, designadamente da vida humana, e de como Peter Singer parece resolver o “paradoxo do hedonismo”, superando o egocentrismo e a busca da felicidade estritamente individual através, justamente, do exercício da ética. 

Desta forma, num mundo que não apenas se transforma, mas verdadeiramente se metamorfoseia – como diria Ulrick Beck –, encontramos um cenário povoado por hiperobjetos e desafios exacerbados pela mão humana, que permanecem ainda sem solução, como aponta Thimothy Morton. Além disso, vivemos em uma sociedade global hipermoderna, hiperindividualista, mas decepcionada, como observa Gilles Lipovetsky. Nesse contexto, a ética apresenta-se como uma forma de transcender a dimensão meramente subjetiva e circunstancial, bem como o relativismo que resulta da normalização do ponto de vista “líquido” impermanente (Zygmunt Bauman). A ética possibilita, portanto, uma maior objetividade e um enquadramento ontológico mais amplo. 

O autor está ciente do trabalho que desenvolveu e, nesse sentido, apresenta duas “conclusões”: uma relativa à análise do capítulo e outra ao pensamento ético de Peter Singer. Não era estritamente necessário fazê-lo, dado que o intuito do ensaio é claro. No entanto, o autor sentiu a necessidade de justificar algumas das asserções que se foram lendo ao longo do artigo e que exigiam um lugar adequado para tal. 

No primeiro caso, dada a artificialização e a desumanização do mundo atual, questionam-se os desafios levantados por esta proposta, quer no âmbito teórico, quer no âmbito prático. No segundo caso, exploram-se as críticas à metaética de Peter Singer, nomeadamente, as tecidas por M. Huemer, enfatizando-se que Singer, balançando entre o intuicionismo racionalista e o cognitismo kantiano, esbarra na dificuldade em fazer coincidir as suas concepções morais e a metodologia ética que emprega. 

As discussões sobre o artigo em questão foram apresentadas em maior profundidade no Comentário a “A interminável questão: por que (devo) agir moralmente? Análise do capítulo 12 de Ética Prática de Peter Singer”, publicado no periódico Trans/Form/Ação (vol. 47, n.º 3, 2024).

Sobre Ana Bijóias Mendonça

Ana Bijóias Mendonça é licenciada em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Portugal, Mestre em Cidadania Ambiental e Participação e Doutorada em Sustentabilidade Social e Desenvolvimento, pela Universidade Aberta (UAb), Portugal. É ainda investigadora integrada do CFE – Centre for Functional Ecology: Science for People & the Planet, Department of Life Sciences, TERRA Associated Laboratory, da Universidade de Coimbra e Universidade Aberta, Portugal.

Referências

CASTRO, P.A. A interminável questão: por que (devo) agir moralmente? Análise do capítulo 12 de Ética Prática de Peter Singer. Trans/Form/Ação [online]. 2024, vol. 47, no. 3, e02400197 [viewed 29 August 2024]. https://doi.org/10.1590/0101-3173.2024.v47.n3.e02400197. Available from: https://www.scielo.br/j/trans/a/NNbKQYFMwKmzG5j5yGbjKsx/ 

HUEMER, M. Singer’s Unstable Meta-Ethics. In: SCHALER, J. A. Peter Singer Under Fire. Chicago: Open Court, 2009. 

SINGER, P. Como havemos de viver? A ética numa época de individualismo. Lisboa: Dinalivro, 2005.

SINGER, P. Ética Prática. CAMARGO, J.L. (Trad.). São Paulo: Livraria Martins Fontes Editora, 1994. 

Para ler o artigo, acesse

MENDONÇA, A.B. Comentário a “A interminável questão: por que (devo) agir moralmente? Análise do capítulo 12 de Ética Prática de Peter Singer”. Trans/Form/Ação [online]. 2024,  vol. 47, no. 3, e02400208 [viewed 29 August 2024]. https://doi.org/10.1590/0101-3173.2024.v47.n3.e02400208. Available from: https://www.scielo.br/j/trans/a/RsmRCYzsLxzptrk6PZttTDv/ 

Links externos

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Ana Bijóias Mendonça – ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6205-5785

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

MENDONÇA, A.B. Reflexões sobre ética na obra de Peter Singer [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2024 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2024/08/29/reflexoes-sobre-etica-na-obra-de-peter-singer/

 

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