Tal Pai, Tal Filho? A transmissão do comportamento empreendedor entre pais e filhos do mesmo sexo

Felipe Luiz Neves Bezerra de Melo, Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), Nova Cruz, RN, Brasil.

Ana Maria Jerônimo Soares, Doutoranda em Administração pelo Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PPGA/UFRN), Natal, RN, Brasil.

Ser filho de pai empreendedor ou mãe empreendedora está associado a um aumento na probabilidade de um indivíduo empreender. Ademais, a transmissão é potencializada quando o genitor empreendedor é do mesmo sexo de sua prole. No estudo A Chip off the Old Block? Effects of Gender Homophily on Intergenerational Transmission of Entrepreneurial Behavior, publicado na Brazilian Administration Review (vol. 19, no. 4: outubro/dezembro de 2022), o Professor Dr. Felipe Luiz Neves Bezerra de Melo (IFRN) e a doutoranda Ana Maria Jerônimo Soares (PPGA/UFRN) buscaram avaliar se o sexo está associado à transmissão intergeracional do comportamento empreendedor.

Na referida pesquisa, a base de dados foi secundária e considerou a categoria sexo (feminino/masculino). Assim, por se tratar de uma pesquisa quantitativa, dada as características de determinadas bases de dados, o gênero/sexo é tratado como uma categoria binária ou variável dicotômica. Isto quer dizer que uma pessoa pode se identificar como feminino ou masculino e homem ou mulher (mutuamente exclusivas), sendo essa uma operacionalização aceita, uma vez que esse tipo de pesquisa requer respostas possíveis de categorizar.

A principal hipótese do estudo é que a transmissão intergeracional do comportamento empreendedor é influenciada pela homofilia de gênero, ou seja, o efeito é potencializado se pais e filhos compartilham o mesmo sexo. Tal estudo destaca, portanto, a importância de dois determinantes do comportamento empreendedor: a influência dos pais empreendedores e a homofilia de gênero, evidenciando como eles trabalham juntos para apoiar as aspirações pelo empreendedorismo como carreira.

Essa transmissão do comportamento empreendedor, conforme a Social Learning Theory (BANDURA, 1986), é mediada não apenas pela observação, mas também pela interação social com os pais (MISHKIN, 2021; STANIEWSKI, AWRUK, 2021). Para alcançar o objetivo proposto, os autores utilizaram modelos econométricos e quantitativos, sendo o método de regressão Probit selecionado como estratégia de identificação. A amostra foi composta por 10.889 alunos do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN). A base de dados foi secundária e anual, composta por indivíduos formados nos cursos de nível técnico e tecnólogo do IFRN. Como critério de inclusão foram considerados todos os formados que ingressaram na instituição entre os anos de 2001 e 2010.

Imagem: Felipe Luiz Neves Bezerra de Melo, 2023 (DreamStudio AI).

Os resultados identificados pelos autores mostram que ser filho de pai empreendedor ou mãe empreendedora está associado a um aumento na probabilidade de um indivíduo se tornar empreendedor. Os achados ampliam a compreensão do papel desempenhado pelos pais e que essa transmissão consiste em um processo de “transbordamento” do conhecimento, atitudes e preferências em relação a escolha da carreira empreendedora, seja criando o próprio negócio ou dando continuidade a uma empresa familiar.

Um fator mediador dessa influência parental identificada no estudo consiste no gênero/sexo, o que significa que a probabilidade de abrir um negócio é maior nos casos das díades pai-filho ou mãe-filha (CHLOSTA, et al, 2012; GIMÉNEZ-NADAL, et al, 2022; MORENO-GÓMEZ, et al, 2022).

Adicionalmente, os resultados contribuem para a teoria ao mostrar que, mesmo com pequenas diferenças, esses laços podem ser mais fortes de acordo com o sexo. Portanto, os pais (homens) podem dar maior suporte parental (emocional, afetivo, verbal, financeiro/material) aos filhos homens, causando maior influência, dada a proximidade e similaridade biológica. O mesmo pode ocorrer entre mães e filhas.

Como implicações práticas, entender o papel dos pais e seu impacto no empreendedorismo dos filhos abre espaço para que formuladores de políticas desenhem ações para a realidade de um país como o Brasil, em que a atividade empreendedora assume função importante para o desenvolvimento socioeconômico e geração de emprego e renda, sendo, por vezes, a única forma de acesso a sustento.

Assim, tais políticas também podem ser pensadas com foco nos pais, explorando esse fator para estimular o empreendedorismo nascente. Por conseguinte, como projeções futuras da pesquisa, os autores sugerem uma abordagem mista (qualitativa e quantitativa) que possa capturar mais adequadamente o gênero de indivíduos através de suas identidades sociais/culturais. Ressalta-se ainda como avenida para estudos futuros a aplicação de surveys que consigam captar o caráter informal do comportamento empreendedor, bem como compreender de forma objetiva quais são os canais de transmissão desse comportamento entre indivíduos do mesmo gênero.

Referências

BANDURA, A. Social foundations of thought and action. New Jersey: Prentice-Hall. 1986

CHLOSTA, S., et al. Parental role models and the decision to become selfemployed: The moderating effect of personality. Small Business Economics [online]. 2012, vol. 38, no. 1, pp. 121-138 [viewed 8 March 2023]. https://doi.org/10.1007/s11187-010-9270-y. Available from: https://link.springer.com/article/10.1007/s11187-010-9270-y

GIMÉNEZ-NADAL, J.I., MOLINA, J.A. and VELILLA, J. Intergenerational correlation of self-employment in Western Europe. Economic Modelling [online]. 2022, vol. 108, 105741 [viewed 8 March 2023]. https://doi.org/10.1016/j.econmod.2021.105741. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0264999321003308

MISHKIN, E. Gender and sibling dynamics in the intergenerational transmission of entrepreneurship. Management Science [online]. 2021, vol. 67, no. 10, pp. 6116-6135 [viewed 8 March 2023]. https://doi.org/10.1287/mnsc.2020.3790. Available from: https://pubsonline.informs.org/doi/10.1287/mnsc.2020.3790

MORENO-GÓMEZ, J., et al. Gender perspective of parental role model influence on nascent entrepreneurs: Evidence from Colombia. European Research on Management and Business Economics [online]. 2022, vol. 28, no. 1, 100156 [viewed 8 March 2023]. https://doi.org/10.1016/j.iedeen.2021.100156. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2444883421000152

STANIEWSKI, M.W. and AWRUK K. Parental attitudes and entrepreneurship success. Journal of Business Research [online]. 2021, vol. 123, pp. 538-546. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2020.10.039. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0148296320306998

Para ler o artigo, acesse

MELO, F.L.N.B. and SOARES, A.M.J. A chip off the old block? Effects of gender homophily on intergenerational transmission of entrepreneurial behavior. BAR, Braz. Adm. Rev. [online]. 2022, vol. 19, no. 4, e220005 [viewed 8 March 2023]. https://doi.org/10.1590/1807-7692bar2022220005. Available from: https://www.scielo.br/j/bar/a/yPxxPprrCsVBzZyMyhd5nMd/

Links externos

Brazilian Administration Review – BAR: www.scielo.br/bar/

Felipe Luiz Neves Bezerra de Melo – Orcid: https://orcid.org/0000-0001-5579-3763

Ana Maria Jerônimo Soares – Orcid: https://orcid.org/0000-0002-5250-3529