O comportamento do Poder Judiciário brasileiro durante a pandemia de COVID-19

Henrique Cruz Noya – Assistente editorial da Revista Direito GV. Doutorando em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela USP. Mestre na mesma área pela UFMG. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. 

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Qual foi o comportamento do Poder Judiciário brasileiro durante a pandemia de COVID-19? Nesse período, o judiciário foi chamado a arbitrar diversos conflitos, oriundos de uma ampla gama de autores, temas e interesses. Um mapeamento de como a Justiça Federal decidiu casos relacionados à COVID-19 nos primeiros momentos da deflagração da pandemia indica que as probabilidades de tutela judicial dependeram de uma complexa interação de fatores, incluindo o perfil dos autores das ações, seus interesses subjacentes e o tema envolvido na discussão. 

Essas considerações foram apresentadas em um estudo que ofereceu um modelo estatístico explicativo dos determinantes da tutela judicial de direitos pela Justiça Federal em processos judiciais relacionados ao enfrentamento da pandemia de covid-19 durante o período de 16 de março a 30 de junho de 2020.

O artigo em questão, Covid-19 e tutela de direitos na Justiça Federal: atores, interesses e temas da judicialização da pandemia, publicado no volume 19 da Revista Direito GV, tem autoria de Ricardo Silveira Ribeiro, Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e membro da Equipe Técnica de Atuação Prioritária da Procuradoria Regional Federal da 5ª região, da Advocacia Geral da União (AGU).

O estudo, em primeiro lugar, oferece um perfil abrangente das ações sobre COVID-19, identificando os principais temas judicializados (uso da cloroquina, requisições de equipamentos médicos etc.), os tipos de autores responsáveis pelo ajuizamento das ações (pessoas físicas, associações profissionais, ONG’s, sociedades empresárias etc.) e os interesses de cada um desses autores nas diversas ações judiciais (interesses empresariais/lucrativos, individuais, sociais etc.). 

Foram examinados dados de 992 processos judiciais distribuídos em 27 seções da Justiça Federal em todos os cinco TRF’s do país. Disso ressurgem dados interessantes: 60,96% das ações sobre COVID-19 foram ajuizadas por pessoas físicas; em um segundo lugar, bem distante, estão ações ajuizadas por entidades associativas (associações profissionais, sindicatos, federações e confederações), com frequência de 11,75%. 

Um total de 36 temas foram identificados, sendo os quatro temas mais frequentes: provisão de profissionais de saúde (33,91%), revisão de contratos (13,88%), implementação de políticas sociais (12,38%), tentativa de os servidores obterem benefícios remuneratórios em razão da pandemia (6,23%).

Representações do vetor do Coronavírus e de glóbulos vermelhos

Imagem: Shutterstock.

O estudo também buscou desvendar os fatores relevantes à explicação do comportamento judicial no período, isto é, pretendeu obter conclusões sobre como diferentes fatores influenciaram a proteção de direitos. Por meio da análise estatística inferencial, o artigo ofereceu um modelo explicativo dos determinantes da tutela judicial no período de emergência sanitária. 

Uma das conclusões referem-se aos achados estatísticos em relação à probabilidade de obtenção de uma tutela a direitos no tocante a diversos fatores, como “tipo de autor”, “interesses” e “temas em questão” – todos relevantes para explicar as razões pelas quais, em maior ou menor grau, o Poder Judiciário Federal esteve disposto a tutelar direitos. Nesse sentido, ajuizar ações por meio de entidades associativas, ONGs, atores jurídicos (Ministério Público e OAB) e entidades subnacionais (isto é, estados e municípios) aumentou a probabilidade de obtenção de uma decisão bem-sucedida, quando comparados a pessoas físicas ou empresas.

Nesse retrato do comportamento judicial, os diversos fatores são relacionados estatisticamente e uma série de conclusões sobre a probabilidade de sucesso na obtenção de decisões favoráveis é oferecida. 

A principal conclusão é que o êxito das ações dependeu da interação concomitante dos múltiplos fatores identificados. Constou-se, por exemplo, que embora seja relevante distinguir o tipo de autor das ações, esse dado pode ser altamente impactado pelos interesses e temas em questão: estados e municípios tiveram uma probabilidade muito maior de sucesso quando defenderam o interesse público em demandas para a flexibilização da aplicação de regras jurídicas a seu favor.

As conclusões e dados levantados no artigo oferecem um perfil proveitoso do comportamento do Poder Judiciário brasileiro durante o período da emergência sanitária de COVID-19.

Para ler o artigo, acesse

RIBEIRO, R.S. Covid-19 e tutela de direitos na Justiça Federal: atores, interesses e temas da judicialização da pandemia. Revista Direito GV [online]. 2023, vol. 19, e2324 [viewed 01 November 2023]. https://doi.org/10.1590/2317-6172202324. Available from: https://www.scielo.br/j/rdgv/a/Y7kg48MKhMGbPxqpsDLyGMK/ 

Links externos

Revista Direito GV – RDGV: www.scielo.br/rdgv

Revista Direito GV – Site: https://direitosp.fgv.br/revista-direito-gv

FGV DIREITO SP – LinkedIn: https://www.linkedin.com/school/fgv-direito-sp/

 

Sobre Ricardo Silveira Ribeiro

Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Membro da Equipe Técnica de Atuação Prioritária da Procuradoria Regional Federal da 5ª Região, Advocacia-Geral Da União (AGU). | ORCID

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

NOYA, H.C. O comportamento do Poder Judiciário brasileiro durante a pandemia de COVID-19 [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2023 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2023/11/01/o-comportamento-do-poder-judiciario-brasileiro-durante-a-pandemia-de-covid-19/

 

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