Adail Sobral, Membro do Conselho Editorial de Bakhtiniana, Universidade Católica de Pelotas (UCPEL), Pelotas, RS, Brasi
Stephen Lofts, professor e pesquisador de Filosofia do Séc. XX, Cultura, Teoria Crítica e Psicanálise no King’s University College (Ontario, Canadá), inicia seu texto com uma breve crítica a alegações de uma possível influência de Cassirer sobre escritos de Bakhtin. Cita, inclusive, os estudos de Brandist a esse respeito (Bakhtin, Cassirer and Symbolic Forms), afirmando que ele se detém em mostrar, para além de uma influência, pontos de convergência entre a noção de “romance” de Bakhtin e a de “formas simbólicas” de Cassirer.
Lofts propõe-se, porém, a examinar a relação entre a teoria das formas simbólicas de Cassirer e as propostas bakhtinianas de Para uma filosofia do ato, escrito antes da obra do filósofo alemão. Ele afirma que esse texto, mais antigo do que aqueles que foram objeto de exame das confluências no pensamento de ambos os pensadores, exibe semelhanças, em termos de Zeitgeist, não apenas com Cassirer, mas também com Heidegger (Ser e tempo, que igualmente surge depois do texto de Bakhtin).
O pesquisador se pergunta, dado os tantos pontos comuns que identifica, “se os estudos sobre Bakhtin dataram erroneamente o texto” ou se Para uma filosofia do ato foi na verdade escrita “[…] após uma leitura completa das obras Filosofia das formas simbólicas e Ser e tempo” (p. 80). Cassirer e Bakhtin, segundo o autor, estavam voltados para discutir duas questões: (i) como conciliar “a imanência da vida” com a “transcendência do espírito” (ou, em meus termos, o sensível e o inteligível); e (ii) de que modo o agir do sujeito constitui a cultura que o constitui (ou, em meus termos, de que modo o sujeito se torna um mediador de sentidos em sua comunidade). Nem a filosofia transcendental nem as Lebensphilosophien são capazes, ao ver dos dois autores, de resolver essas duas questões. Em ambos os casos, e para os dois autores, a resposta é: a chave está no ato do sujeito. É o ato o cimento que une o sensível do mundo (enfatizado pelas Lebensphilosophien — nas quais se inclui Heidegger) ao inteligível da teoria (enfatizado por Kant e os neokantianos).
Trata-se da questão das relações entre o indivíduo como único e a cultura como espaço do coletivo que pode apagar o sujeito individual: “[…] não seria difícil reconhecer como o ser singular uniocorrente é negado ao entrar nas estruturas da cultura que nivela o seu ser em algo geral, repetível, e, como tal, substituível” (p. 83). O autor mostra igualmente que Cassirer e Bakhtin diferem de Heidegger porque falta a este a ideia de um Dasein capaz de alterar suas próprias condições, assumir responsabilidade por seus atos e, assim “ajudar na realização da mundanidade do mundo” (p. 83). E ainda levanta reflexões a respeito das ideias de ambos envolvendo pensadores como Bergson, Simmel, Wittgenstein, Spengler até chegar ao modo como repercutem em Derrida…
O artigo conclui com uma série de sugestivas análises de outros pontos relevantes da questão da “semelhança de família” (Wittgenstein) entre os autores examinados, e, ao final, faz uma bem fundamentada aproximação entre Bakhtin, Cassirer e Derrida, notadamente no tocante à questão da máquina performativa em sua relação com a singularidade de cada sujeito humano.
A todos que buscam as raízes, o aprofundamento filosófico e a compreensão do pensamento bakhtiniano, leitura enriquecedora e produtiva.
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LOFTS, S. G. Bakhtin and Cassirer: The Event and the Machine. Bakhtiniana, Rev. Estud. Discurso[online]. 2016, vol.11, n.1, pp.77-98. [viewed 31th March 2016]. ISSN 2176-4573. DOI: 10.1590/2176-457324739. Available from: http://ref.scielo.org/wdzd54
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Que resenha TOP! Relevante, sintética e completa.