Eduardo Diniz, Editor-chefe Revista de Administração de Empresas – RAE, São Paulo, SP, Brasil
Desde a instalação de um sistema de identificação de similaridade, em fevereiro de 2015, a equipe de redação da RAE tem se dedicado a entender e classificar os diversos tipos de semelhanças encontradas em artigos que são submetidos para avaliação. Embora essa nova ferramenta facilite a checagem digital de semelhança entre uma quantidade muito grande de textos já publicados com aquele recém-submetido, a tarefa de classificar os diferentes casos que temos observado tem se mostrado mais complexa do que poderia parecer a princípio.
Em primeiro lugar, é preciso entender que a ferramenta instalada faz verificação automática de similaridade textual, ou seja, identifica semelhanças entre o texto submetido e outros publicados. É claro que copiar um trecho de texto de terceiros e submetê-lo sem mencionar o original como referência é atitude condenável e deve ser combatida. Entretanto, este é um caso de fácil encaminhamento e, embora negativo, não acontece com muita frequência. Quando identificado, o autor é alertado e cobra-se uma resposta. Pode ter sido apenas uma distração, em geral em um trecho pequeno e de menor relevância do artigo, mas há que ser corrigido. Se a resposta do autor questionado não for convincente, a tendência é a recusa da publicação, decisão que é tomada ouvindo-se também a opinião do editor científico envolvido com aquele artigo.
Mais comum é o caso em que um texto é identificado com alto grau de semelhança com outros textos do mesmo autor. É o comumente chamado de autoplágio. Aqui temos situações diferentes, que devem ser tratadas de modo distinto. A diferença recai no tipo do texto de origem. Em princípio, se a semelhança do texto submetido é com um artigo de congresso, não deveríamos nos preocupar muito, pois, em geral, se considera que esta seria apenas uma etapa natural da evolução daquele artigo. A situação é parecida se a semelhança é identificada com um relatório de pesquisa, embora o caso aqui possa ser mais complexo, pois há ocorrências em que o relatório de pesquisa (ou working paper) é tratado como uma publicação de fato. Cada caso deve ser analisado em particular, e a decisão final tende a ser um pouco menos óbvia.
Bem mais complicada é a situação de similaridade com artigos já publicados em periódicos. Em princípio, quando se publica um artigo num periódico, há um contrato de cessão de direitos que foi assinado entre autor e editora do periódico, o que limita o seu uso, no todo ou em parte, por outra publicação. Mesmo se for apenas um parágrafo, qualquer editor se sentirá desconfortável em publicar algo que tenha potencial para criar um conflito de propriedade intelectual. A recomendação, nesse caso, é a total modificação dos trechos com similaridade identificada e, quando se aplicar, a citação explícita da fonte original.
Essa é apenas uma pequena amostra da enorme variedade de situações que ocorrem quando um periódico passa a fazer verificação de similaridade em seus processos editoriais. Além da origem do texto, muitas outras questões também fazem parte da avaliação de similaridade. Uma delas é a quantidade de texto similar. Quanto seria “aceitável”: uma frase, um parágrafo, uma página, meio artigo? Além disso, em qual parte do texto foi encontrada a similaridade? Na introdução, na revisão teórica, na descrição da metodologia ou nas conclusões? A combinação de todas essas possibilidades gera uma boa quantidade de situações que nem sempre têm solução fácil.
Há que se considerar também que os sistemas de verificação de similaridade checam apenas o formato textual, e não o conteúdo das ideias explicitadas no artigo. Mesmo que não haja nenhuma similaridade de forma com algum texto publicado anteriormente, essas novas ferramentas tecnológicas não conseguem capturar adequadamente similaridades de conteúdo que estejam disfarçadas pela providencial modificação das palavras empregadas num novo texto.
Enfim, ainda que não se condene a prática de se produzir mais do que um artigo a partir de uma única pesquisa, situação bastante comum e que certamente aumenta o risco de similaridade entre textos, a questão de fundo é distinguir com mais precisão as situações em que há apenas um mero descuido no tratamento do texto do artigo científico daquelas realmente movidas por oportunismo acadêmico. Mesmo que nós, pesquisadores, estejamos mais interessados nas ideias que transmitimos do que nas qualidades literárias apresentadas em nossos artigos, a prática editorial de detecção de similaridade que começa a se estabelecer vai certamente impor novos padrões (e desafios) tanto para os autores quanto para os editores de periódicos científicos.
Para ler os artigos, acesse:
DINIZ, EDUARDO. SIMILARITY AND PLAGIARISM: NEW CHALLENGES FOR THE MANAGEMENT OF SCIENTIFIC JOURNALS. Rev. adm. empres. [online]. 2015, vol.55, n.3, pp. 239-239. [viewed 29th June 2015]. ISSN 2178-938X. DOI: 10.1590/S0034-759020150301. Available from: http://ref.scielo.org/7627ds
Link externo:
Revista de Administração de Empresas – http://www.scielo.br/rae
Como citar este post [ISO 690/2010]:
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