Ney Murtha, José Esteban Castro e Léo Heller, pesquisadores vinculados a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil
Os autores, em pesquisa realizada no Programa de Pós-Graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG e publicada no volume 18, número 3 da Ambiente & Sociedade, revelam aspectos pouco explorados na literatura setorial destas políticas públicas: suas conexões com o os grandes movimentos de estruturação econômica do país, amplamente influenciadas pelos desenvolvimentos técnicos e pelo contexto internacional. Os serviços de saneamento estabelecidos a partir de meados do século XIX em meio a um ciclo de modernização urbana são caracterizados como expressão do liberalismo econômico internacional num contexto de dependência econômica, cultural e tecnológica em relação à Europa. Em sentido contrário, e já na década de 1930, a regulação do uso das águas no país se deu como resposta à crise liberal e como expressão da afirmação do estado nacional como agente regulador das relações econômicas e indutor da industrialização.
A implementação de serviços de abastecimento residencial de água e de esgotamento sanitário a partir da década de 1850 e os melhoramentos urbanos da virada do século são apresentados como elementos de ‘modernização’ dos espaços urbanos nos moldes engendrados nos países centrais do capitalismo. A modernização sanitária implantada sob a liderança financeira e difusão técnica a partir da Inglaterra e os melhoramentos urbanos das maiores cidades do país conduzidos sob o ideário francês de higiene pública.
A regulamentação do uso da água com a promulgação do Código de Águas em 1934 correspondeu à necessidade de controlar a ação de grandes trustes norte-americanos do setor de hidroeletricidade em um contexto de crise do comércio internacional, de aprofundamento do nacionalismo e da centralização das ações governamentais na União. Conflitos decorrentes da organização do espaço urbano, de serviços públicos antagônicos e do aproveitamento hidro energético em uma sociedade ávida por industrialização concorreram para a regulamentação dos aproveitamentos hídricos.
Em comum as políticas sanitárias e de regulamentação do uso da água trazem a atuação de forças econômicas que atuavam no país em seu esforço de modernização. No período imperial a nação que hegemonizava as relações econômicas e políticas com o país ainda era a Inglaterra e no início do século XX sua influência já havia sido reduzida com a ascendência dos Estados Unidos da América. O liberalismo característico deste período permitiu grande mobilidade aos capitais estrangeiros, que monopolizavam amplos setores de serviços públicos nas grandes capitais do país. A crise liberal ao final da década de 1920 permitiu o fortalecimento do papel do Estado em âmbito internacional, o que ensejou no Brasil o início do projeto desenvolvimentista do governo Vargas, que requeria energia hídrica barata para a expansão industrial.
A perspectiva analítica adotada enfatiza a dependência de estruturas econômicas, sociais e políticas de países periféricos em relação a um sistema mundial hierarquizado e desigual, ao qual se articulam de modo subordinado. A grande referência neste sentido é o método histórico-estrutural, desenvolvido e aplicado ao campo socioeconômico pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe – CEPAL.
A pesquisa é parte de um esforço acadêmico dos autores para conhecer melhor as origens e trajetórias das políticas brasileiras de recursos hídricos e de saneamento.
Para ler os artigos, acesse:
MURTHA, N. A., CASTRO, J. E. and HELLER, L. A historical perspective of early water policy and water and sanitation policy in Brazil. Ambient. soc. [online]. 2015, vol.18, n.3, pp. 193-210. [viewed 14th March 2016]. ISSN 1809-4422. DOI: 10.1590/1809-4422ASOC1047V1832015. Available from: http://ref.scielo.org/tc4xp6
Link externo
Ambiente & Sociedade – ASOC – http://www.scielo.br/asoc/
Como citar este post [ISO 690/2010]:
A precarização do sistema de coleta e tratamento de esgoto que vemos hoje, mesmo nos grandes centros urbanos, é uma realidade que deve ser discutida e enfrentada de frente, para que as próximas gerações tenham a oportunidade de viver em um meio ambiente mais saudável.