As políticas educacionais têm contribuído para a inclusão social, étnica e de gênero?

Elaine de Almeida Cabral, Editoria Executiva da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP), Brasília, DF, Brasil

Na atualidade, valores e princípios são incorporados às funções da educação na sociedade, tornando esta política mais do que um conjunto de ações para a produção e transmissão do conhecimento. O número 251 da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) traz textos que apresentam o processo de ensino-aprendizagem e a formação docente dentro da perspectiva da inclusão, considerando-a um dos princípios que regem as políticas educacionais atualmente.

A educação superior a distância pode ser um caminho para inclusão social e tecnológica de mulheres do interior do Brasil. O artigo “Inclusão educacional, digital e social de mulheres no interior da Paraíba: uma experiência na UFPB”, de Rita Cristina Barbosa, Maria Eulina Pessoa de Carvalho e Alejandra Montané López, apresenta a análise textual discursiva das narrativas de alunas dos cursos de Letras, Pedagogia e Ciências Agrárias ofertados na modalidade a distância pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB Virtual). A pesquisa, qualitativa e exploratória, focada na perspectiva de gênero, adotou a abordagem documental e empírica e se baseou nos estudos de Castaño (2010), Rosemberg (2002) e Palloff e Pratt (2004).

As autoras trazem um levantamento histórico da segregação profissional das mulheres, às quais foram atribuídas atividades com pouco poder de decisão e baixa remuneração, para, em seguida, demonstrarem a entrada massiva de mulheres no ensino superior desde o final do século 20. Entretanto, grande parte dessas universitárias está inserida em cursos historicamente ocupados por mulheres, predominantemente.

Os relatos das estudantes revelam que, para elas – alunas de baixa renda, excluídas da cultura digital e, algumas, atuantes como professoras leigas –, a educação superior a distância configura sua inclusão educacional e uma oportunidade de contato com as tecnologias da informação e comunicação (TICs), ainda dominadas por homens no Brasil, segundo o Mapa da Inclusão Digital (NERI, 2012). As autoras denominam esse acesso desigual às TICs por homens e mulheres de “brecha digital de gênero”. Entretanto, a essa brecha somam-se outros problemas, ligados à classe social das estudantes e à sua localização geográfica, como a má qualidade da conexão de internet no interior do país e a falta de recursos próprios para investimento em equipamentos pessoais. Todos esses fatos têm constituído obstáculos a uma experiência de ensino com potencial para promover a inclusão educacional, digital e social e o empoderamento das mulheres em áreas carentes no interior do Brasil.

Se atualmente há mais iniciativas educacionais calcadas na perspectiva da inclusão, é necessário refletir sobre elas para que, uma vez implantadas, se consolidem de forma a promoverem, de fato, o que propõem. O relato “Propuesta de uma metodología intercultural para una pedagogía indígena: la experiencia de las licenciaturas interculturales indígenas com el pueblo kaingang”, de Jorge Alejandro Santos, Leonel Piovezana e Ana Paula Narsizo, apresenta uma experiência de formação de professores indígenas para atuarem na educação básica em suas comunidades, promovida pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó) dentro de uma terra indígena kaingang.

Uma importante observação dos pesquisadores sobre essa experiência é que não há um conteúdo curricular e uma pedagogia específica e diferenciada para a educação indígena, o que sugere a necessidade de uma metodologia intercultural que atenda às necessidades das comunidades indígenas.

Baseando-se em uma análise histórica, os autores retomam a questão da perda de território pelos índios a partir da colonização, bem como o início da escolarização indígena pela Igreja Católica, sem uso da língua indígena. Na atualidade, os autores ressaltam as altas taxas de evasão de estudantes indígenas da educação superior. Os dois momentos históricos permitem identificar a necessidade de uma pedagogia específica para os indígenas.

Mesmo com a necessidade de repensar a metodologia utilizada na experiência de licenciatura intercultural observada, é possível identificar avanços, entre os quais o aprendizado experimentado pelos professores universitários, que passam a ter contato com o arcabouço cultural trazido pelos estudantes. O estudo ressalta o desafio, tanto para os estudantes quanto para os professores, de “…atravessar as fronteiras culturais formadas por preconceitos estabelecidos há séculos sobre a população originária” (SANTOS; PIOVEZANA; NARSIZO, 2018, p. 197).

Os dois estudos em destaque no número 251 da RBEP permitem refletir sobre a inclusão não em uma perspectiva de concessão a grupos minoritários, mas como exercício de partilha de conhecimentos e experiências de forma a alterar posições sociais estabelecidas historicamente e promover o desenvolvimento para toda a sociedade.

Referências

CASTAÑO, C. C. (Org.). Género y TIC: presencia, posición y políticas. Barcelona: Ed. UOC, 2010. (Sociedad Red, n. 3).

NERI, M. C. (Coord.). Mapa da inclusão digital. Rio de Janeiro: FGV; CPS, 2012.

PALLOFF, R. M., PRATT, K. O aluno virtual: um guia para trabalhar com estudantes on-line. Porto Alegre: Artmed, 2004.

ROSEMBERG, F. Educação formal, mulheres e relações de gênero: balanço preliminar da décadad e 90. In: BRUSCHINI, C.; UNBEHAUM, S. G. (Org.). Gênero, democracia e sociedade brasileira. São Paulo: Ed. 34, 2002. p. 195-224.

Para ler os artigos, acesse

BARBOSA, R. C., CARVALHO, M. E. P. and LOPEZ, A. M. Inclusão educacional, digital e social de mulheres no interior da Paraíba: uma experiência na UFPB. Rev. Bras. Estud. Pedagog. [online]. 2018, vol.99, n.251, pp.148-171. ISSN 0034-7183. [viewed 21 May 2018]. DOI: 10.24109/2176-6681.rbep.99i251.3409. Available from: http://ref.scielo.org/n8hgnm

SANTOS, J. A., PIOVEZANA, L. and NARSIZO, A. P. Propuesta de una metodología intercultural para una pedagogía indígena: la experiencia de las licenciaturas interculturales indígenas con el pueblo kaingang. Rev. Bras. Estud. Pedagog. [online]. 2018, vol.99, n.251, pp.189-204. ISSN 0034-7183. [viewed 21 May 2018]. DOI: 10.24109/2176-6681.rbep.99i251.3423. Available from: http://ref.scielo.org/sjhwkg.

Link externo

Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos – RBEPED: www.scielo.br/rbeped

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

CABRAL, E. A. As políticas educacionais têm contribuído para a inclusão social, étnica e de gênero? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2018 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2018/05/23/as-politicas-educacionais-tem-contribuido-para-a-inclusao-social-etnica-e-de-genero/

 

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