Quem convocou o primeiro protesto pelo impeachment de Dilma?

Camila Rocha, Pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), São Paulo, SP, Brasil

Pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP) reconstrói histórico do grupo político que deu origem a mobilizações pelo impeachment de Dilma Rousseff em artigo “Imposto é roubo!” a formação de um contra-público ultraliberal e os protestos pró- impeachment de Dilma Rousseff” publicado No periódico DADOS (v. 62, n. 3), e destaca o papel desempenhado pelos ultraliberais, defensores radicais do livre-mercado que passaram a se organizar a partir da metade dos anos 2000.

Até o presente os ciclos de protestos anti-petistas e pró-impeachment foram analisados pela literatura em si mesmos (ALONSO, 2017; MESSEMBERG, 2017; PINTO, 2017; SOLANO; ORTELLADO; MORETTO, 2017; TATAGIBA; TRINDADE; TEIXEIRA, 2015; TELLES, 2016), sem situar os atores e eventos específicos que lhes deram origem considerando uma perspectiva histórica mais ampla e processual. A presente pesquisa preenche justamente tal lacuna ao apontar a importância de espaços de discussão na internet, surgidos especialmente na rede social Orkut na metade dos anos 2000, nos quais se debatia uma variante radical do liberalismo: o libertarianismo, ou ultraliberalismo, como ficou mais conhecido no debate público.

Foi a partir destes fóruns de discussão que uma nova militância ultraliberal passou a se estruturar a partir da formação de novos grupos políticos que passaram a atuar no movimento estudantil, formar novas organizações civis, e até mesmo tentar organizar novos partidos, movimento que ganhou força à medida em que os militantes saídos do Orkut criaram conexões com think tanks liberais estabelecidos por empresários e intelectuais entre as décadas 1980 e 1990. Para realizar esta reconstrução histórica a pesquisadora fez uma triangulação de dados empíricos: mais de 20 entrevistas em profundidade coletadas entre 2015 e 2018 com lideranças e militantes que frequentavam estes espaços de debate na internet; postagens originais relacionadas aos eventos apontados pelos entrevistados nas redes sociais Orkut e Facebook; bem como notícias de jornais e revistas que também pudessem confirmar o relato dos entrevistados.

Para além de contribuição empírica inovadora, neste artigo a pesquisadora também realiza uma contribuição teórica ao propor a interpretação destes espaços de discussão e formação de militantes como uma contra-público ultraliberal, com base nos argumentos do crítico literário Michael Warner (2002), contribuindo nesse sentido para o refinamento deste conceito pós-habermasiano a partir de seu emprego em um caso empírico. A hipótese principal que norteia o argumento defendido é o de que três fatores foram fundamentais para explicar a formação deste contra-público e o seu sucesso em organizar uma militância de base que convocou e dirigiu os primeiros protestos pró-impeachment: 1. a presença precoce em fóruns e redes sociais virtuais de jovens universitários e profissionais liberais das classes média e alta que possuíam interesse pelo liberalismo econômico; 2. a pré-existência de uma rede de think tanks liberais no país que pudesse oferecer suporte organizacionais e financeiro à militância em formação; 3. mudanças na estrutura de oportunidades políticas relacionadas a dois eventos políticos que tiveram no país, as revoltas de junho de 2013 e a reeleição de Dilma Rousseff em 2014.

Referências

ALONSO, A. A política das ruas. Protestos em São Paulo de Dilma a Temer.  Novos Estudos CEBRAP, ed. esp., p. 49-58, 2017. ISSN: 0101-3300 [viewed 7 November 2019]. DOI: 10.25091/S01013300201700040006

MESSENBERG, D. A direita que saiu do armário: a cosmovisão dos formadores de opinião dos manifestantes de direita brasileiros. Soc. estado, v. 32, n. 3, p. 621-648, 2017. ISSN: 0102-6992 [viewed 7 November 2019]. DOI: 10.1590/s0102-69922017.3203004. Avaliable from: http://ref.scielo.org/2xyd7j

PINTO, C. R. J. A trajetória discursiva das manifestações de rua no Brasil (2013-2015). Lua Nova, n. 100, p. 119-153, 2017. ISSN: 0102-6445 [viewed 7 November 2019]. DOI: 10.1590/0102-119153/100. Avaliable from: http://ref.scielo.org/nbxp72

SOLANO, E.; ORTELLADO, P. and MORETTO M. 2016, o ano da polarização?. Análise, n. 22, p. 5-20, 2017. Avaliable from: http://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/13249.pdf

TATAGIBA, L.; TRINDADE, T. and TEIXEIRA, A. C. (2015), Protestos à direita no Brasil (2007-2015). In: CRUZ, S. et al. (Org.) Direita Volver! O retorno da direita e o ciclo político brasileiro. São Paulo: Perseu Abramo, 2015. p. 197-212.

TELLES, H. A Direita Vai às Ruas: o antipetismo, a corrupção e democracia nos protesto antigoverno. Ponto-e-Vírgula: Revista de Ciências Sociais, n. 19, p. 97-125, 2016. ISSN: 1982-4807 [viewed 7 November 2019]. Avaliable from: https://revistas.pucsp.br/index.php/pontoevirgula/article/view/29895

WARNER, M. Publics and counterpublics. Public culture, v. 14, n. 1, p. 49-90, 2002. e-ISSN: 1527-8018 [viewed 7 November 2019]. DOI: 10.1215/08992363-14-1-49. Avaliable from: https://read.dukeupress.edu/public-culture/article-abstract/14/1/49/31654/Publics-and-Counterpublics?redirectedFrom=fulltext

Para ler o artigo, acesse

ROCHA, C. “Imposto é Roubo!” A formação de um contrapúblico ultraliberal e os protestos pró- impeachment de Dilma Rousseff. Dados, v. 62, n. 3, e20190076, 2019. ISSN: 0011-5258 [viewed 7 November 2019].  DOI: 10.1590/001152582019189. Available from: http://ref.scielo.org/74vkjs

Link externo

Dados – Revista de Ciências Sociais – DADOS: www.scielo.br/dados

Link para tese de doutorado: “Menos Marx mais Mises”: uma gênese da nova direita brasileira (2006-2018): http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-19092019-174426/pt-br.php

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

ROCHA, C. Quem convocou o primeiro protesto pelo impeachment de Dilma? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2019 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2019/11/07/quem-convocou-o-primeiro-protesto-pelo-impeachment-de-dilma/

 

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