Percorrendo os fios da hashtag #acaboubolsonaro: agência virtual em tempos de pandemia

Tatiana Martins Gabas, doutoranda, Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil.

O dossiê “Resistências em Práticas Discursivas de Contestação em Democracias Frágeis”, no periódico Trabalhos em Linguística Aplicada (v. 59, n. 3, 2020), organizado pelos professores Luiz Paulo da Moita Lopes e Joana Plaza Pinto, reúne trabalhos que investigam práticas de resistência e ações de movimentos antidemocrátios em contextos off-line e em ambientes virtuais de diferentes países.

O artigo “Threads of a hashtag: entextualization of resistance in the face of political and sanitary challenges in Brazil” (em português, “Fios de uma hashtag: entextualização de resistência face a desafios politicos sanitários no Brasil”), de Marilda Cavalcanti & Ana Cecilia Bizon, focaliza a agência individual na performance de um migrante haitiano que em um evento direto confronta o atual presidente e as  trajetórias de circulação de seu posicionamento nas mídias sociais, buscando compreender como essa performance se constitui discursivamente e como impacta a agência virtual em tempos de pandemia.

Com a replicação da performance, gravada em celular e postada como tweet, a hashtag #acaboubolsonaro (que retoma uma fala do homem) alcança o primeiro lugar nos trending topics brasileiro em março de 2020 após o vídeo viralizar nas redes. Para examinar os ecos discursivos no caminho da hashtag, o corpus é composto por um conjunto de dados híbridos de arquivos digitais de mídias sociais e da mídia tradicional.

Imagem: CAVALCANTI, M. C. e BIZON, A. C. C.

Ao percorrerem o caminho da (re)entextualização, isto é, ao analisarem o processo de circulação de trechos da performance do migrante que carregam elementos de seu contexto inicial e de sua história de uso, as autoras dão “especial atenção a como os fios discursivos estão construídos e entrelaçados, indexicalizando resistência.” (CAVALCANTI; BIZON, 2020, p. 1972). Para tanto, são analisados momentos discursivos de agência e resistência com base nas escolhas linguísticas que sinalizam contextos, vozes e lugares sociais.

Dado que a hashtag extrapola o ambiente virtual, sendo utilizada em cartazes, projetada em prédios e inspirando ativismos criativos, a partir de uma compreensão não-linear de dinâmica escalar, as autoras examinam a entextualização da performance discursiva do migrante, mostrando os entrecruzamentos que aparecem nos fios da hashtags. Nesse movimento, as produções discursivas entextualizadas são compreendidas a partir de progressões escalares, de uma esfera local para uma esfera nacional e de uma esfera pessoal para uma esfera coletiva.

Em analogia ao termo “pragmática do caos” (SILVA, 2020), as autoras cunham o termo “pragmática da resistência”, para descrever as práticas de resistência discursivamente acionadas por atores sociais para resistir às políticas de indiferenças provocadas pela conjugação de projetos neoliberais e tendências conservadoras que, combinadas, resultaram em um cenário de crise sanitária e política sem precedentes no país.

Referências

SILVA, D. N. E. The Pragmatics of Chaos: Parsing Bolsonaro’s Undemocratic Language. Trabalhos em Linguística Aplicada [online]. 2020, vol.59, no.01, pp. 507-537. Available from: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/tla/article/view/8659107

Para ler o artigo, acesse

CAVALCANTI, M. C. and BIZON, A. C. C. Threads of a hashtag: entextualization of resistance in the face of political and sanitary challenges in Brazil. Trabalhos em Linguística Aplicada [online]. 2020, vol. 59, no.03, pp. 1966-1994 [viewed 15 June 2021]. https://doi.org/10.1590/010318139041011120210107. Available from: http://ref.scielo.org/msyrbt

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