Ocupações “femininas” são desvalorizadas no Brasil e ajudam explicar menor nível salarial das mulheres

Yasmin Geronimo da Silva, Bacharela em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Osasco, SP, Brasil.

Daniela Verzola Vaz, Professora Adjunta do Departamento de Economia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Osasco, SP, Brasil. 

Logo do periódico Revista Brasileira de Estudos de PopulaçãoA crescente participação feminina na força de trabalho brasileira não foi suficiente para eliminar a segregação ocupacional por sexo observada no país. Os dados mostram que as mulheres estão alocadas em ocupações com, em média, mais de 61% de trabalhadoras do sexo feminino, ao passo que os homens se encontram em ocupações com não mais que 27% de mulheres, em média. Esse fato ajuda a explicar o hiato de rendimentos entre homens e mulheres no mercado de trabalho brasileiro, visto que as ocupações predominantemente femininas pagam menos (KARLIN; ENGLAND; RICHARDSON, 2002; LEVANON; ENGLAND; ALLISON, 2009).

Nesse sentido, o artigo Por que as ocupações “femininas” pagam menos? Um estudo longitudinal (Revista Brasileira de Estudos de População, vol. 39, 2022), a fim de responder à sua questão-título, verifica a existência de evidências que comprovem a teoria da desvalorização do trabalho feminino no Brasil. Para isso, avaliou-se como e em que medida a transição entre ocupações com diferentes composições por sexo se relaciona com a alteração nos níveis de rendimento dos trabalhadores no mercado de trabalho brasileiro.

A análise foi realizada pelas pesquisadoras Yasmin Geronimo da Silva, bacharela em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de São Paulo, e Daniela Verzola Vaz, professora adjunta do Departamento de Economia da mesma universidade.

Com a utilização dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua de 2012 a 2019, o artigo encontrou que, em um período de até cinco trimestres, os trabalhadores tendem a permanecer nas (ou transitar para as) ocupações típicas de seu gênero, raramente migrando para ocupações dominadas pelo sexo oposto. Enquanto 11% das mulheres em ocupações masculinas transitam para ocupações femininas, apenas cerca de 2% fazem o movimento inverso. Esses números podem ser explicados, entre outros fatores, pela preferência dos trabalhadores por atividades e carreiras identificadas com o seu papel social (SALAS; LEITE, 2007).

A pesquisa revelou que, para todos os trabalhadores, independentemente do sexo e da cor ou raça, os menores rendimentos são recebidos nas ocupações femininas, e os maiores, nas ocupações integradas, mostrando que a relação entre a composição ocupacional por sexo e os rendimentos é não linear.

Além disso, com exceção das ocupações predominantemente masculinas, os homens têm rendimentos do trabalho maiores que as mulheres. Isso seria devido a características individuais específicas das mulheres alocadas em ocupações masculinas, como, por exemplo, o maior nível de escolaridade, e ao fato de os homens cobrarem um “prêmio” para trabalhar em um emprego considerado feminino (MADALOZZO, 2010).

Montagem com três quadros contendo pessoas e sacos de dinheiro para representar o quanto elas ganham

Imagem: elaboração própria

O estudo observou um efeito médio de queda no rendimento do trabalhador quando sua ocupação se modifica de masculina para feminina. As mulheres são as mais penalizadas por essa transição, com redução média entre 2,1% a 2,6% no rendimento, enquanto os homens experimentam queda de 1,1% a 1,3%, em média. Tais números configuram evidência em favor da hipótese de desvalorização do trabalho feminino no mercado de trabalho brasileiro.

Essa teoria postula que, por conta de estereótipos sociais de gênero, o trabalho desempenhado em uma ocupação composta principalmente por mulheres é tido como menos valioso ou menos exigente, de maneira que o nível de remuneração oferecido é mais baixo do que seria observado caso o trabalho fosse feito principalmente por homens (KARLIN; ENGLAND; RICHARDSON, 2002; LEVANON; ENGLAND; ALLISON, 2009).

Especificamente no caso dos homens brancos, há um efeito de queda associado à transição de uma ocupação integrada para uma predominantemente masculina, o que contraria a hipótese da desvalorização ao indicar uma relação não linear entre a composição por sexo das ocupações e o seu nível de rendimentos.

Por fim, o artigo salienta a importância do combate à segregação ocupacional por sexo para a eliminação do hiato de rendimentos entre homens e mulheres no mercado de trabalho brasileiro e discute maneiras efetivas de superar esse problema.

Referências

KARLIN, C. A., ENGLAND, P. and RICHARDSON, M. Why do “women’s jobs” have low pay for their educational level? Gender Issues [online]. 2002, vol. 20, no. 4, pp. 3-22 [viewed 08 September 2022]. https://doi.org/10.1007/s12147-002-0020-6. Available from: https://link.springer.com/article/10.1007/s12147-002-0020-6

LEVANON, A., ENGLAND, P. and ALLISON, P. Occupational feminization and pay: assessing causal dynamics using 1950-2000 census data. Social Forces [online]. 2009, vol. 88, no. 2, pp. 865-891 [viewed 08 September 2022]. https://doi.org/10.1353/sof.0.0264. Available from: https://academic.oup.com/sf/article-abstract/88/2/865/2235342

MAGNUSSON, C. More women, lower pay? Occupational sex composition, wages and wage growth. Acta Sociologica [online]. 2013, vol. 56, no. 3, pp. 227-245 [viewed 08 September 2022]. https://doi.org/10.1177/0001699313484480. Available from: https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/0001699313484480

MURPHY, E. and OESCH, D. The feminization of occupations and change in wages: a panel analysis of Britain, Germany, and Switzerland. SOEPpapers on Multidisciplinary Panel Data Research [online]. 2015, n. 731 [viewed 08 September 2022]. https://doi.org/10.1093/sf/sov099. Available from: https://ideas.repec.org/p/diw/diwsop/diw_sp731.html

Para ler o artigo, acesse

GERONIMO DA SILVA, Y. and VERZOLA VAZ, D. Por que as ocupações “femininas” pagam menos? Um estudo longitudinal. Rev. bras. estud. popul. [online]. 2022, vol. 39, e0212[viewed 08 September 2022]. https://doi.org/10.20947/S0102-3098a0212. Available from: https://www.scielo.br/j/rbepop/a/hRNYKTpsB3P5GrGWn6xk7nw/

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Yasmin Geronimo da Silva: https://orcid.org/0000-0002-5896-5679

Daniela Verzola Vaz:  https://orcid.org/0000-0003-4505-6318

Revista Brasileira de Estudos de População – RBEPOP: https://www.scielo.br/j/rbepop/

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

DA SILVA, Y.G. and VAZ D.V. Ocupações “femininas” são desvalorizadas no Brasil e ajudam explicar menor nível salarial das mulheres [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2022 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2022/09/08/ocupacoes-femininas-sao-desvalorizadas-no-brasil-e-ajudam-explicar-menor-nivel-salarial-das-mulheres/

 

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