Como os jovens vivenciam a democratização do acesso ao ensino superior?

Adriano Souza Senkevics, Pesquisador no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Brasília, DF, Brasil. 

Logo do periódico Educação em Revista.

A democratização do ensino superior no Brasil resultou em uma tensão entre uma lógica de ação meritocrática e outra pragmática, refletida nas experiências de jovens em transição para a universidade. Alguns adotam uma postura de “viração”, aceitando qualquer diploma ou ocupação como forma de mobilidade social, enquanto outros perseguem carreiras específicas, acreditando no esforço individual como chave para o sucesso. 

Contudo, repetidos insucessos frequentemente os conduzem a um caminho mais flexível e prático. A inserção desses jovens no ensino superior desafia as normas estabelecidas, evidenciando as barreiras estruturais da sociedade brasileira que limitam a integração de massas juvenis nesse nível educacional. Estas são algumas conclusões do estudo recém-publicado no periódico Educação em Revista intitulado Juventude e acesso ao ensino superior: sobre o não lugar de vestibulando.

O trabalho de campo foi desenvolvido a partir de cursos pré-vestibulares comunitários (os “cursinhos populares”) do Distrito Federal, no ano de 2018, por Adriano Senkevics, com a orientação de Marília Carvalho. É parte de uma tese de doutorado defendida pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e reconhecida com o Prêmio Capes de Tese na área de Educação e o Grande Prêmio Capes de Tese da área de Humanidades. Insere-se, ademais, em um contexto mais amplo de procurar compreender as transformações no acesso ao ensino superior entre os anos de 1991 e 2020. Esse período compreende um intervalo de grandes mudanças em que o Brasil migrou de um “sistema de elite” para um “sistema de massa”, com todos os desafios que essa alteração implica sobre o direito à educação e a vida dos jovens e de suas famílias.

Mapa ilustrando o Distrito Federal, no qual estão destacadas as áreas onde viviam os jovens entrevistados na pesquisa. Trata-se de 12 regiões administrativas da capital, uma das cidades mais desiguais do país.

Imagem: elaboração dos autores.

Figura 1. Mapa das Regiões Administrativas do Distrito Federal Habitadas pelos Participantes da Pesquisa.

Nesse contexto, os jovens das camadas populares em condição de vestibulandos vivenciam uma espécie de não lugar da transição do ensino médio ao superior. Para além da dimensão educacional, a realidade contemporânea é palco de uma erosão das noções tradicionais de carreira e salário, impulsionada por um contexto de trabalho instável e precário – mesmo para os diplomados – que intensifica o fenômeno da “viração”, termo muito bem desenvolvido por Ludmila Abílio (2014). 

Os jovens de origem popular, ao tentarem acessar o ensino superior, revelam a precariedade de suas posições sociais em um cenário onde a possibilidade de construir um futuro estável se torna cada vez mais distante. Esse cenário dialoga com as conclusões de Carmen Leccardi (2005) de que a juventude vive um “presente estendido”, em especial para aqueles que experimentam o “limbo” de uma posição incerta em que ainda não se tem uma carteira de trabalho nem tampouco uma carteirinha de estudante.

Assim, o artigo parte das perspectivas de jovens brasilienses para lançar luz sobre como um fenômeno macroestrutural da sociedade brasileira – a evolução da democratização do acesso ao ensino superior – é vivenciado por indivíduos que estão, no seu dia a dia, buscando uma vaga em um sistema educacional que, apesar de nunca ter se expandido tanto, parece tão distante e tão custoso de se adentrar.

Finalmente, valem algumas palavras sobre o processo de avaliação de pares aberta. O manuscrito foi avaliado por dois excelentes pesquisadores que dialogaram diretamente com os autores, visando o esclarecimento de dúvidas e o aprimoramento do texto. Diferentemente do envio de um parecer anônimo, ocorreu uma interação direta em reunião virtual, a qual se somou a um texto com cuidadosas considerações. Essa experiência inovadora permitiu uma troca bastante produtiva entre autores e avaliadores e contribuiu para validar as principais conclusões do manuscrito.

Semana Especial Educação em Revista

Referências

ABÍLIO, L. Sem maquiagem: o trabalho de um milhão de revendedoras de cosméticos. São Paulo: Boitempo/Fapesp, 2014.

LECCARDI, C. Para um novo significado do futuro: mudança social, jovens e tempo. Tempo Social [online]. 2005, vol. 17, no. 2, pp. 35-57 [viewed 06 June 2024].  https://doi.org/10.1590/S0103-20702005000200003. Available from: https://www.scielo.br/j/ts/a/3p3mXn5TfgkkGSnWsXZ3zxr/   

Para ler o artigo, acesse

SENKEVICS, A.S. and CARVALHO, M.P. Juventude e acesso ao ensino superior: sobre o não lugar de vestibulando. Educação em Revista [online]. 2023, vol. 39, pp. 1-19 [viewed 06 June 2024]. https://doi.org/10.1590/0102-469841621. Available from: https://www.scielo.br/j/edur/a/hj8XkJcXbKfbnGncvrccxCy/  

Links externos

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Adriano Senkevics – Perfil do autor: https://sites.google.com/view/asenkevics/

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

SENKEVICS, A.S. Como os jovens vivenciam a democratização do acesso ao ensino superior? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2024 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2024/06/06/como-os-jovens-vivenciam-a-democratizacao-do-acesso-ao-ensino-superior/

 

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