Preconceito como manutenção das desigualdades: estudos de raça/etnia no Brasil

Por Kátia Kishi, jornalista – Labjor/Unicamp, Campinas, São Paulo, Brasil

PUSP_logoA Organização das Nações Unidas (ONU) apresentou um relatório em meados de 2014 apontando que o Brasil vive uma “falsa democracia racial” e que nega a existência de um racismo “estrutural e institucional” com uma população de 50,7% negra. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) reforçam a visão de desigualdade ao apontar que: o desemprego entre negros é 50% maior que entre brancos, os negros possuem 1,6 ano de estudo a menos que brancos, a taxa de mortalidade infantil entre negros é 60% maior que a população branca, além de várias diferenças em outros aspectos de qualidade de vida e relatos diários que evidenciam essa discriminação.

Com esse panorama, faz-se necessário o constante estudo sobre o preconceito brasileiro em diversas áreas da ciência, sendo assim, Renata Rocha Tsuji da Cunha e Alessandro de Oliveira dos Santos, ambos do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP) publicaram o artigo “Aniela Meyer Ginsberg e os estudos de raça/etnia e intercultura no Brasil” nesta última edição de 2014 do periódico “Psicologia USP”, publicação do IP-USP.

O artigo resgata e analisa as contribuições de Aniela Meyer Ginsberg (1902-1986) que estudou dos anos 40 aos 70 o psicológico brasileiro sobre raça e etnia, evidenciando que a desigualdade vem das interações dos indivíduos com a sociedade. O artigo traz a reflexão desses estudos, pois Ginsberg foi uma pesquisadora que trouxe muitas contribuições metodológicas de pesquisa sobre o assunto na área da psicologia, como o estudo realizado para o Projeto Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e Cultura), Pesquisas sobre as Atitudes de um Grupo de Escolares de São Paulo em Relação com as Crianças de Cor (1955), que por meio de um jogo lúdico com bonecos e quadros do cotidiano pudesse analisar as atitudes de crianças que informassem se ocorria nos anos 50 preconceito de raça/etnia e suas formas e graus. Entre os resultados relatados, há o prestígio das crianças brancas que eram escolhidas com mais frequência que as outras para brincadeiras ou para serem companheiras de carteira do que as crianças negras que nas escolas pesquisadas representavam apenas 19,7% do corpo estudantil no ensino secundário. Entre os elementos que destacavam a desigualdade étnico/racial, o estudo destaca a linguagem como forte indício de descriminação: a maioria das crian­ças brancas empregava a palavra “moreno” para referir-se ao “mulato”, enquanto dentre os adultos esta denominação era utilizada, principalmente pelos próprios mulatos, ‘tal­vez para esconder a origem negra de sua cor’”.

Pesquisas recentes mostram que o preconceito continua presente na atualidade. Segundo Renata, apesar dos avanços na educação infantil, como a introdução da lei que institui o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana, ainda há muitas dificuldades no desenvolvimento de uma educação multicultural no país, o que acarreta no racismo na infância. Entre as constatações desses estudos, nota-se a discriminação com o corpo/cabelo que são diferentes dos pré-determinados “padrões de beleza” no ambiente escolar, isso se evidencia com o desejo da criança negra ter o cabelo liso e serem brancas. Também é notável a diferença no tratamento social, por exemplo, um estudo sobre a creche e a questão racial, produzido pela UFSCAR em 2004, aponta que crianças brancas recebem mais colos das professoras que as negras, que normalmente ganham mais apelidos pejorativos.

A autora afirma que um dos objetivos da pesquisa é “mostrar que a Psicologia Social sempre esteve envolvida na tentativa de compreender as relações étnico-raciais brasileiras; isso porque, ainda hoje, esse tema e a desconstrução do racismo (e de outros preconceitos) pouco aparecem ao longo da formação de psicólogas/os, o que é imprescindível em um país estruturado e marcado pelo racismo e pela desigualdade étnico-racial, como o Brasil”.

Para ler o artigo, acesse:

CUNHA, R.R.T.,  and  SANTOS, A.O. Aniela Meyer Ginsberg e os estudos de raça/etnia e intercultura no Brasil. Psicol. USP [online]. 2014, vol.25, n° 3, pp. 317-329. [viewed February 23th 2015]. ISSN 0103-6564. DOI:  10.1590/0103-656420130013. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65642014000300317&lng=en&nrm=iso

Link externo:

Psicologia USP – http://www.scielo.br/pusp/

Contato:

Renata Rocha Tsuji da Cunha- IP-USP, e-mail: renatartc@usp.br

[Revisado em 20/03/2015]

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

KISHI, K. Preconceito como manutenção das desigualdades: estudos de raça/etnia no Brasil [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2015 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2015/03/19/preconceito-como-manutencao-das-desigualdades-estudos-de-racaetnia-no-brasil/

 

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