Como lidar com a natureza e composição de transtornos mentais? Investigações com os transtornos da personalidade borderline e antissocial

Lucas de Francisco Carvalho, Professor do Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade São Francisco, Campinas, SP, Brasil

Nelson Hauck Filho, Professor do Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade São Francisco, Campinas, SP, Brasil

Giselle Pianowski, Pós-doutoranda do Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade São Francisco, Campinas, SP, Brasil

Luana Comito Muner, Professora do Curso de Psicologia, Faculdade Cathedral, Boa Vista, Roraima, Brasil

O artigo “Latent structure of antisocial and borderline personality disorders: a taxometric research”, publicado no periódico Paidéia (v. 29), problematiza a natureza de dois transtornos da personalidade específicos, antissocial e borderline. A escolha pelo foco nesses dois transtornos se deu tanto pelo prejuízo apresentado por pessoas com esses diagnósticos, quanto por similaridades entre eles, identificadas pela alta comorbidade, bases neurobiológicas compartilhadas e aspectos etiológicos. O traço chave para as similaridades entre o antissocial e o borderline parece ser a impulsividade, embora os mecanismos subjacentes e expressões manifestas desse traço variem nos dois transtornos.

Estudos prévios (ARNTZ et al., 2009; KERRIDGE; SAHA; HASIN, 2014; MARCUS et al., 2006) parecem não sustentar a proposta categórica para os transtornos antissocial e borderline. Isto é, a maior parte das pesquisas sugere que esses transtornos apresentam uma natureza dimensional, embora existam algumas evidências opostas. Nossa pesquisa se enquadra nesse nicho, buscando verificar a natureza desses transtornos e somar evidências à literatura científica.

Participaram do estudo, 282 pacientes e 7.091 não-pacientes, todos adultos, que responderam o Inventário Dimensional Clínico da Personalidade (IDCP), uma escala de autorrelato para avaliação de traços patológicos. Especificamente, foram consideradas as seguintes dimensões do IDCP: Agressividade, Grandiosidade e Impulsividade (antissocial) e Dependência, Instabilidade de Humor e Impulsividade (borderline). Métodos modernos taxométricos foram utilizados para análise dos dados, permitindo simular dados para as duas condições, verificando para qual condição (categórica ou dimensional) os dados são mais similares. Especificamente, os métodos utilizados foram MAMBAC, MAXEIG e Lmode.

Os resultados encontrados sugeriram uma clara estrutura dimensional para o transtorno da personalidade antissocial, indicando que não há uma distinção natural entre pessoas com e sem esse diagnóstico, mas sim um continuum. O mesmo não ocorreu para o transtorno da personalidade borderline, isto é, os resultados encontrados foram ambíguos, não permitindo uma conclusão clara. Esse resultado pode sugerir que esse transtorno não tenha, de fato, uma natureza específica entre categórica e dimensional, ou pode sinalizar limitações do estudo (e.g., uso somente de escala de autorrelato).

Definir a natureza dos transtornos mentais, e especificamente dos transtornos da personalidade, tem impacto direto na qualidade de vida das pessoas com esses diagnósticos, já que o curso e formato dos tratamentos variam de acordo com esses pressupostos. Se por um lado, ainda estamos longe de fecharmos essa lacuna, por outro, estudos como o presente, auxiliam na longa caminhada para responder essa questão.

Referências

ARNTZ, A. et al. Taxometric evidence for the dimensional structure of cluster-C, paranoid, and borderline personality disorders. J Pers Disord., v. 23, n. 6, p. 606-628, 2009. e-ISSN: 1943-2763 [viewed 24 April 2019]. DOI: 10.1521/pedi.2009.23.6.606. Avaliable from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20001178

KERRIDGE, B. T.; SAHA, T. D.; HASIN, D. S. DSMIV antisocial personality disorder and conduct disorder: evidence for taxonic structures among individuals with and without substance use disorders in the general population. J Stud Alcohol Drugs., v. 75, n. 3, p. 496-509, 2014. e-ISSN: 1938-4114 [viewed 24 April 2019]. DOI: 10.15288/jsad.2014.75.496. Avaliable from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24766762

Marcus, D. K. et al. Is antisocial personality disorder continuous or categorical? A taxometric analysis. Psychol Med., v. 36, n. 11, p. 1571-1581, 2006. e-ISSN: 1469-8978 [reviewed 24 April 2019]. DOI: 10.1017/S0033291706008245. Avaliable from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/16836795

Para ler os artigo, acesse

CARVALHO, L. F. et al. Latent Structure of Antisocial and Borderline Personality Disorders: A Taxometric Research. Paidéia (Ribeirão Preto), v. 29, e2902, 2019. ISSN: 0103-863X [viewed 24 April 2019]. DOI: 10.1590/1982-4327e2902. Available from: http://ref.scielo.org/82fncm

Link externo

Paidéia (Ribeirão Preto) – PAIDEIA: www.scielo.br/paideia

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

CARVALHO, L. F., HAUCK FILHO, N., PIANOWSKI, G. and MUNER, L. C. Como lidar com a natureza e composição de transtornos mentais? Investigações com os transtornos da personalidade borderline e antissocial [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2019 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2019/05/09/como-lidar-com-a-natureza-e-composicao-de-transtornos-mentais-investigacoes-com-os-transtornos-da-personalidade-borderline-e-antissocial/

 

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