Julia Piva Larangeira, Psicóloga formada pela UNIFESP e atualmente Residente do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Mental pela UNIFESP. São Paulo, São Paulo, Brasil.
Eunice Nakamura, Departamento de Políticas Públicas e Saúde Coletiva, Instituto de Saúde e Sociedade, Universidade Federal de São Paulo. Santos, São Paulo, Brasil.
O artigo intitulado “Porque eu tinha que cuidar”: significados de cuidado para mulheres cuidadoras de crianças atendidas por um serviço de Saúde Mental é resultado de uma pesquisa que utilizou o método etnográfico, por meio de entrevistas semiestruturadas, para dialogar com mulheres cuidadoras durante a pandemia de Covid-19.
O estudo objetivou compreender os significados de cuidado elaborados por mulheres familiares que cuidam de crianças atendidas em um Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSij) na cidade de Santos. A pesquisa de Iniciação Científica teve duração de um ano e foi executada entre abril de 2020 até março de 2021, contando com bolsa concedida pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp – Processo 2019/23981-3).
A pesquisa e o artigo resultante foram realizados por uma estudante de graduação em Psicologia, que desejava estudar gênero, e uma professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que há muitos anos vem se dedicando ao estudo dos temas saúde mental, cuidado e infância. Esse encontro deu origem à pesquisa, que se baseou na intersecção entre duas temáticas: gênero e cuidado.
O diálogo se estendeu a outras pesquisadoras e pesquisadores do Laboratório Interdisciplinar de Ciências Humanas, Sociais e Saúde (Lichss), coordenado pela professora, que também estudavam o tema do cuidado. Além disso, a proximidade da professora com um CAPSij, em Santos-SP, abriu a possibilidade de realização do estudo nesse serviço.
Para a efetivação desse projeto foram entrevistadas cinco mulheres familiares de crianças acompanhadas no serviço; sendo três mães e duas avós. Foi elaborado um roteiro de entrevistas semiestruturadas que permitiu uma linha condutora ao diálogo, que priorizava o objetivo principal e, ao mesmo tempo, se abria para o inesperado do encontro entre as mulheres e a pesquisadora. Para a análise, as entrevistas foram gravadas e transcritas com a permissão das mulheres.
Os dados coletados a partir dessas entrevistas, baseadas no método etnográfico, foram submetidos a interpretações secundárias, a partir do que a pesquisadora identificou como temas que se repetem nas diversas falas. Como resultado explicitado no artigo, foram identificados alguns significados formulados por essas mulheres; sendo eles: cuidar é preciso, cuidar é mudar a vida e cuidar é manter uma rotina.
A partir dessas categorias, nota-se que o cuidado é tratado pelas mulheres entrevistadas como uma atividade essencialmente realizada por elas, como ressaltado no artigo. A presença dessas mulheres é imprescindível na cena do cuidado, contrapondo-se à possibilidade que os homens têm de renegociar o cuidar. Tão imprescindível é a participação da cuidadora que tanto a sua recusa em cuidar como o mal cuidado são utilizados na narrativa social para justificar eventuais comportamentos de seus filhos.
Esses significados nos ajudam a pensar sobre o lugar que o cuidado ocupa na vida dessas mulheres e como elas são mobilizadas por ele, uma vez que são elas que diariamente acompanham as crianças nos serviços de saúde mental. Portanto, ouvi-las e ponderar sobre o que elas pensam sobre suas vidas significa também refletir sobre as relações sociais que são construídas com elas e suas filhas, filhos, netas e netos cotidianamente. Entender melhor essas relações pode melhorar a qualidade do cuidado que provemos a elas, especialmente através de políticas públicas, mas também contribuir para a desnaturalização da feminização do cuidado.
Referências
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