Cristiane Miglioranza, jornalista, assistente editorial de Horizontes Antropológicos. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil.
Apesar de ser uma publicação temática, Horizontes Antropológicos dedica uma seção específica a trabalhos inéditos e considerados de ponta na pesquisa antropológica e que não necessariamente são alinhados ao tema de cada número. O Espaço Aberto traz trabalhos de pesquisadoras/es com reconhecimento internacional entre seus pares e que colaboram com a revista, preferencialmente, a convite dos editores. “Desde o início pensou-se em reservar um espaço para publicar textos antropológicos qualificados que não diziam respeito aos dossiês. Ao longo dos anos, o Espaço Aberto também foi ocupado para publicar conferências proferidas no PPGAS ou em outros eventos científicos, entrevistas realizadas com importantes antropólogas e antropólogos e mesmo textos encomendados a especialistas sobre temas específicos. O Espaço Aberto é uma seção que se caracteriza pela qualidade científica, seja dos artigos, seja das entrevistas publicadas”, explica o editor Ari Pedro Oro, há cinco anos responsável pela seção.
No Espaço Aberto do número 60 – Antropologia da Criança, destacamos a entrevista com Anna Tsing, realizada na cidade de Santa Cruz, Califórnia, por Luz Gonçalves Brito (PPGAS-UFRGS) durante seu estágio de doutorado na Universidade da Califórnia-San Diego, intitulada “Futuros possíveis dos mundos sociais mais que humanos: entrevista com Anna Tsing”. Tsing leciona no Departamento de Antropologia da Universidade da Califórnia-Santa Cruz. Seu livro The mushroom at the end of the world (2015) foi laureado pelo Victor Turner Prize e pelo Gregory Bateson Prize, em 2016. O trabalho plenamente maduro de Anna Tsing impulsiona a força da descrição crítica como um dos mais relevantes aspectos da prática antropológica. Tsing entende que tal forma de descrição é uma responsabilidade de antropólogas e antropólogos em tempos de tamanha turbulência e complexidade. Com poucos de seus textos traduzidos para o português, esta entrevista se soma a dois artigos e também a uma coletânea recentemente publicada. Nela, Tsing discorre sobre sua carreira acadêmica e seus interesses de pesquisa, apresenta detalhes sobre a trajetória de seu pensamento, aborda conceitos que lhe são caros, tais como “Antropoceno”, “escala” e “socialidade mais que humana” e ressalta as contribuições da pesquisa antropológica na atualidade.
A proposta analítica de Tsing et al formulada originalmente para o debate sobre antropoceno é transposta de forma inspiradora para o campo da proteção da infância (em particular a adoção de crianças) por Claudia Fonseca no artigo “Cultivando proliferações indomáveis”, que também compõe o Espaço Aberto do número 60. Diante da lógica simplificada que permeia e orienta as políticas públicas, Fonseca recorre às orientações de Tsing et al (2019), sobretudo à ideia de “proliferações selvagens” para buscar uma ponte possível entre os dados etnográficos (densos e ao mesmo tempo efêmeros e contextualmente situados) e os sistemas abrangentes (com consequências em larga escala e de longo alcance). A autora alia tais reflexões a sua longa e reconhecida trajetória de pesquisa no campo da adoção para pensar caminhos possíveis que mesclem valor, burocracia e emoção. Devido às “proliferações indomáveis”, Fonseca nos instiga a refletir sobre as transformações dos atores “pivôs” do processo adotivo e a vislumbrar os espaços “remendados” do sistema de proteção à infância não como problemas, mas sobretudo como “oportunidades produtivas”.
Atentos a contribuições que as releituras dos clássicos proporcionam ao campo, os editores programaram para as próximas edições análises de duas obras de referência. O centenário de Os Argonautas do Pacífico Ocidental, de Bronislaw Malinowksi, contará com reflexões de José Guilherme Cantor Magnani (USP) e de Mariza Peirano (UnB). Os textos serão publicados no número 61 – Governança Reprodutiva, previsto para novembro de 2021. Já Ensaio sobre a dádiva, de Marcel Mauss, será abordada no Espaço Aberto do número 62 – História das Antropologias do Mundo, previsto para janeiro de 2022.
Referências
FONSECA, C. Cultivando proliferações indomáveis: considerações antropológicas sobre as políticas de proteção à infância. Horizontes Antropológicos [online]. 2021, vol.27, no.60, pp.419-451 [viewed 19 August 2021]. https://doi.org/10.1590/S0104-71832021000200015. Available from: http://ref.scielo.org/hpxs7y
TSING, A. L., MATHEWS, A. and BUBANDT, N. Patchy Anthropocene: landscape structure, multispecies history, and the retooling of anthropology. Current Anthropology [online]. 2019, vol.60, supl.20, pp.S186-S197 [viewed 19 August 2021]. https://doi.org/10.1086/70339. Available from: https://www.journals.uchicago.edu/doi/10.1086/703391
Para ler o artigo, acesse
GONÇALVES BRITO, L. Futuros possíveis dos mundos sociais mais que humanos: entrevista com Anna Tsing. Horizontes Antropológicos [online]. 2021, vol.27, no.60, pp.405-417 [viewed 19 August 2021]. https://doi.org/10.1590/S0104-71832021000200014. Available from: http://ref.scielo.org/d69m8s
Links Externos
Anna Tsing – https://anthro.ucsc.edu/faculty/index.php?uid=atsing
Ari Pedro Oro – http://lattes.cnpq.br/3935346650549291
Claudia Lee Williams Fonseca – http://lattes.cnpq.br/8620249965221608
Luz Gonçalves Brito – http://lattes.cnpq.br/8206675970656885
Horizontes Antropológicos – HA: https://www.scielo.br/ha/
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