Os partidos políticos são internamente democráticos?

André Rehbein Sathler, Professor do Mestrado em Poder Legislativo da Câmara dos Deputados, Brasília, DF, Brasil

Pesquisadores do Mestrado em Poder Legislativo da Câmara dos Deputados realizaram uma pesquisa “A oligarquia desvendada: organização e estrutura dos partidos políticos brasileiros”, publicado na DADOS (v. 62, n. 2), sobre a organização interna dos partidos políticos brasileiros, a partir da análise de seus estatutos. A pesquisa comprova estudos e intuições anteriores de cientistas políticos, que, a partir de outros pontos de partida, identificam que os partidos políticos não são democráticos em sua gestão interna. A novidade do estudo foi verificar esse ponto a partir de uma perspectiva normativa, com análise dos estatutos de todos os partidos então existentes, tendo se verificado a existência de diversos indicadores de falta de democracia na gestão interna dos partidos, que os autores chamaram de marcadores oligárquicos.

Os autores utilizaram técnicas de pesquisa documental e normogenética. Também criaram alguns índices operacionais (quantitativos) para gerar classificações dos partidos quanto às dimensões de facilidade e dificuldade de filiação bem como facilidade e dificuldade de desligamento de membros.

Entre os marcadores oligárquicos encontrados pelos autores, destacam-se:

  • controle das condições de filiação e para a manutenção da filiação, notadamente o exercido sobre filiações de lideranças político-partidárias já reconhecidas;
  • organização administrativa de perfil conexional, com amplas possibilidades intervencionistas dos órgãos superiores nos órgãos inferiores, tanto em termos hierárquicos quanto em termos geográficos;
  • enfeixamento de amplos poderes (plenos nos interregnos dos congressos e convenções) em comissões executivas reduzidas, inclusive competências de convocação e presidência dos diretórios e convenções;
  • manutenção de intrincada rede de membresias nativas nos órgãos deliberativos, diretivos e nas comissões executivas;
  • existência e atuação de órgãos com competências amplas e ambíguas, como conselhos políticos, amplamente ocupados por lideranças partidárias já consolidadas e tradicionais;
  • adoção de sistema eleitoral indireto para a ocupação dos cargos diretivos do partido, somado à prática de eleição mediante inscrição de chapas;
  • possibilidade incondicional de reeleição dos dirigentes partidários;
  • exigência de pré-requisitos aos candidatos a cargos diretivos no partido, inclusive de critérios ambíguos e de aplicação discricionária;
  • alterações sucessivas nos estatutos, ao sabor e conveniência das lideranças partidárias existentes.

O trabalho realizado dialoga com a literatura existente sobre partidos políticos, particularmente com algumas referências clássicas em Ciência Política, a saber: Duverger (1980), Michels (1949), Sartori (1982) – além de trabalhos mais recentes, como os de Hazan, Rahat e Katz (2008) e Ribeiro (2013).

Quadro 1. Partidos políticos. Requisitos para filiação. Consolidação.

Receptivos

0 ˫7

Seletivos

8 ˫ 15

Aceptivos

16 ˫

PR      PSDC      PCD      PTC

PSTU      PCB      PTB      PROS

PTdoB      SD

PSB      PSL      PRB      PSOL

PEN      DEM      PSC      PP

PRTB      PSD      PRP      PHS

PMDB      PTN      PPS      PV

PDT      PPL      PMN

PCdoB

PT

PSDB

FONTE: Elaborado pelos autores.

Quadro 2. Partidos Políticos. Critérios de Desfiliação. Consolidação

Brandos

0 ˫4

Rigorosos

5 ˫9

Severos

10 ˫

DEM, PTC, PMN, PMN, PV, PP, PSTU, PCB, PCO, PTN, PSD, PEN, PROS, SD,PDT,PT,PSB, PSC,PPS,PTdoB,PSOL,PPL PMDB,PTB,PRP,PRTB,

PHS,PSL,PRB,PR

PSDB, PSDC
FONTE: Elaborado pelos autores.

Referências

DUVERGER, M. Os partidos políticos. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: UnB, 1980.

MICHELS, R. Political parties. A sociological study of the oligarchical tendencies of modern democracy. Jarrold e Sons e 11, Warwick Lane E.C. Londres. Edição Kindle, 1949.

HAZAN, R. Y., RAHAT, G., KATZ and R. S. Democracy and political parties: on the uneasy relationships between participation, competition and representation. Party Politics, v. 14, n. 6, p. 663-683, 2008. e-ISSN: 1460-3683 [viewed 25 September 2019]. DOI: 10.1177/1354068808093405. Avaliable from: https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/1354068808093405

RIBEIRO, P. F. Organização e poder nos partidos brasileiros: uma análise dos estatutos. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 10, p. 225-265, 2013.

SARTORI, G. Partidos e sistemas partidários. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: UnB, 1982.

Para ler o artigo, acesse

GUIMARÃES, A. R. S., RODRIGUES, M. R. and BRAGA, R. de J. A oligarquia desvendada: organização e estrutura dos partidos políticos brasileiros. Dados, v. 62, n. 2, e20160046, 2019. ISSN: 0011-5258 [viewed 11 November 2019]. DOI: 10.1590/001152582019181. Available from: http://ref.scielo.org/wq6gjq

Link externo

Dados – Revista de Ciências Sociais – DADOS: www.scielo.br/dados/

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

SATHLER, A. R. Os partidos políticos são internamente democráticos? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2019 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2019/11/18/os-partidos-politicos-sao-internamente-democraticos/

 

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