Complexidade do instrumento e escala urbana: contradições no uso de Operações Urbanas Consorciadas em cidades médias

Rafael Kalinoski, Doutorando em Gestão Urbana na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Membro do Corpo Editorial da Revista Urbe, Professor no Centro Universitário de Tecnologia de Curitiba (UNIFATEC) e no Instituto Municipal de Administração Pública (IMAP) da Prefeitura Municipal de Curitiba, Curitiba, PR, Brasil.

Logo do periódico urbe. Revista Brasileira de Gestão Urbana.O “planejamento estratégico” das cidades emerge a partir dos anos 1980 e refere-se a iniciativas para grandes projetos urbanos que envolvam agentes públicos e privados na transformação acelerada de grandes áreas urbanas. Esse modelo foi concebido em países capitalistas centrais e adaptado por países capitalistas periféricos onde as condições locais são diferentes daquelas onde tal lógica fora concebida. No Brasil, o Estatuto da Cidade aprovado em 2001 inclui o instrumento chamado de Operação Urbana Consorciada (OUC) para viabilizar obras de transformação estrutural das cidades e, supostamente, garantir a justa distribuição dos benefícios e ônus da urbanização, preceito da política urbana da Constituição Federal de 1988.

A forma como o instrumento é utilizado no contexto metropolitano está alinhada à concepção do planejamento estratégico no Norte Global. O instrumento é recorrentemente criticado por se tornar um meio de favorecer interesses do mercado imobiliário em detrimento de interesses comuns a todos cidadãos urbanos. As pesquisas sobre o assunto, entretanto, tendem a se concentrar em cidades de grande porte. Todavia, no artigo Operações Urbanas Consorciadas em Cidades de Médio Porte: buscando o equilíbrio nos projetos urbanos olha-se para o instrumento das OUCs em cidades médias, com população entre 100 mil e 500 mil habitantes, e não inseridas em regiões metropolitanas.

A pesquisa encontrou dificuldades metodológicas que acendem um alerta sobre a transparência e o ideal Constitucional de planejamento democrático. Por meio da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC) realizada pelo IBGE, concluiu-se que 214 dos 324 municípios brasileiros com população acima de 100 mil habitantes possuem OUCs. Foi ao levantar informações locais, socioespaciais e de planejamento urbano desses 214 municípios que a falta de transparência das gestões municipais chamou a atenção das pesquisadoras e deixou lacunas no estudo. Depois de excluir os municípios de grande porte e os de médio porte em regiões metropolitanas, foram estudadas 11 Operações em oito municípios representados pelos pontos azuis da Figura 1.

Mapa do Brasil com fronteiras geográficas. Círculos verdes indicando cidades de médio e grande porte. Duas listas com os nomes das cidades de cada categoria.

Imagem: Siqueira, Doebeli e Schelder (2022).

Figura 1. Cidades médias e grandes com leis específicas para OUC.

É crítico o fato de que em apenas dois dos oito municípios de médio porte a OUC está vinculada a uma zona urbana, enquanto nos demais ela não tem ancoragem espacial e assemelha-se ao texto genérico do Estatuto da Cidade. Isso demonstra fraco diálogo entre as necessidades e metas específicas para o desenvolvimento urbano local e a lógica de um instrumento de tamanha complexidade. A pesquisa também apontou expressiva falta de transparência e participação popular na elaboração das leis específicas dessas OUCs, o que vai na contramão dos ideais democráticos da política urbana incluídos na Constituição.

As pesquisadoras concluem apontando resultados parecidos com as críticas a operações em grandes cidades. Encontraram ênfase a investimentos viários com pouca prioridade para benefícios sociais e melhorias ambientais, além de recorrentemente encontrarem incentivos para maior potencial construtivo, maior gabarito e alteração de uso do solo.

O instrumento de OUC não foi idealizado para servir como mecanismo de manobra para flexibilizar a legislação urbana, mas sim para viabilizar parâmetros específicos com o objetivo maior de promover transformações estruturais no espaço urbano que tenham preocupação social e ambiental. Entretanto, parece que no caso das cidades médias estudadas ocorre o oposto: a flexibilização ocupa mais espaço que o ideal de melhoria estrutural de acordo com as necessidades comuns locais. Nesses casos, há instrumentos mais simples para viabilizar projetos especiais e conclui-se questionando a pertinência de um instrumento da complexidade das OUCs para implementar projetos da complexidade das cidades médias.

Para ler o artigo, acesse

SIQUEIRA, M.T., DOEBELI, L.S. and SCHELDER, C.S.L. Operações Urbanas Consorciadas em Cidades de Médio Porte: buscando o equilíbrio nos projetos urbanos. urbe, Rev. Bras. Gest. Urbana [online]. 2022, vol. 14, e20210175 [viewed 1 February 2023]. https://doi.org/10.1590/2175-3369.014.e20210175. Available from: https://www.scielo.br/j/urbe/a/hzxyJCykcSNRfkwSsKvZbVS/

Links externos

urbe. Revista Brasileira de Gestão Urbana – URBE: https://www.scielo.br/urbe/

urbe. Revista Brasileira de Gestão Urbana – Redes Sociais: Facebook | Twitter

Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) – Redes Sociais: Facebook | Twitter | Instagram

Programa de Pós-graduação em Gestão Urbana (PPGTU / PUCPR) – Facebook: https://www.facebook.com/ppgtu/

Rafael Kalinoski – LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/rafael-kalinoski/

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

KALINOSKI, R. Complexidade do instrumento e escala urbana: contradições no uso de Operações Urbanas Consorciadas em cidades médias [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2023 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2023/02/01/complexidade-do-instrumento-e-escala-urbana-contradicoes-no-uso-de-operacoes-urbanas-consorciadas-em-cidades-medias/

 

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Post Navigation