Andrea Cabello, Professor Associado II, Departamento de Economia, Universidade de Brasília (UNB), Brasília, DF.
Luís Grochocki, Analista em Ciência e Tecnologia, Ministério do Planejamento e Orçamento, Brasília, DF.
A endogamia acadêmica pode ser definida como a contratação de ex-alunos por uma instituição acadêmica, ou seja, um pesquisador é dito endógeno ou inbred, no temo em inglês, se trabalhar na mesma instituição onde obteve o título de doutor. Essa é uma questão bastante controversa pois se relaciona-se com uma possível lisura do processo de contratação de professores e pesquisadores e pode ter efeitos sobre a construção de redes de pesquisa e a produtividade científica das instituições, entre outras questões. No caso brasileiro, em que instituições públicas fazem contratações via concursos públicos, essa é uma questão bastante relevante.
No artigo Endogamy in the Brazilian Higher Education System: A descriptive analysis, utilizamos uma metodologia descritiva e, com base em dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), mostramos que o sistema de ensino superior brasileiro apresenta alto percentual de endogamia acadêmica. A endogamia ocorre em média em 23% das contratações acadêmicas em todo o país. Esse nível pode parecer baixo a princípio, mas é significativo quando comparado com os valores estimados para países com sistemas educacionais avançados como a Alemanha, por exemplo (1%).
Além disso, nossos dados mostram que as instituições acadêmicas brasileiras apenas se aproximam da média nacional (23%) em torno do 40º lugar. Por exemplo, em 2016, o campus-sede da Universidade de São Paulo (USP) teve 70% de seus bolsistas contratados internamente. Ambos os campi da Universidade de Campinas (Unicamp) também possuem alto índice de docentes ex-alunos, com 68,7% em Piracicaba e 55,3% em Campinas.
A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Universidade Estadual de São Paulo – campus São José dos Campus (Unesp) – também estão na margem de 50%. A maioria dessas universidades é bem classificada tanto no Brasil quanto na América Latina.
Em outras palavras, nossos resultados mostram que a taxa de endogamia difere significativamente entre diferentes tipos de instituições, áreas de conhecimento, estados e níveis de classificação universitária. De modo geral, a endogamia é mais provável de ser encontrada em instituições de elite estabelecidas e geograficamente concentradas nas regiões mais populosas e desenvolvidas do país, principalmente em programas de pós-graduação de elite de áreas STEM (science, technology, engineering and mathematics, ciência, tecnologia, engenharia e matemática) nas regiões Sul e Sudeste do Brasil.
Este artigo é o primeiro a mensurar a endogamia por instituição de ensino superior no Brasil, portanto traz uma clara contribuição à literatura. Também torna os seus resultados relevantes para formuladores de políticas públicas e universidades, especialmente quando se trata de vieses e lisura em políticas de contratação.
Esses resultados parecem estar de acordo com o encontrado em estudos de outros países, nos quais dois fatores podem estar em jogo: a prática do “nepotismo acadêmico”, ou seja, a adoção de chamadas públicas direcionadas que limitam propositalmente o leque de candidatos.
Além disso, até mesmo os próprios candidatos poderiam estar evitando concorrer a cargos em diferentes instituições/cidades por falta de incentivos ou de uma cultura de mobilidade no mercado de trabalho. Estas duas características explicariam parcialmente o impulso no sentido do estabelecimento de um mercado interno no meio acadêmico.
Além disso, o sistema de pós-graduação altamente concentrado nas regiões Sul e Sudeste reforça a endogamia em programas de elite, dificultando que acadêmicos qualificados sejam redistribuídos para outras regiões do Brasil, frustrando a melhoria dos programas nessas regiões. O Brasil promoveu recentemente políticas de descentralização e diversificação no seu ensino superior, mas parece que elas não foram suficientes para quebrar esses padrões duradouros.
Ter programas de pós-graduação realmente fortes em universidades específicas é estratégico, mas tê-los todos num número limitado de instituições e estados pode não ser a melhor política para desenvolver um sistema educacional nacional. Talvez o estabelecimento e o fortalecimento de programas em áreas específicas de forma geograficamente diversificada, possa ser uma forma de compartilhar melhor a qualidade dos acadêmicos e dos programas de pós-graduação em todo o país.
Para ler o artigo, acesse
CABELLO, A.F. and GROCHOCKI, L.F.M. Endogamy in the Brazilian Higher Education System: A descriptive analysis. Rev. Bras. Estud. Pedagog.[online] 2024, vol. 105, e5710 [viewed 24 January 2025]. https://doi.org/10.24109/2176-6681.rbep.105.5710. Available from: https://www.scielo.br/j/rbeped/a/Bqjw4tNHTnRnYC4kt63zk7z/
Links externos
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos – SciELO
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos – Site
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos – Redes sociais: X | Instagram
Como citar este post [ISO 690/2010]:
Últimos comentários