Hugo Lage e Rafael Tristão, alunos da graduação do curso de Relações Internacionais da PUC-Rio e participantes do Programa de Ensino e Tutoria (PET) da PUC-Rio, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Daniel Ricardo Castelan é professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Doutor em Ciências Políticas pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ (IESP-UERJ) e mestre em Relações Internacionais pelo Instituto de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), é graduado em relações internacionais pela UnB. Atualmente, Castelan é coordenador do projeto de pesquisa sobre liberalização comercial e coalizões domésticas, com o propósito de estudar o posicionamento das associações de classe brasileiras sobre as negociações comerciais.
O artigo “Domestic coalitions in the FTAA negotiations: the Brazilian Case”, escrito por Daniel Ricardo Castelan e publicado em Contexto Internacional, volume 38, número 1 de 2016, investiga o posicionamento de grupos domésticos nas negociações para o Acordo de Livre Comércio das Américas (ALCA).
A questão central trabalhada no artigo são os motivos que impediram a formação de uma aliança política entre grupos representantes dos trabalhadores e dos empresários, a despeito de ambos concordarem com pontos importantes das negociações.
Castelan propõe que apesar do interesse comum de se opor à ALCA, os interesses dos grupos analisados no artigo divergiam em várias outras áreas que, com abertura econômica, se tornaram prioridade para o empresariado e movimento sindical. Além disso, o autor também destaca a falta de homogeneidade nos interesses da classe empresária, identificando três grandes grupos com interesses e posições em relação à ALCA distintos. No âmbito das reflexões sobre a política externa brasileira atual, Daniel Castelan, em entrevista concedida aos alunos Hugo Lage e Rafael Tristão, ambos bolsistas do programa PET do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio, discute, em especial, o plano econômico proposto pelo governo interino de Michel Temer, o modelo desenvolvimentista brasileiro e a relação com o setor industrial, e, finalmente, a forma de participação dos trabalhadores nos projetos econômicos nacionais.
1. Poderia ser traçado um paralelo entre a campanha “Custo Brasil” dos anos 1990, e um possível “Plano Temer”, visto que esse último tem o apoio maciço da Fiesp e de outras partes do setor industrial? Nesse sentido, isso poderia ser uma retomada da agenda neoliberal no Brasil?
O programa “Uma ponte para o Futuro”, do PMDB, de fato incorpora uma série de propostas defendidas por associações empresariais desde os anos 1990. Algumas dessas demandas haviam saído de cena durante o período Lula, já que grande parte do empresariado nacional apoiou seu governo, mas começaram a ser vocalizadas com maior frequência na medida em que, depois de 2011, a crise econômica agravou-se e a base de apoio do PT se desfez. A reforma da legislação trabalhista, por exemplo, é pauta prioritária do empresariado desde a Constituição de 88. Com o enfraquecimento da base do PT, o PMDB tomou a frente na formulação de uma proposta mais condizente com essa agenda “neoliberal”, que inclui flexibilização de direitos trabalhistas, redução de direitos sociais como saúde e educação, reversão da política de aumento do salário mínimo, alterações na política externa, etc.
2. Ao longo do texto, o autor discorre sobre a posição da CNI com relação à liberalização do comércio e à inserção do Brasil na cadeia de produção mundial. Os industrialistas defendem, quando beneficiados, que as mercadorias devem ter maior facilidade para entrar, ou sair do país. A questão é: esse modelo desenvolvimentista, no qual o governo brasileiro cede às pressões industriais, contribuiu para criação de um setor industrial com interesses contraditórios, que gosta de demandar, mas não se preocupa em ser eficiente?
Acho que a pergunta simplifica um pouco as coisas. O empresariado preocupa-se sim com eficiência, mas, em todo lugar do mundo, preocupa-se também com concorrência. E apesar dos limites colocados por acordos internacionais, o governo brasileiro ainda tem em mãos alguns instrumentos de política comercial (ressalto que são muito limitados). Os interesses contraditórios do setor industrial, em matéria de comércio exterior, são decorrência da própria estrutura de produção, e não necessariamente das políticas desenvolvimentistas promovidas pelo Estado.
3. Finalmente, o texto apresenta uma análise detalhada e rica em dados acerca dos empresários, agricultores e industriais, diferente do que se percebe na parte que tange os trabalhadores. Esta diferença reflete a ausência de informações ou foi uma decisão metodológica?
Trata-se de uma característica do associativismo brasileiro. Os empresários defendem seus interesses através de um conjunto mais difuso de associações de classe do que os trabalhadores. Além dos sistemas corporativos oficiais – CNI, CNA, CNS, CNC e as federações estaduais – há uma série de associações empresariais que se manifestam sobre a agenda de comércio exterior. Para citar as mais expressivas, temos o Ícone representando parcela do agronegócio e a CEB representando o setor empresarial como um todo, mas também grupos setoriais como a ABINEE, a ABIMAQ, a ABIQUIM que se posicionam com frequência sobre as diretrizes de comércio exterior. O mesmo não acontece com os sindicatos trabalhistas. A “base” do sindicalismo está geralmente engajada na negociação de salários e condições de trabalho, geralmente consolidados nos acordos coletivos, e raramente se engaja na discussão do comércio exterior. Quem toma para si essa pauta são as centrais sindicais – a CUT e a CONTAG com maior intensidade e a Força Sindical e a CGT mais raramente. E, como essas centrais têm tido posicionamento semelhante (e a maioria conjunto – ambos integraram a REBRIP) – não foi preciso discorrer sobre a posição política assumida por cada uma ao longo do texto.
Para ler o artigo, acesse
CASTELAN, D. Domestic coalitions in the FTAA negotiations: the Brazilian case. Contexto int. [online]. 2016, vol.38, n.1, pp.313-348. [viewed 8th November 2016]. ISSN 0102-8529. DOI: 10.1590/S0102-8529.2016380100009. Available from: http://ref.scielo.org/833rxn
Link externo
Contexto Internacional – CINT: www.scielo.br/cint
Sobre Hugo Lage
Hugo Lage é aluno do quinto período do curso de Relações Internacionais da PUC-Rio e bolsista do programa PET do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio, cuja pesquisa é guiada pelo projeto intitulado “Brasil Global: desafios da inserção internacional brasileira em um mundo em transformação”.
Sobre Rafael Tristão
Rafael Tristão é aluno do quinto período do curso de Relações Internacionais da PUC-Rio e bolsista do programa PET do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio, cuja pesquisa é guiada pelo projeto intitulado “Brasil Global: desafios da inserção internacional brasileira em um mundo em transformação”.
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