A radicalidade do desamparo de mães refugiadas

Michele Carmona Aching e Tania Mara Marques Granato, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Programa de Pós-graduação em Psicologia, Campinas, SP, Brasil

Pesquisadoras da Pontifícia Universidade Católica de Campinas enfrentaram o desafio de desenvolver um modelo de atendimento psicológico afinado às necessidades de gestantes e jovens mães refugiadas da África quando começavam a chegar ao Brasil em virtude da onda de violência iniciada pelo grupo extremista Boko Haran. O artigo “O papel da rede de apoio a mães refugiadas” publicado em Estudos de Psicologia (Campinas) v. 35, n. 2, apresenta seus principais resultados.

O estudo se desenvolveu em um abrigo para gestantes e mães na cidade de São Paulo, onde a falta de preparo da equipe técnica e o preconceito das mães brasileiras abrigadas aprofundou a já precária situação das refugiadas que sofriam com a solidão, a distância dos familiares e de sua comunidade, a falta de um idioma comum para a comunicação e as diferenças culturais.

As mães africanas encontraram forte resistência por parte das mães brasileiras para compreender e, consequentemente, aceitar determinadas práticas maternas que as uniam às suas comunidades de origem e davam sentido à experiência materna (ROGOFF, 2005). Nesse contexto em que múltiplas necessidades se sobrepunham, as pesquisadoras se viram convocadas a ajudar na obtenção de documentos em nosso país, buscar na rede de apoio objetos que facilitassem a maternagem (WINNICOTT, 2000), compreender e proteger os rituais de cuidado infantil, mediar entrevistas com advogados e aproximar a equipe técnica de uma postura de acolhimento do estrangeiro.

O desamparo das mães refugiadas frente à violência sofrida em seu pais de origem, motivo da migração forçada, aliado ao ambiente desconhecido, diferente e algumas vezes hostil do pais de acolhida teve um papel central na elaboração de uma clínica winnicottiana transcultural (MORO, 2015). Tal proposta demanda um descentramento do psicoterapeuta, isto é, um afastamento de seus próprios valores, crenças e práticas a fim de se aproximar do universo cultural da refugiada e resgatá-la como sujeito de direito que precisa desenvolver seu próprio modo de ser mãe.

Referências

MORO, M. R. Psicoterapia transcultural da migração. Psicol. USP [online]. 2015, vol.26, n.2, pp.186-192. [viewed 24 July 2018]. ISSN 0103-6564. DOI: 10.1590/0103-6564D20140017. Available from: http://ref.scielo.org/qmbdpq

ROGOFF, B. A natureza cultural do desenvolvimento humano. São Paulo: Artmed, 2005.

WINNICOTT, D. W. Preocupação materna primária. In: WINNICOTT, D. W. Textos selecionados: da pediatria à psicanálise. Rio de Janeiro: Imago, 2000. p. 491-498.

Para ler o artigo, acesse

ACHING, M. C. and GRANATO, T. M. M. Role of a support network for refugee mothers. Estud. psicol. (Campinas) [online]. 2018, vol.35, n.2, pp.137-147. [viewed 24 July 2018]. ISSN 0103-166X. DOI: 10.1590/1982-02752018000200003. Available from: http://ref.scielo.org/8nvhs8

Link externo

Estudos de Psicologia (Campinas) – ESTPSI: www.scielo.br/estpsi

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

ACHING, M. C. and GRANATO, T. M. M. A radicalidade do desamparo de mães refugiadas [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2018 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2018/07/25/a-radicalidade-do-desamparo-de-maes-refugiadas/

 

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