Que contribuições a classificação de cor ou raça da população utilizada pelo IBGE pode trazer ao debate sobre Ação Afirmativa no Brasil?

Moema De Poli Teixeira, Doutora em Antropologia pelo Museu Nacional (UFRJ), Assessora do Departamento Acadêmico da Fundação Cesgranrio, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

O artigo com o título “Democratizando o acesso ao ensino superior: classificação brasileira de cor/raça no debate sobre a ação afirmativa” (TEIXEIRA, 2018) publicado na Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação (v. 26, n. 100) tem como objetivo refletir sobre a contribuição que a experiência do IBGE em levantamentos sobre a cor ou raça da população brasileira pode oferecer ao desenho de políticas de ação afirmativa no país. Partindo do princípio de que as estatísticas públicas são fundamentais para a construção das melhores evidências para a formulação de políticas públicas, o artigo apresenta e discute as classificações de cor ou raça utilizadas pelo IBGE nos Censos Brasileiros desde 1872, incluindo os resultados de pesquisas que testaram a designação como resposta aberta em 1976, 1998 e 2008.

Desde os anos 40, diversos cientistas sociais têm se debruçado sobre esses dados na análise das relações raciais na sociedade brasileira (AZEVEDO, 1955; FERNANDES, 1978; PINTO, 1952). Estudando as classificações utilizadas pelo IBGE entre 1872 e 1960, Costa (1974) revela que houve diversidade de critérios assim como de categorias ao longo do tempo, o que torna a principal questão dos levantamentos, saber como as pessoas se identificam racialmente e em se classificando, que critérios utilizam.

Por outro lado, os estudos sobre identidade racial revelam uma multiplicidade de termos e categorias, que podem variar de acordo com a cultura local (SHERIFF, 2002; TEIXEIRA, 1986). Em princípio, esses estudos qualitativos informam que se pode distinguir ao menos cinco níveis de classificação: a visão de um indivíduo sobre si mesmo; a visão de um indivíduo sobre alguém próximo; a visão de um indivíduo sobre uma pessoa desconhecida (feita apenas através da aparência); a visão de como um indivíduo é percebido socialmente e a descrição de como um indivíduo quer ser percebido em determinado contexto (TEIXEIRA; BELTRÃO, 2008).

O presente trabalho conclui que o debate sobre o tema precisa partir do reconhecimento das duas dimensões que norteiam as classificações raciais no Brasil: uma estrutural e outra cultural. A primeira dimensão se refere ao reconhecimento da contribuição que os levantamentos oficiais deram no passado e continuam a oferecer para o desvelamento/caracterização dos níveis de desigualdade racial persistentes no país. A segunda dimensão reconhece que as identidades étnicas e raciais, que são a base real sobre a qual os dados são construídos, precisam ser vistas como fenômenos culturais suscetíveis de mudança, o que mostra a necessidade de contínua reflexão no sentido de tentar captar, através de pesquisas, o significado dessas transformações.

O debate sobre a ação afirmativa não pode desqualificar nenhuma dessas abordagens, a fim de que um maior conhecimento dos mecanismos que regem as relações raciais no Brasil possa contribuir para o enfrentamento das desigualdades que engendram.

Referências

AZEVEDO, T. As elites de cor: um estudo de ascensão social. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1955. (Brasiliana, v. 282).

COSTA, T. C. N. A. O princípio classificatório ‘cor’, sua complexidade e implicações para um estudo censitário. Revista Brasileira de Geografia, v. 36, n. 3, p. 91-106, jul./set. 1974. ISSN: 0034723x [viewed 13 August 2018]. Available from: https://rbg.ibge.gov.br/index.php/rbg

FERNANDES, F. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Ática, 1978.

PINTO, L. A. C. O negro no Rio de Janeiro: relações de raças numa sociedade em mudança. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1952.

SHERIFF, R. E. Como os senhores chamavam os escravos: discursos sobre cor, raça e racismo num morro carioca. In: MAGGIE, I.; REZENDE, C. B. (Org.). Raça como retórica: a construção da diferença. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 213-243.

TEIXEIRA M. P. A questão da cor nas relações e representações de um grupo de baixa renda. Estudos Afro-Asiáticos, v. 14, p. 85-97, 1987.  ISSN: 0101-546X [viewed 13 August 2018].

TEIXEIRA, M. P.; BELTRÃO, K. I. O eu e o outro: a alteridade próxima na declaração de cor no quesito aberto da PME 98. Rio de Janeiro: ENCE; IBGE, 2008. (Textos para discussão; n. 24).

Para ler o artigo, acesse

TEIXEIRA, M. D. P. Democratizing the access to college education: Brazilian race/color classification in affirmative action’s debate. Ensaio: aval.pol.públ.Educ. [online]. 2018, vol.26, n.100, pp.595-618. ISSN 0104-4036. [viewed 8 October 2018]. DOI: 10.1590/s0104-40362018002601768. Available from: http://ref.scielo.org/9v36kp

Link externo

Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação – ENSAIO: www.scielo.br/ensaio

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

Que contribuições a classificação de cor ou raça da população utilizada pelo IBGE pode trazer ao debate sobre Ação Afirmativa no Brasil? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2018 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2018/10/08/que-contribuicoes-a-classificacao-de-cor-ou-raca-da-populacao-utilizada-pelo-ibge-pode-trazer-ao-debate-sobre-acao-afirmativa-no-brasil/

 

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