Daniel Costa Gomes, mestrando em Relações Internacionais na Universidade de Brasileira e membro da equipe editorial da RBPI, Brasília, DF, Brasil
Há longo tempo, o fenômeno da integração regional tem acolhida na América do Sul. Já no imediato pós-Segunda Guerra Mundial, era defendido pelos teóricos da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), entre os quais figurou Celso Furtado. O argumento era de que a integração regional era necessária para a criação de economia de escala, importante para o lançamento e a consolidação da industrialização na região. Um ensaio nesse sentido foi esboçado em 1960, com a criação da Associação Latino-Americana de Livre-Comércio. Os exemplos mais robustos, no entanto, são a Comunidade Andina (CAN), de 1969, e o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), de 1991. Juntos, agrupam 9 dos 12 países da região. Segundo dados da CEPAL, o PIB dos dois blocos correspondeu a aproximadamente US$ 3,75 bilhões em 2013 – o que equivale a aproximadamente 89% do PIB de toda a América do Sul.
A integração regional, no entanto, também abrange outras áreas, como a segurança. É esse o tema analisado no artigo A integração regional como mecanismo para provisão de bens públicos: uma análise comparativa da agenda de segurança pública no Mercosul e na Comunidade Andina de Nações, publicado na mais recente edição da Revista Brasileira de Política Internacional. Taiane Las Casas, autora do artigo, concedeu entrevista a Daniel Costa Gomes, mestrando em Relações Internacionais na Universidade de Brasileira e membro da equipe editorial da RBPI.
1. Você aponta, no artigo, que foram questionadas a viabilidade e a possibilidade da integração regional na América Latina. Diante da já longa história de organizações como o Mercosul e a CAN, você acha que esse questionamento ainda é possível?
Considero que a integração regional não é um processo único e harmonioso, de forma que a ampla gama de agendas seja contemplada e desenvolvida com igual intensidade. Se a integração comercial tem avançado pouco, agendas como educação, meio ambiente e, no caso do Mercosul, segurança pública tem tido progressos mais substantivos. Assim, considero que a questão da viabilidade ou não dos processos de integração tem que ser considerada a partir da análise dessas agendas.
2. Segundo as referências teóricas apontadas no artigo, você informa que a cooperação em no fornecimento de bens públicos (como segurança) é mais fácil diante de um grupo pequeno de países. Você acha que isso também se aplica à União Europeia?
O número de atores é, de fato, relevante para a cooperação, o que poderia ser um elemento importante para a integração europeia. O longo processo de integração naquele continente demonstra como é difícil negociar com um número de atores tão elevado. Contudo, a União Europeia desenvolveu estruturas institucionais que viabilizam o processo de negociação e esse é um elemento essencial para reduzir as incertezas e os custos de transação, mas não impede que as negociações sejam difíceis e que algumas agendas evoluam mais que outras.
3. Como apontado no artigo, uma das principais vertentes da cooperação em segurança é a troca de informações. Um fator desistimulante a essa cooperação, no entanto, seria o receio de corrupção nas corporações policiais. É possível identificar esse receio na CAN ou no Mercosul?
É importante observar que grande parte das ações policiais desenvolvidas nas fronteiras dos países do Mercosul tem como objeto o tráfico de drogas. Os ganhos econômicos desse tipo de tráfico são enormes e a cooptação de agentes de segurança pelos traficantes são fartamente noticiadas pela impressa. Não identificamos registros de ocorrência desse tipo de delito, mas acho que especificamente nessas ações policiais isso não deve ocorrer, uma vez que delas participam delegados, promotores e até mesmo juízes, além de fiscais de aduana, de meio ambiente, dentre outras.
4. No artigo, você menciona que a CAN tem transferido a questão do combate ao narcotráfico para outras instituições, como a Organização dos Estados Americanos. No entanto, o fato de os países da CAN serem os produtores mundiais de coca não seria estímulo suficiente para a cooperação?
Os membros da CAN têm recebido recursos financeiros dessas organizações, como forma de incentiva-los a intensificar o combate ao narcotráfico. Isso enfraquece a cooperação entre eles, mas amplia as possibilidades de combate a esse crime. Eu diria que são meios diferentes para atingir o mesmo fim, a despeito do inevitável enfraquecimento do bloco regional.
Mini currículo do autor:
Taiane Las Casas, Professora do Departamento de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-Minas, é Doutora em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais (2003). Atualmente é professor adjunto III do Departamento de Relações Internacionais- Programa de Pos-Graduação Relações internacionais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. E-mail: lascasas@pucminas.br
Para ler o artigo, acesse:
LAS CASAS, T. A integração regional como mecanismo para provisão de bens públicos: uma análise comparativa da agenda de segurança pública no Mercosul e na Comunidade Andina de Nações.Rev. bras. polít. int. [online]. 2015, vol.58, n.1, pp. 23-41. [viewed 23th November 2015]. ISSN 1983-3121. DOI: 10.1590/0034-7329201500102. Available from: http://ref.scielo.org/ftqg5c
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