Diego de Oliveira Souza, professor do curso de bacharelado em Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas, Campus Arapiraca, Arapiraca, AL, Brasil
O ensaio que apresentamos consiste numa proposta de discutir a saúde sob um ponto de vista ontológico. Não obstante, a ontologia é por nós considerada a partir do prisma analítico marxiano/lukacsiano, portanto, como abordagem preocupada, prioritariamente, com a essência dos objetos, considerando-os processos histórico-dialéticos.
Assim, o ensaio intitulado “A saúde na perspectiva da ‘Ontologia do ser social’”, publicado na revista Trabalho, Educação e Saúde, volume 14, número 2 de 2016, lida com um complexo leque de categorias teóricas propostas por Karl Marx e, posteriormente, desenvolvidas por György Lukács para, sobretudo, compreender a saúde em sua essência, enquanto portadora de uma dimensão universal, mas que se particulariza de diferentes formas.
Para tanto, primeiro problematizamos a saúde como processo social, apesar de sua faceta biológica. Esta discussão é desenvolvida na primeira seção do ensaio, dialogando com autores da vertente crítica da Saúde Coletiva, com origens na Medicina Social Latino Americana. Com base nisso, mas trazendo a contribuição inovadora de Lukács ao debate, demonstramos que os fundamentos da compreensão da dimensão social da saúde estão universalmente postos na constituição preliminar do ser social, a partir do trabalho.
Quando Lukács afirma que por meio do trabalho ocorre um salto ontológico, permitindo ao ser natural ascender ao patamar de ser social, ele está considerando que a natureza (biologia) é condição sine qua non da esfera social, embora esta seja uma dimensão ontologicamente mais complexa que aquela. O mesmo princípio determina o caráter de a saúde se consubstanciar socialmente, mas mantendo sua dimensão biológica, assim como sua articulação indissociável entre indivíduo (esfera na qual a faceta biológica é mais evidente) e coletividade (eminentemente social). Destarte, estamos diante de um processo dialético, no qual saúde e doença não se excluem, mas, na verdade, se determinam reciprocamente, sendo dois momentos da mesma processualidade.
Na segunda seção, apresentamos uma premissa fundamental para nossa discussão, inclusive no que tange à distinção da ontologia do ser social em relação às demais (a exemplo das ontologias a-históricas da Antiguidade e da Idade Média). Trata-se de reconhecer o papel ativo dos sujeitos ante os processos objetivamente existentes. Obviamente, tal papel está condicionado aos diversos níveis de consciência que se possa ter a respeito da realidade. Independentemente, a partir do momento que os sujeitos instituem formas conscientes de intervenção sobre os processos sociais objetivos, constitui-se o entrelaçamento entre teleologia e causalidade, caracterizando o que chamamos de práxis.
Demonstramos que a práxis em geral corresponde ao conjunto das atividades humanas, ao passo que cada atividade específica se revela uma práxis particular. Cada uma delas só pode ser compreendida a partir dos elementos que se põem universalmente na práxis original: o trabalho. Tal qual este, as práticas de saúde revelam seu caráter essencialmente humano por se consubstanciarem da prévia ideação (teleologia) frente à causalidade própria daquilo que se toma para intervenção. Com efeito, amplia-se a possibilidade de entender o caráter dual das práticas de saúde na contemporaneidade, em face do capitalismo. Em sua universalidade, elas permanecem sendo um conjunto de atividades que visam resolver problemas de saúde, sendo que assumindo uma forma particular, subsumida ao processo de valorização (subsumida ao capital).
Procuramos contribuir para o desvelamento da condição de a saúde ser particularidade do ser social, tendo sua essência constituída a partir das (e nas) relações sociais de produção e, por conseguinte, expressando-se de diferentes formas na temporalidade histórica. Levando-se em conta que, nas sociedades cindidas em classes sociais, a luta de classes é o principal elemento movente da história, a saúde (mediante, principalmente, as demandas postas pela sua dimensão social/coletiva) configura-se em problemática a ser enfrentada, sobremaneira, pelas lutas sociais. Isso assume especial relevo na sociedade capitalista, considerando o elevado patamar que o antagonismo de classes atingiu.
Por fim, constatamos que tanto a “Ontologia do ser social” ilumina os estudos da saúde (desde os mais pontuais aos mais abrangentes) quanto a análise da saúde possibilita desmistificar novas particularidades do ser social. Convidamos o leitor a acompanhar a reflexão que desenvolvemos, a fim de enriquecer o debate sobre os limites e as possibilidades de enfrentamento dos atuais problemas de saúde, seja em nível individual, seja em nível coletivo.
Para ler o artigo, acesse
SOUZA, D. de O. A saúde na perspectiva da ‘ontologia do ser social’. Trab. educ. saúde [online]. 2016, vol.14, n.2, pp.337-354. [viewedth 16 June 2016]. ISSN 1678-1007. DOI: 10.1590/1981-7746-sol00009. Available from: http://ref.scielo.org/8d7q6x
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Trabalho, Educação e Saúde – TES: www.scielo.br/tes
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