Quais são as principais tendências na privatização da educação em países africanos?

Rui da Silva, Investigador, Centro de Estudos Africanos, Universidade do Porto, Porto, Portugal.

Joana Oliveira, Professora, Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico, Viana do Castelo, Portugal.

Imagem: Rui da Silva, 2009. Acervo pessoal.

O artigo “Privatização da educação em 24 países africanos: tendências, pontos comuns e atípicos”, publicado no periódico Educação & Sociedade (vol. 41), trata de analisar e refletir sobre as principais tendências no âmbito da privatização da educação, verificadas em 24 países africanos considerados frágeis e afetados por conflito. Com apoio da Parceria Global para a Educação (PGE) esses países contam com o auxílio financeiro desse fundo, comparando suas diferenças e seus pontos comuns. A PGE é uma parceria multi-stakeholders, criada em 2002 pelo Banco Mundial com o nome Fast Track Initiative, da Educação para Todos. Atualmente, a PGE reúne 70 países do Sul Global e mais de 20 doadores. É considerada a única parceria multilateral e o único fundo dedicado para que todas as crianças e todos os jovens do Sul Global tenham acesso à escola de modo a receberem educação de qualidade; bem como o apoio global e nacional no setor da educação, com foco nas crianças e nos jovens mais pobres e vulneráveis. Cabe ressaltar, que mais de 60% do seu financiamento são para os países frágeis ou afetados por conflito.  O apoio da PGE implica o cumprimento de vários requisitos, entre eles a elaboração de um plano setorial da educação.

O estudo pretende fornecer um melhor entendimento das relações internacionais de poder no âmbito da privatização da educação. O texto parte de um amplo conceitual teórico para abordar a Parceria Global para a Educação que é, na atualidade, um ator relevante no cenário das políticas educacionais globais e que influencia diretamente políticas educativas nacionais, sendo ainda pouco conhecida e estudada no Brasil. O trabalho partiu da leitura dos Planos Setoriais da Educação ou dos documentos transitórios submetidos à Parceria Global para a Educação quando da solicitação de apoio financeiro ao fundo pelos governos dos seguintes 24 países africanos – Burundi; Camarões; Chade; Comores; Costa do Marfim; Eritreia; Gâmbia; Guiné-Bissau; Libéria; Mali; Moçambique; Níger; Nigéria; Quênia; República Centro-Africana; República Democrática do Congo; República do Congo; Ruanda; Somália; Sudão; Sudão do Sul; Togo; Uganda e Zimbábue.

A análise realizada permite inferir que predomina, nos diferentes países, a perspectiva da privatização da educação planejada em detrimento da de fato, e constata que, quando os documentos mencionam a gestão privada, referem-se, principalmente, à comunidade/aos pais. Adaptado de Silva, Santos e Pacheco (2015) e Silva (2018), as cinco principais categorias que se referem a privatização da educação são: 1. Valorização da iniciativa privada; 2. Uso do setor privado encorajado; 3. Direito de escolha; 4. Evocação da educação como serviço público de gestão privada e 5. Diminuição da interferência do Estado. Pode-se dizer, que a privatização de fato é um processo aparentemente não relacionado com as políticas públicas, que ocorre por iniciativa dos pais, das comunidades e da sociedade civil, independentemente das políticas promovidas pelos Estados. Por outro lado, a privatização por planejamento ocorre quando as autoridades públicas promovem, de maneira proativa, a privatização da educação e implementam medidas explícitas para a promover, como, por exemplo, parcerias público-privadas e vouchers.

Os Planos Setoriais da Educação de Costa do Marfim, República Centro-Africana, República do Congo, Somália e Quênia são atípicos, uma vez que têm previstas medidas que não seguem as tendências verificadas na literatura no que concerne à privatização da educação (p. ex., redução do setor privado). Nestes documentos estratégicos a conexão global – nacional fica muito explícita possibilitando o aumento do conhecimento sobre tais relações na África a partir de uma perspectiva crítica permitindo associar outras vozes no questionamento da real eficácia destas parcerias e suas ideologias no atendimento da educação como direito humano. O texto é panorâmico, de maneira a deixar caminho aberto para novas pesquisas que aprofundem cada um dos aspectos tratados.

Assista a seguir o vídeo de Rui da Silva apresentando outras perspectivas deste estudo.

Referências

SILVA, R.; SANTOS, J. G. and PACHECO, J. A. Crossed looks: globalisations and curriculum in Guinea-Bissau. Compare: A Journal of Comparative and International Education, [online], 2015, vol. 45, no. 6, pp. 978-999, e-ISSN: 1469-3623 [viewed 28 September 2020]. https://doi.org/10.1080/03057925.2015.1013018. Available from: https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/03057925.2015.1013018? journalCode=ccom20

SILVA, R. O papel da parceria global para a educação na promoção dos referentes da globalização nos planos setoriais da educação

dos PALOP. Revista on-line de Política e Gestão Educacional [online]. 2018, vol. 22, no. esp. 3, pp. 1258-1275, ISSN: 1519-9029 [viewed 28 September 2020]. https://doi.org/10.22633/rpge.v22iesp3.12010. Available from: https://periodicos.fclar.unesp.br/rpge/article/view/12010/7912

Para ler o artigo, acesse

SILVA, R. da and OLIVEIRA, J. Privatização da educação em 24 países africanos: tendências, pontos comuns e atípicos. Educ. Soc. [online]. 2020, vol. 41, e238622. ISSN: 1678-4626 [viewed 19 October 2020]. https://doi.org/10.1590/es.238622. Available from: http://ref.scielo.org/r478th

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SILVA, R. and OLIVEIRA, J. Quais são as principais tendências na privatização da educação em países africanos? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2020 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2020/11/12/quais-sao-as-principais-tendencias-na-privatizacao-da-educacao-em-paises-africanos/

 

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