A relação entre cognição e desempenho em matemática

Roberto Ternes Arrial, Editor executivo da RBEPED, Brasília, DF, Brasil.

Imagem: Jeuwre.

Qual a importância da cognição de estudantes no seu desempenho em matemática? Essa discussão recebe um aporte a partir do artigo “Os três componentes executivos básicos e o desempenho matemático escolar”, publicado na Revista Brasileira da Estudos Pedagógicos (no. 259), da lavra de pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco e da Universidade Federal de Campina Grande.  A pesquisa fundamenta-se no conceito da neuropsicologia de Funções Executivas (FE), definidas como funções cognitivas importantes na construção da personalidade e das habilidades criativas e que atuam na regulação de processos cognitivos, emocionais e comportamentais de um indivíduo (LEZAK, 1982). Integram as FE três componentes correlacionados e relativamente independentes: A Memória de Trabalho (MT), compreendida como o sistema que retém na mente informações enquanto são executadas tarefas complexas; o Controle Inibitório (CI), que permite moderar o comportamento e o pensamento de forma a agir de forma apropriada; e, finalmente, a Flexibilidade Cognitiva (FC), que emerge a partir da associação da MT e do CI e à qual atribui-se a modificação consciente de perspectivas ou abordagens para solucionar um problema.

Já é bem estabelecida na literatura a importância das FE na aprendizagem escolar e seu poder de predição do desempenho em matemática (SANTANA; MELO; MINERVINO, 2019). A contribuição específica desse estudo foi determinar a interinfluência dos três componentes da FE e o impacto de cada um deles no desempenho na resolução de determinadas atividades matemáticas. A partir desse objetivo, foram selecionados 110 estudantes do 2º ao 7º ano do ensino fundamental, igualmente distribuídos entre 8 e 12 anos de idade, sendo 50,9% do sexo feminino e 49,1% do sexo masculino. A triagem e caracterização dos estudantes foi feita a partir de consulta aos registros escolares, aplicação de um questionário sociodemográfico e de um teste de comprometimentos cognitivos. Os participantes foram submetidos a testes para sondagem de habilidades matemáticas e para avaliação dos três componentes executivos da FE (MT, CI e FC). Os dados obtidos a partir desses testes foram usados para caracterizar a relação dos componentes MT, CI e FC com o desempenho em matemática por meio de análises de correlação e regressões lineares múltiplas.

Os resultados mostraram que, dentre os componentes, o MT foi o que apresentou a correlação mais forte com o desempenho em matemática. Essa relevância da MT é condizente com sua definição de memória ultrarrápida que possibilita ao indivíduo estabelecer relações e conexões para que possa avaliar planos e adaptar decisões que facilitam os cálculos aritméticos. No caso da FC, houve correlações moderadas com o desempenho de todas áreas de matemática analisadas. Tal resultado é consonante com a importância desse componente, uma vez que impacta as habilidades de observação e comparação de estratégias, reduzindo a perseveração em erros e, por consequência, o tempo para resolução das atividades matemáticas.

O componente CI apresentou, dentre os componentes analisados, as correlações de menor magnitude, embora significativas, em todas áreas de desempenho em matemática analisadas. O impacto do CI nas atividades matemáticas é atribuído ao seu papel de manutenção do foco na tarefa, ao suprimir a interferência de estímulos externos (cheiros, ruídos etc.) e internos (informações irrelevantes oriundas da MT, respostas comportamentais inadequadas entre outras). Com relação ao valor preditivo dos componentes sobre o desempenho em matemática, o trabalho mostrou que a MT predomina sobre os demais, seguido de FC e CI. Outro achado da análise é a identificação de FC como uma função mediadora entre CI e o desempenho em matemática. O estudo, além de contribuir com a compreensão da importância da tríade executiva da FE para o desempenho escolar, também inspira o planejamento de intervenções pedagógicas orientadas pelo diagnóstico cognitivo.

Referências

LEZAK, M. D. Neuropsychological assessment. 2nd ed. New York: Oxford University Press, 1982.

SANTANA, A. N. et al. Relações entre funções executivas e dificuldades de aprendizagem em crianças: uma meta-análise acerca dos critérios metodológicos. In: MELO, M.R.A.; MOREIRA, J.D.S. and SANTANA, A.N. (org.), Psicologia baseada em evidências: integrando a ciência com a prática profissional. Curitiba: CRV, 2019. pp. 17-42.

Para ler os artigos, acesse

SANTANA, A. N. et al. Os três componentes executivos básicos e o desempenho matemático escolar. Rev. Bras. Estud. Pedagog. [online]. 2020, vol. 101, no. 259, pp. 649-669. ISSN: 2176-6681 [viewed 11 February 2021]. https://doi.org/10.24109/2176-6681.rbep.101i259.4137. Available from: http://ref.scielo.org/qmr2tk

Link Externo

Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos – RBEPED: www.scielo.br/rbeped

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

ARRIAL, R. T. A relação entre cognição e desempenho em matemática [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2021 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2021/03/04/a-relacao-entre-cognicao-e-desempenho-em-matematica/

 

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