Gênero na ciência, a equidade dentre autorias em periódicos

Sílvia de Souza Leão, jornalista

Jimena Felipe Beltrão, jornalista e editora do Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas

Vinheta da semana especial do Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi Ciências Humanas

A equidade de gênero tem se consolidado como uma pauta fundamental nas políticas editoriais de periódicos científicos, sobretudo nas Ciências Humanas. Pesquisa desenvolvida no âmbito do Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas (BGOELDI) analisou a presença de autorias femininas entre 2016 e 2023, comparando seus dados com os 13 periódicos da América Latina indexados no SciELO. De caráter quali-quantitativo, a pesquisa “Gênero na ciência: incentivo à equidade na publicação em periódicos. Uma experiência recente no Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas investigou o incentivo explícito à diversidade de gênero nas publicações científicas e como isso se manifesta na prática editorial.

Com os recentes ajustes à sua política editorial, o BGOELDI se posiciona na vanguarda ao incluir ações concretas para ampliar a diversidade de suas autorias, como convites a jovens pesquisadoras e representantes de grupos étnicos diversos. Outro avanço significativo é a possibilidade de identificação de gênero nas submissões, via plataforma ScholarOne. O estudo também recomendou a continuidade do monitoramento da representatividade de gênero, étnica e geográfica, além da análise dos temas tratados por diferentes perfis autorais, como forma de construir uma ciência mais plural e justa.

Os povos indígenas são diversos e contam suas histórias através de suas línguas, memória, rituais, cantos, danças, objetos e grafismos. Cada povo possui suas especificidades. Com o avanço das políticas de ações afirmativas, estamos entrando nas universidades e contando essas histórias em novos formatos, dentre eles a escrita. Jovens registram as culturas ensinadas pelos mais velhos. Historicamente, a relação dos povos indígenas com a escrita surgiu como forma de violência e silenciamento. Mas, hoje, utilizamos a escrita como forma de luta pelos direitos dos povos indígenas. É relevante a diversidade na autoria indígena, porque somos pesquisadores, para que as nossas histórias sejam contadas e registradas por nós, que vivenciamos o território cotidianamente. Mulheres indígenas estão se tornando escritoras, se empoderando por meio disso. É relevante fortalecer os espaços de comunicação científica de autoria indígena.

É assim que Ana Manoela Karipuna, socióloga e antropóloga, expressa sua visão da ocupação de espaços num contexto científico que já foi muito mais elitista.

Em publicação no BGOELDI em 2022, a jovem autora tratou do tema das autorias indígenas no artigo A autoria coletiva e a autoetnografia: experiências em antropologia com as parentas Karipuna do Amapá (vol. 17, no. 2).

 

Ana Manuela Karipuna

Ana Manuela Karipuna, socióloga, antropóloga e jovem autora convidada a publicar no BGOELDI.

 

Para a editora associada do Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi- Ciências Humanas, a antropóloga Claudia López “a importância da diversidade étnica e de gênero nas nossas pesquisas e publicações”. Em entrevista exclusiva para a Semana Especial do periódico no blog SciELO Perspectiva Humanas, López, coordena o grupo de pesquisa do CNPq “Diversidade e Interculturalidade na Amazônia” disse que “É fundamental tornar visível a relevância dos conhecimentos indígenas e de populações tradicionais na produção científica contemporânea, ressaltando também o papel das mulheres como autoras, criadoras de conhecimentos e de transformações sociais.”

De acordo com a editora associada do periódico, “as novas políticas editorias do Boletim Ciências Humanas, [abrem] espaço para receber contribuições de autores e autoras indígenas e de populações tradicionais. Assim, o Boletim acolhe a voz e o pensamento da diversidade étnica e de gênero”.

 

Claudia López

Imagem: Serviço de Comunicação Social do Museu Paraense Emílio Goeldi

Claudia López, antropóloga e editora associada do BMEPG. Ciências Humanas

 

Confira vídeo que Claudia López gravou para a Semana Especial:

 

 

Os resultados demonstram que, embora o BGOELDI tenha mantido certo equilíbrio na quantidade de autoras (379) e autores (387) no período analisado, houve oscilações anuais, com queda na participação feminina em 2018 e 2019. Ainda assim, o periódico destacou-se por ser o único, dentre os analisados, a possuir uma política editorial explícita de incentivo à equidade de gênero e diversidade étnica, alinhando-se às diretrizes da Ciência Aberta e aos Princípios DEIA (Diversidade, Equidade, Inclusão e Acessibilidade).

Autores e autorias indígenas

 

Ano Autoras Autores Autoria indígena
vol. 11, no. 1/3, 2016 55 37  
vol. 12, no. 1/3, 2017 46 48 1 autor
vol. 13, no. 1/3, 2018 32 52  
vol. 14, no. 1/3, 2019 40 54  
vol. 15, no. 1/3, 2020 50 48 2 autores
vol. 16, no. 1/3, 2021 49 40  
vol. 17, no. 1/3, 2022 60 55 1 autora
vol. 18, no. 1/3, 2023 47 53 4 autores
Total 379 387 7

Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

 

Além da análise numérica, o estudo abordou a liderança feminina nas publicações, revelando que, em quatro dos cinco anos, houve presença significativa de mulheres como primeiras autoras. Em 2018, no entanto, nenhuma edição inicial registrou liderança feminina, o que reforça a importância de políticas afirmativas e a vigilância constante sobre as práticas de inclusão nas publicações científicas, como forma de mitigar desigualdades estruturais históricas.

A análise também evidencia que, entre os periódicos latino-americanos consultados, apenas o BGOELDI mencionava de forma explícita, em sua política editorial, o compromisso com a equidade de gênero. Os demais mantinham silêncio institucional sobre o tema. Essa lacuna nas políticas editoriais de revistas das áreas de Antropologia, Linguística e Sociologia evidencia a urgência de uma abordagem mais estruturada para garantir representatividade nos processos de publicação.

O artigo ancora-se em diversos marcos internacionais, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), especialmente o ODS 5, que propõe “alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas”. Também menciona as diretrizes SAGER (Sex and Gender Equity in Research), que recomendam a inclusão das variáveis sexo e gênero nas publicações científicas. Organizações como a American Psychological Association (APA), Committee on Publication Ethics (COPE) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) têm promovido instrumentos para apoiar editores na implementação de práticas inclusivas nos periódicos.

Para ler os artigos, acesse

PRIMO DOS SANTOS SOARES, A.M.P.S. A autoria coletiva e a autoetnografia: experiências em antropologia com as parentas Karipuna do Amapá. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas [online]. 2022, vol. 17, no. 2, e20210026 [viewed 10 September 2025]. https://doi.org/10.1590/2178-2547-BGOELDI-2021-0026. Available from: https://www.scielo.br/j/bgoeldi/a/zcVRNRsDs59Wr5n9gRHsGzN

SILVA, T.C., BELTRÃO, J.F. and VIANA, M.N.O. Gênero na ciência: incentivo à equidade na publicação em periódicos. Uma experiência recente no Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas. Ciência da Informação [online]. Ahead of print.

Links externos

Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas – SciELO

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Como citar este post [ISO 690/2010]:

LEÃO, S.S. and BELTRÃO, J.F. Gênero na ciência, a equidade dentre autorias em periódicos [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2025 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2025/09/10/genero-na-ciencia-a-equidade-dentre-autorias-em-periodicos/

 

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