Cristiane Miglioranza, Jornalista e Assistente Editorial do periódico Horizontes Antropológicos, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.
O artigo de apresentação do número 62 de Horizontes Antropológicos (História das Antropologias do Mundo, vol. 28, 2022), Caminhos para uma história inclusiva das antropologias do mundo, aborda o movimento das antropologias do mundo e seus efeitos sobre o campo. No texto, os autores e organizadores da edição, Patrícia Ferraz de Matos (Universidade de Lisboa), Frederico Delgado Rosa (Universidade Nova de Lisboa) e Eduardo Dullo (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), dialogam com o projeto iniciado por Gustavo Lins Ribeiro e Arturo Escobar em 2006.
Os autores relembram que “o coletivo que originou o projeto das antropologias do mundo pretendeu que este fosse multilinguístico, produzisse investigação com fundos alternativos, enfatizasse agendas de pesquisa e autorias coletivas com sensibilidade para as particularidades locais e contra tendências normalizadoras – centrais ou periféricas –, considerando que a academia é apenas um dos lugares onde a produção de conhecimento é possível” (MATOS; ROSA; DULLO, 2022, p. 9). A partir disso, ressaltam os três tipos de cosmopolitismos antropológicos identificados por Ribeiro (2014): o “imperial”, que simplesmente reproduz a hegemonia anglo-saxônica; o “liberal”, que naturaliza o lugar proeminente do Ocidente, representando um avanço em relação ao primeiro; e o “radical”, exemplificado pelo projeto das antropologias do mundo, que problematiza a centralidade anglo-americana, critica o eurocentrismo e pretende pluralizar a antropologia e a sua história.
Figura 1. “Quitter le Continent” (2021), óleo sobre tela do artista franco-polonês Adam Adach.
Matos, Rosa e Dullo entendem que é necessário relativizar a ideia de que apenas hoje é possível o diálogo entre antropólogos do “Norte” e do “Sul”, em pé de igualdade, enquanto profissionais da mesma ciência. “As histórias da antropologia são mais caleidoscópicas – isto é, com múltiplas variáveis em movimento – do que previsíveis, seja no plano político, seja no plano humano das inter-relações do foro antropológico e etnográfico”, sugerem na página 24. Assim, situam sua proposta no campo subdisciplinar da história da antropologia e convidam à reflexão com base na interdisciplinaridade entre a antropologia e a história, a história da ciência e a antropologia histórica. A viabilização de sua proposta se dá a partir da releitura de arquivos etnográficos e antropológicos de diferentes locais, tempos e dimensões. “Embora atentos à crítica pós-colonial das tentativas de levantamento e análise da variabilidade humana, estamos mais interessados em situar essas contribuições na complexidade dos respectivos contextos para resgatar o seu lugar nas dinâmicas históricas da antropologia”, pontuam (MATOS; ROSA; DULLO, 2022, p. 28). Com isso em conta, propõem uma contribuição ao debate por meio de estudos de caso interligados, a partir dos quais evidenciam a percepção da complexidade, diversidade e antiguidade das antropologias do mundo. “Há que reavaliar o passado da antropologia em sentido lato, compreendendo saberes e práticas, etnográficos e não só, que antecedem ou complementam a institucionalização científica, caracterizados inclusive por experimentalismo e ‘amadorismo’ em contextos diversificados e interconectados” (MATOS; ROSA; DULLO, 2022, p. 23).
Este número de Horizontes Antropológicos apresenta dez estudos de caso que focalizam tradições antropológicas periféricas, exteriores ou descentradas relativamente às ditas “grandes tradições”. “Trata-se de uma reflexão comparativa em torno dos antecedentes históricos, pelo menos nos séculos XIX e XX, do paradigma das world anthropologies e da disseminação da práxis antropológica. Procurou-se explorar as relações entre atores, produções e instituições locais e internacionais e suscitar novas questões sobre os significados e a vastidão do arquivo num sentido plural e global. Ainda que o lugar para o pluralismo pareça utópico no espaço internacional (L’Estoile, 2008), é necessário investir em iniciativas que apostem em promover não standards, mas esforços de tradução que possam suscitar mais diálogos”, convidam (MATOS; ROSA; DULLO, 2022, p. 29).
Leia mais
L’ESTOILE, B. Hegemonic gravity and pluralistic utopia: a comparative approach to internationalization in anthropology. Journal of the World Anthropologies Network. 2008, no. 3, pp. 109-126.
RIBEIRO, G.L. World anthropologies: anthropological cosmopolitanisms and cosmopolitics. Annual Review of Anthropology [online]. 2014, no. 43, pp. 483-498 [viewed 3 May 2022]. https://doi.org/10.1146/annurev-anthro-102313-030139. Available from: https://www.annualreviews.org/doi/abs/10.1146/annurev-anthro-102313-030139
RIBEIRO, G.L. and ESCOBAR, A. (ed.). World anthropologies: disciplinary transformations within systems of power. Oxford: Berg, 2006.
Para ler o artigo, acesse
MATOS, P.F., ROSA, F.D. and DULLO, E. Caminhos para uma história inclusiva das antropologias do mundo. Horizontes Antropológicos [online]. 2022, vol. 28, no. 62, pp. 7-45 [viewed 3 May 2022]. https://doi.org/10.1590/S0104-71832022000100001. Available from: https://www.scielo.br/j/ha/a/TDLFJfdFjNB8S5VpRJfsGkn/
Link(s)
Eduardo Dullo: http://lattes.cnpq.br/4789004961395272
Frederico Delgado Rosa: https://www.fcsh.unl.pt/faculdade/docentes/rfdc/
Patrícia Ferraz de Matos: https://www.ics.ulisboa.pt/pessoa/patricia-ferraz-de-matos
Adam Adach: http://adamadach.com/biography/
Horizontes Antropológicos – História das Antropologias do Mundo: https://www.scielo.br/j/ha/i/2022.v28n62/
Horizontes Antropológicos: https://www.ufrgs.br/ppgashorizontesantropologicos/
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Horizontes Antropológicos – HA: https://www.scielo.br/j/ha/
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