Sim, algoritmos educam!

Rainri Back, Professor do departamento de Teoria e Fundamentos da Faculdade de Educação, Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil.

Logo Educação & Sociedade Revista de Ciência da EducaçãoNo ensaio Quem a sociedade de controle pretende formar?, publicado no periódico Educação & Sociedade (vol. 43), procuro defender a tese segundo a qual a sociedade forma seus indivíduos. A premissa mais básica é relativamente simples. Cada sociedade tem suas características específicas e a formação dos seus indivíduos acaba refletindo tais características. Então, qual é a característica básica da sociedade considerada ocidental? Para responder esta pergunta, parte-se de uma ideia bastante interessante do filósofo francês Gilles Deleuze. Segundo ele, cada sociedade se define por suas máquinas. Sendo assim, quais seriam as máquinas da sociedade ocidental? Os computadores, certo? Portanto, a sociedade está formando seus indivíduos conforme as características dos computadores com os quais eles interagem diariamente.

Bem aí, está a importância estratégica dos algoritmos. Resumidamente, eles são instruções escritas em linguagem computacional. São feitos para responder aos dados que nós registramos na Internet quando usamos smartphones ou computadores. Ao responder aos nossos dados, os algoritmos induzem a nos comportar de certa maneira. Por exemplo, eu pesquiso o preço de uma mercadoria em um portal, mas não a compro. Depois, volto ao portal para procurar a mercadoria. Misteriosamente, nesse lapso de tempo, ela está mais cara. Assim, sou induzido a comprá-la, porque receio novo aumento de preço. É uma técnica de venda on-line baseada em algoritmos. Ela se chama “apreçamento dinâmico” ou, em inglês, dynamic pricing.

Imagem: Pixabay

Há inúmeros outros exemplos de indução de comportamento baseada no emprego de algoritmos. Um deles está relacionado ao nosso comportamento político. Cito as eleições nos Estados Unidos em 2016. Segundo o jornal britânico The Guardian, a empresa Cambridge Analytica traçou o perfil psicológico de milhões de usuários do Facebook. Assim, ela pôde lhes direcionar mensagens específicas e temporárias a fim de induzir seu voto. Mas poderia citar também as eleições no Brasil em 2018. É o que mostra uma reportagem publicada no jornal estadunidense The New York Times. Segundo ela, o portal YouTube induziu o voto de milhões de brasileiros com recomendações massivas de vídeos sobre temas de extrema direita.

Enfim, induzir certo comportamento é uma maneira de formar, de educar alguém, certo? A educação de filhos, estudantes etc., em boa medida, se baseia na indução de comportamentos. Estimula-se certos comportamentos e reprime-se outros, a fim de que elas se tornem pessoas com certo perfil. Sim, é possível induzir, por meio de algoritmos, nosso comportamento toda vez que utilizamos smartphones ou computadores. Mas qual perfil os algoritmos esperam formar em nós? Minhas conclusões não são muito otimistas. Eles esperam respostas impulsivas, sem reflexão; esperam pulverizar nossos afetos para vender diversas mercadorias; sobretudo, eles esperam nos separar em espaços privados cujo acesso depende de senha individual. Em uma palavra, eles esperam nos despolitizar.

No vídeo a seguir, Rainri Back discute as motivações para escrita do artigo e o convida para essa instigante leitura.

Leia mais

AVELINO, R., DA SILVEIRA, S. A. and SOUZA, J. (org.). A sociedade de controle: manipulação e modulação nas redes digitais. São Paulo: Hedra, 2018.

BRUNO, F. et. al. (org.). Tecnopolíticas da vigilância: perspectivas da margem. São Paulo: Boitempo, 2018.

DELEUZE, G. Conversações. 3. ed. São Paulo: Editora 34, 2017.

FISHER, M. and TAUB, A. How YouTube radicalized Brazil. New York Times, 11 ago. 2019 [viewed 2 May 2022]. Available from: https://www.nytimes.com/2019/08/11/world/americas/youtube-brazil.html

LAZZARATO, M. Signos, máquinas e subjetividades. Edição Bilíngue. São Paulo: Edições SESC; N-1 Edições, 2014.

O’NEIL, C. Weapons of math destruction: how big data increases inequality and threatens democracy. New York: Broadway Books, 2017.

WELLS, G., HORWITZ, J. and SEETHARAMAN, D. The Wall Street Journal. Facebook knows Instagram is toxic for teen girls, company documents show. 14 set. 2021 [viewed 2 May 2022]. Available from: https://www.wsj.com/articles/facebook-knows-instagram-is-toxic-for-teen-girls-company-documents-show-11631620739

WONG, J.C. The Cambridge Analytica scandal changed the world – but it didn’t change Facebook. The Guardian, 17 mar. 2019 [viewed 2 May 2022]. Available from: https://www.theguardian.com/technology/2019/mar/17/the-cambridge-analytica-scandal-changed-the-world-but-it-didnt-change-facebook

Para ler o artigo, acesse

BACK, R. Quem a sociedade de controle pretende formar? Educação & Sociedade [online]. 2022, vol. 43, e243734 [viewed 2 May 2022]. https://doi.org/10.1590/ES.243734. Available from: https://www.scielo.br/j/es/a/YKBgjGPMKMygRHbPWrGt33b

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BACK, R. Sim, algoritmos educam! [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2022 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2022/05/02/sim-algoritmos-educam/

 

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