Décio Vieira da Rocha, Professor Adjunto, Fundação Getúlio Vargas – Escola de Direito, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Nos anos 2000, o ensino superior brasileiro teve um salto quantitativo na expansão de vagas e, consequentemente, no acesso às universidades. Os cursos de Direito foram particularmente impactados por essa expansão, apresentando um salto de quase três vezes mais cursos oferecidos. Diante disso, outra mudança quantitativa se seguiu: uma massiva introdução de mulheres nesses cursos, fazendo com que uma área dominada por homens até a década de 1990 se deparasse com uma completa mudança de cenário.
Entretanto, essa mudança se refletiu no mercado de trabalho jurídico? Essa é a pergunta que guia o trabalho Desigualdades de gênero em ocupações jurídicas, publicado no vol. 53 (2023) do periódico Cadernos de Pesquisa. Através de dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), avaliamos as mudanças nas carreiras de advogados privados, procuradores e advogados públicos, membros do Ministério Público, magistrados e serventuários de justiça.
Na advocacia privada, as mulheres vêm sendo maioria desde 2010 e aumentando essa diferença substancialmente ao longo dos anos. Entre serventuários de justiça elas sempre estiveram em maior número, e isso ainda se mantém. Já entre procuradores públicos, magistrados, membros do Ministério Público (MP) e delegados de polícia não houve mudança.
Curiosamente, embora as mulheres sejam maioria em alguns setores, quando avaliamos a remuneração recebida entre elas e os companheiros na mesma profissão, a situação não é boa; homens têm salários maiores em todas as áreas, exceto entre procuradores e advogados públicos.
Diferenças salariais deveriam existir apenas pelo mérito. O que vemos, no entanto, é que gênero, idade e região do país são marcadores importantes para explicar desigualdades salariais. O aumento do número de mulheres não trouxe um avanço qualitativo no ambiente de trabalho que possibilite a elas obter rendimentos idênticos a seus companheiros na mesma situação, mesmo no setor público, onde deveria haver isonomia.
Os dados apontam para a necessidade de políticas públicas que possibilitem às mulheres condições para atingir salários e cargos em condições de igualdade com companheiros na mesma função. Mudanças quantitativas não têm surtido efeito, por isso, é necessário que medidas institucionais ocorram tanto nos escritórios de advocacia quanto nas instituições públicas. Sem acesso igualitário à justiça não há democracia plena e sem diversidade nos órgãos jurídicos o acesso à justiça também perde legitimidade qualitativa.
Links externos
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Cadernos de Pesquisa – Página Institucional: https://publicacoes.fcc.org.br/cp/index
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