Fernanda Cantarim, Pós-doutoranda do Programa de Pós-graduação em Gestão Urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR, Brasil
A criminalidade é uma questão urbana amplamente discutida na academia, diversos estudos abordam esse tema sob diferentes enfoques. Mariana Soares e Renato Saboya, ambos da Universidade Federal de Santa Catarina, propõem uma leitura global do vasto conteúdo, de forma a chegar em padrões que só poderiam ser interpretados com a soma dessas pesquisas. Os resultados são apresentados no artigo “Fatores espaciais da ocorrência criminal: modelo estruturador para a análise de evidências empíricas”, publicado no periódico urbe (v. 11). O modelo apresentado pelos autores detalha aspectos físicos e fatores intermediadores que impactam em cada fase da ocorrência criminal. Esse material faz uma contribuição que pode ser uma eficiente ferramenta para repensar não apenas os usos e ocupação do solo urbano, mas também a forma de projetar edifícios arquitetônicos.
Saboya e Soares utilizaram de revisão de literatura, de forma a buscar fatores que influenciam o crime em diferentes etapas da sua ocorrência (seleção do alvo, aceso ao alvo, execução do crime e fuga). O recorte temático das pesquisas selecionadas pelos autores se baseia em ocorrências criminosas de diversas naturezas (furtos, roubos, invasão a residências, homicídios) que sejam interpretadas em relação ao espaço urbano.
Soares e Saboya explicam que algumas condições básicas facilitam que o crime ocorra: “[…] três fatores determinantes precisam se encontrar no espaço e no tempo: um agressor motivado, um alvo adequado e a falta de guardião capaz[…]” (p. 3). A organização do espaço é em grande parte o que viabiliza os dois últimos desses fatores. Os autores levantam alguns aspectos físicos chaves que influenciam na ocorrência criminal: a visibilidade e vigilância natural; a vulnerabilidade aparente; a vigilância mecanizada e recursos de segurança; e a presença de pessoas. Cada um desses aspectos se relaciona com diferentes características do tecido urbano e seu planejamento (como densidade populacional, uso e ocupação do solo e iluminação pública). Além disso, opções projetuais dos edifícios (como janelas, portas, barreiras e permeabilidade visual) também são importantes variáveis que impactam na ocorrência criminal.
Há na literatura e academia pontos de vistas divergentes sobre o impacto do uso misto e alta densidade populacional na incidência de crimes. Para alguns pesquisadores, a diversidade de usos do solo atrai um maior número de pessoas, aumentando a vigilância civil e a sensação de segurança (JACOBS, 1961 ; MORAES; JELVEZ, 2007). Por outro lado, alguns acadêmicos defendem que esse uso misto também atrai um maior número de infratores, contribuindo para aumento nas taxas de criminalidade (TAYLOR; HARRELL, 1996; YANG, 2006).
Confrontar os aspectos do espaço urbano que contribuem para que crimes se tornem frequentes é necessário. Planejadores e arquitetos são responsáveis por tomar decisões projetuais que tem um impacto inegável na ocorrência criminal. Nesse sentido, o artigo de Mariana Soares e Renato Saboya é uma importante contribuição para repensar como mudanças espaciais podem construir cidades mais seguras.
Referências
JACOBS, J. The death and life of great American cities. New York: Vintage Books, 1961.
MORAES, V. N. and JELVEZ, J. A. Q. O espaço urbano como dimensão ativa na incidência do crime. 2007. Available from: http://urbanismo.arq.br/metropolis/wp-content/uploads/2009/05/espaco-urbano-e-a-distribuicao-do-crime-netto-e-jelvez-2007.pdf
TAYLOR, R. and HARRELL, A. Physical environment and crime. Washington: National Institute of Justice, US Department of Justice, 1996.
YANG, X. Exploring the influence of environmental features on residential burglary using spatial-temporal pattern analysis (PhD thesis). Florida, University of Florida, 2006.
Para ler o artigo, acesse
SOARES, M. and SABOYA, R. T. de. Fatores espaciais da ocorrência criminal: modelo estruturador para a análise de evidências empíricas. urbe, Rev. Bras. Gest. Urbana, v. 11, e20170236, 2019. ISSN: 2175-3369 [viewed 19 august 2019]. DOI: 10.1590/2175-3369.011.001.ao10. Available from: http://ref.scielo.org/k5p4yh
Link externo
urbe. Revista Brasileira de Gestão Urbana – URBE: www.scielo.br/urbe
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