Wilma Peres Costa, Editora Chefe, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil.
André Roberto de Arruda Machado, Vice Editor-chefe, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil.
A partir de 2016, o periódico Almanack passa a integrar a coleção SciELO. Publicado desde 2011, já estão disponíveis na coleção os três números lançados em 2015 e, em breve, as edições anteriores.
O Almanack tem uma peculiaridade entre os periódicos de ciências humanas brasileiros: trata-se de periódico temático destinado a estudar um “tempo”. Os séculos XVIII e XIX são esse tempo e o foco em temas da América Portuguesa e, posteriormente, do Brasil, não impedem que os acontecimentos vividos estejam atravessados pelas grandes metamorfoses por que passaram as ideias e as práticas referidas ao estado e à nação em escala planetária.
O periódico adere assim a uma perspectiva historiográfica que enfatiza as múltiplas dimensões da construção do estado e da nação como um vasto espaço de experiência, onde as pessoas, os artefatos, as mercadorias, as ideias, os discursos e as práticas políticas circularam entre o velho e o novo mundo e nas várias partes do continente americano e entre este e o continente africano.
As edições do ano de 2015, as primeiras a integrar a plataforma SciELO, demarcam uma série de viragens importantes na configuração e conteúdo da Almanack. A mais notória é a periodicidade, que passa a ser quadrimestral. A segunda, igualmente importante, está na inovação dos “artigos apresentados no formato de um debate coletivo”— aqueles que procuram dar a “cara” de cada número. Essa tarefa foi até 2015 atribuída aos fóruns, seção do periódico formado por um artigo encomendado a um pesquisador de renome que vem acompanhado por outros dois textos de pesquisadores que comentam e criticam o primeiro. A partir desse ano, os fóruns passam a ser intercalados com dossiês temáticos, sob o encargo de especialistas convidados. Essas inovações não são apenas formais, pois o alargamento do espaço oferecido aos autores permite que se evidenciem algumas dimensões que estiveram, desde o princípio, inseridas no projeto do periódico e que agora encontram maior visibilidade.
O fórum do Almanack número 9 é um bom indicativo do que estamos procurando enfatizar. Ele foi realizado em um encontro internacional que marcou a criação da Sociedade Brasileira para o Estudo do Oitocentos. Essa Sociedade Científica nasceu da necessidade de construir um arcabouço institucional para a pesquisa sobre o “longo século XIX” nas várias regiões do Brasil e favorecer sua interlocução internacional. Essa iniciativa deu frutos imediatos na parceria estabelecida com a Revue d’histoire du XIXe siècle, que é, por sua vez, o órgão da Société d’histoire de la révolution de 1848 et des révolutions du XIXe siècle. O número 9 trouxe como convidado o Prof. Emmanuel Fureix e, com ele, uma temática de extremo interesse: o conteúdo político das manifestações de grupos aparentemente excluídos das práticas políticas institucionalizadas, como são os ritos fúnebres, os banquetes cívicos, os charivaris.
Em outra chave, o dossiê do número 10, também expressa a consolidação de experiências de circulação internacional dos pesquisadores, desta feita em escala americana. O primeiro dossiê do Almanack se debruça sobre as percepções do tempo e suas transformações do final do século XVIII às primeiras décadas do século XIX, reunindo um instigante conjunto de trabalhos que explora o ferramental da “história dos conceitos” e sua pertinência no espaço/tempo ibero-americano.
Fechando as edições de 2015, o Fórum do n. 11 foca o tema recorrente em nosso periódico da “cidadania armada”, vale dizer, o do papel das formações milicianas nos processos políticos americanos. Cabe ressaltar que o assunto ganha relevância não apenas no que se refere à construção da ordem estatal, como sobretudo, no seu papel potencialmente disruptivo dessa ordem, pelo recrutamento (voluntário ou não) de setores excluídos da sociedade, como os pardos livres, os libertos, e os indígenas.
Nos três números de 2015, certos temas têm emergido reiteradamente no Almanack, em razão de sua pertinência e atualidade no campo da pesquisa histórica. Refiro-me, por exemplo, à engenharia do poder na construção do Estado, sobretudo no que se refere às relações entre as elites políticas regionais e o poder central. Vale lembrar também que a temática das estruturas propriamente estatais e sua sinergia material e simbólica tem sido visitada pelos pesquisadores, como pode ser visto nos vários artigos sobre igreja e política e sobre justiça militar e a governança do império, no Reino e na América. Na chave das lutas sociais e das formas populares de luta e resistência, o periódico tem abrigado artigos sobre a sintonia fina entre “estrutura e agência” na crise do escravismo, sobre as formas de ação das comunidades indígenas, dentro e fora dos processos de organização estatal. Como não poderia deixar de ser, as percepções do tempo, as escritas da história e as operações da memória, estão presentes em todos os números, apontando para aspectos fundantes do debate historiográfico brasileiro e latino-americano.
Para ler os artigos, acesse
SILVA, L. G. Free and freed Afro-descendants and political equality in Portuguese America.Change of status, slavery and Atlantic perspective (1750-1840). Almanack [online]. 2015, n.11, pp.571-632. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151101. Available from: http://ref.scielo.org/w3yjv2
PAZ, G. Popular War: Gauchos and the Challenge to Elite Power in Northern Rio de la Plata in the Revolutionary Period. Almanack [online]. 2015, n.11, pp.633-646. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151103. Available from: http://ref.scielo.org/89m4mb
SA, M. E. N. Popular insurrections, conflicts and compromises between free and freed men in Portuguese America and Rio de la Plata. Commentary of texts by Gustavo Paz and Luiz Geraldo Silva. Almanack [online]. 2015, n.11, pp.647-668. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151104. Available from: http://ref.scielo.org/vh7j2d
SALVATTO, F. G. and CARZOLIO, M. I. Naturaleza and citizenship in Modern Spain. From subject representation to the dawn of contemporary citizenship (17th-19th centuries). Almanack[online]. 2015, n.11, pp.670-687. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151106. Available from: http://ref.scielo.org/cntn8g
SANTOS, E. A. E. Luiz Gama and the racial satire as the transgression poetry: diasporic poetry as counter-narrative to the idea of race. Almanack [online]. 2015, n.11, pp.707-727. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151108. Available from: http://ref.scielo.org/6sn4dw
SANTOS, M. A. Lutas políticas, abolicionismo e a desagregação da ordem escravista: Bananal, 1878-1888. Almanack [online]. 2015, n.11, pp.749-773. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151110. Available from: http://ref.scielo.org/tc92hd
LIEBEL, V. Ângelo Agostini and the Cartoons at the Imperial Twilight – Preliminary Notes on the Abolition in Brazil. Almanack [online]. 2015, n.11, pp.774-792. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151111. Available from: http://ref.scielo.org/gp528k
BELMONTE POSTIGO, J. L. “No obedecen a nadie, sino cada uno gobierna a su familia”. Etnicidad y política en la reducción del maniel de Bahoruco, 1785-1795. Almanack [online]. 2015, n.11, pp.813-840. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151113. Available from: http://ref.scielo.org/k3ck52
RICUPERO, B. O que há de novo na nova história política de François-Xavier Guerra?. Almanack [online]. 2015, n.11, pp.841-852. [viewed 06th May 2016]. ISSN 2236-4633. DOI: 10.1590/2236-463320151114. Available from: http://ref.scielo.org/b6t6hc
Link externo
Almanack – www.scielo.br/alm
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