Marlene de Souza Dozol, Professora do Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC, Brasil
O artigo intitulado “A propósito de uma estética formativa mediante um conceito-paisagem”, publicado em Educação & Realidade (v. 42, n. 4), examina o conceito ou ideia de formação humana considerado nuclear para a filosofia da educação e, que, admite uma multiplicidade de aproximações e de moldes narrativos. Dada a sua amplitude, variadas possibilidades de manejo e formas diversas de expressão, propõe, de um certo modo, um jogo, não só com as referências já existentes, mas também com aquilo que poderá resultar de uma aventura de pensamento.
A palavra “aventura” associada ao pensamento tem aqui um papel relevante para sinalizar o que o leitor encontrará neste trabalho: um exercício de investigar o tema da formação humana que se confunde com a própria ação de “escrevê-lo”, ao mesmo tempo em que se recusa a respeitar as fronteiras comumente estabelecidas entre a filosofia e outros gêneros de linguagem.
Para tanto, este ensaio empreende um esforço quase lúdico de aliar, à dimensão inteligível da ideia em exame, as recorrências da sensibilidade, filhas — dentre outras filiações — da literatura e dos “afazeres” do olhar.
E é exatamente sob essa perspectiva estética que podemos marcar — para fins de ilustração — um ponto de encontro com a escrita do pensador suíço Jean-Jacques Rousseau, de feitio filosófico-literária e paisagística ao tratar, por exemplo, da formação/educação de crianças.
A intenção é, digamos assim, a de convidar o leitor para uma experiência ao mesmo tempo intelectual e visual de um dos conceitos centrais para pensar essa educação, qual seja, o de “educação negativa”, com o qual nos deparamos em vários momentos de sua prosa, já poética, na opinião de alguns especialistas do campo literário. Daí a expressão — cunhada pela autora desse ensaio — de “conceito-paisagem” na intenção de melhor aludi-lo e fazer-se compreender, pois, em Rousseau, a educação negativa tanto pode aparecer numa carta sobre a educação de crianças ou, noutra, em forma de um jardim inglês (ambas trocadas pelos personagens que fazem parte do romance epistolar Júlia ou a Nova Heloísa (1994), lírico e filosófico a um só tempo), quanto na escrita de seu tratado de educação Emílio (1999) e na defesa apaixonada dessa obra frente à condenação que lhe foi imputada no próprio século em que viveu (Carta a Christophe de Beaumont).
Busca-se, assim, por meio de diversos recursos linguísticos, a riqueza expressiva de um conceito só passível de interpretação e expressão mediante uma estética formativa que tem na natureza — e é esse evidentemente o caso de Rousseau — toda uma tópica que identifica seus escritos de feitio literário e pictórico em sintonia com suas preocupações políticas, ético-morais e pedagógicas. A tópica da natureza atua como energia de artepensamento na fabricação desse conceito-paisagem que sugere a olhos que “pensam” o seu próprio sentido, extraído das formas naturais e, simultaneamente, o seu avesso, ou seja, uma sugestiva ambiguidade dos efeitos da educação negativa, podendo conter no seu interior os riscos de uma pedagogia excessivamente diretiva e que atua em segredo…
Mas apostemos no lado “direito” dessa paisagem teórica, que imagina para ver melhor.
Referências
ROUSSEAU, J-J. Júlia ou A nova Heloísa. São Paulo: Hucitec; Campinas: Editora da Unicamp, 1994.
ROUSSEAU, J-J. Emílio ou Da Educação. São Paulo: M. Fontes, 1999.
Para ler os artigos, acesse
DOZOL, M. S. A Propósito de uma Estética Formativa Mediante um Conceito-Paisagem. Educ. Real. [online]. 2017, vol.42, n.4, pp.1503-1520. [viewed 16 November 2017]. ISSN 0100-3143. DOI: 10.1590/2175-623662696. Available from: http://ref.scielo.org/gp92dz.
Link externo
Educação & Realidade – EDREAL: www.scielo.br/edreal
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