Há artimanhas discursivas para controlar docentes em Instituições de Ensino Superior?

Bárbara Novaes Medeiros, Doutoranda em Administração no Programa de Pós-Graduação em Administração – PPGA/UnB – Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brasil

Marcus Vinicius S. Siqueira, Professor associado do Programa de Pós-Graduação em Administração – PPGA/UnB – Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brasil

O artigo de Medeiros e Siqueira, intitulado “Discurso gerencial no controle de docentes em instituições de Ensino Superior privadas: uma análise crítica”, publicado no periódico Cadernos EBAPE.BR (v. 17, n. 2), analisa o discurso gerencial no controle de docentes em instituições de Ensino Superior (IES) privadas. Trata-se de um estudo com 12 gerentes de três IES privadas realizado em uma cidade de Minas Gerais. Na produção do discurso gerencial, há verbalizações que indicam a influência da ideologia gerencialista nas estratégias de gestão, como por exemplo:

[…] no momento de contratação, eu falo com cada professor que eu contratei, e foram todos, eu falo “olha, neste momento quem está te contratando sou EU, a partir de agora quem se demite é VOCÊ” (Entrevistado 07).

[…] ele não é visto como fiscalizado, né? na verdade, eu tento agir como, “olha, cê é parceiro do curso, eu preciso de você, se você não cumpriu os outros todos vão fazer a mesma coisa, e, aí, eu vou falar o quê? Aí, todo mundo vai ser penalizado” (Entrevistada 05).

Na promoção do discurso, há mecanismos nas formações discursivas dos gerentes, a fim de influenciar o comportamento individual e coletivo dos docentes na IES, como por exemplo:

[…] ele PASSA a ser, ele PASSA a ser dá empresa, entendeu? Então, ele NÃO ESTÁ na empresa, ele É a empresa, não é? E é o que talvez, né? Faz ele viver tanto tempo aqui dentro (Entrevistado 01).

[…] tá aqui o recurso, tá aqui toda condição pra você fazer isso. Então, o cara faz diferente, né? (Entrevistado 07).

[…] se o professor publicar 2 artigos que seja numa revista B5, ele tem 2 mil (Entrevistado 04).

Em relação à subjetivação do trabalho que executam e das condições nas quais trabalham, gerentes revelaram o efeito social desse papel assumido:

[…] a questão de você gerenciar uma empresa deste tamanho, né? Te toma um tempo louco, porque se você tem que ficar atento, muitas vezes você tá, parece que tá sem fazer nada, mas cê tá ligado o tempo inteiro em pequenos detalhes, porque quando chega já num grau de organização que nós temos hoje, você fica regulando pequenos detalhes o tempo todo, porque a instituição já está pronta (Entrevistado 01).

[…] é IMPOSSIVEL você ter sucesso profissional e pessoal, sucesso. Você ser BEM profissionalmente e ser BEM no âmbito pessoal, você consegue. Agora, sucesso cê só consegue em um ou em outro, não tem jeito. Inclusive, deu esse problema na minha família, eu me considero um workaholic e amo o que eu faço e, na verdade, infelizmente, eu não consegui éhhh continuar com minha família, hoje eu tenho meus filhos, separei tem [x] dias (Entrevistado 07).

A interpretação desses resultados desmistifica, a partir de uma perspectiva crítica, o discurso gerencial em IES privadas, análises tão pouco exploradas na academia nacional. Os pesquisadores identificaram que o discurso gerencial é perpassado por características do poder gerencialista no domínio ideológico, cultural, político, econômico e psicológico no controle dos docentes em IES privadas. Há influência de proprietários/conselho/direção executiva na produção discursiva a fim de mediar vantagens, alimentar o imaginário de sucesso e prazer do docente no ambiente de trabalho. Nesse processo, gerentes subjetivam e simbolizam o papel gerencial e as IES de modo positivo, entretanto, no desenvolvimento das entrevistas, revelam que trabalham em contexto permeado pelas contradições do mundo do trabalho, rememorando o lado negro das organizações. Disseminar esse olhar crítico, que muitas vezes procura-se ocultar, é o foco do artigo a partir de um protocolo de Análise Crítica do Discurso – inspirado nas asserções teórico-metodológicas de Fairclough (2016), que também constitui em referência para a realização de pesquisas futuras.

Referência

FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Brasília, DF: Editora da UnB, 2016.

Para ler o artigo, acesse

MEDEIROS, B. N. and SIQUEIRA, M. V. S. Discurso gerencial no controle de docentes em instituições de Ensino Superior privadas: uma análise crítica. Cad. EBAPE.BR, v. 17, n. 2, p. 294-304, 2019. ISSN: 1679-3951 [viewed 6 June 2019]. DOI: 10.1590/1679-395173014. Available from: http://ref.scielo.org/pxxdyh

Link externo

Cadernos EBAPE.BR – CEBAPE: www.scielo.br/cebape

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

MEDEIROS, B. N. and SIQUEIRA, M. V. S. Há artimanhas discursivas para controlar docentes em Instituições de Ensino Superior? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2019 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2019/07/17/ha-artimanhas-discursivas-para-controlar-docentes-em-instituicoes-de-ensino-superior/

 

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