O impacto da Lei de Cotas na universidade “pública, gratuita e de qualidade”

Louise Moraes, Pesquisadora em Informações e Avaliações Educacionais, Brasília, DF, Brasil.

Você já fez alguma vez o chamado teste do pescoço*? Andando pelas ruas, meta o pescoço dentro da vitrine das joalherias e conte quantos negros são clientes e quantos são balconistas. Olhe por dentro de um restaurante chique e veja quantos negros são garçons e quantos são fregueses. Veja fotos de uma passeata composta por médicos reivindicando melhores condições de trabalho: há algum negro? São muitos? E as prisões, orfanatos, casas de correção para menores: são integradas por quem? Brancos ou negros? O teste do pescoço nos dá uma dimensão do país em que vivemos em termos desigualdade social e, sobretudo, racial. Situação que é/foi por muito tempo reproduzida na universidade pública, onde, até pouco mais de uma década, o ingresso era de acordo com o vestibular, sem a política das cotas.

Esse é o tema por trás do estudo “A Lei de Cotas e o acesso à Universidade Federal de Alfenas por estudantes pertencentes a grupos sub-representados”, um dos artigos da edição 260 da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP). Os autores analisaram o impacto da Lei nº 12.711, de 2012, conhecida como Lei de Cotas, na Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG), com base na análise de dados de estudantes ingressantes em 2018. Esse alcance foi medido pela taxa de ocupação das vagas destinadas a estudantes público-alvo da lei e por simulações quanto a um possível cenário de como as vagas seriam ocupadas na ausência dela.

As simulações demonstraram que, não fosse pela Lei de Cotas, estudantes egressos da rede pública autodeclarados pretos e pardos teriam sido os mais prejudicados no acesso à Unifal-MG. Em cursos com maior concorrência candidato/vaga, “estudantes de todas as categorias de cotas teriam sido praticamente excluídos da instituição”, nas palavras dos autores do artigo. Isso aconteceria de forma mais acentuada para aqueles autodeclarados pretos e pardos com renda familiar per capita igual ou inferior a 1,5 salário mínimo.

Imagem: Markus Spiske.

“O estudo reforça a importância da manutenção da Lei de Cotas e aponta para a necessidade de que se desenvolvam ações institucionais para ampliar a abrangência do processo seletivo da instituição para um maior contingente de estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas”, concluem os autores.

A Lei de Cotas estabelece o mínimo de 50% das vagas em instituições públicas de ensino superior para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio na rede pública, por curso. Destes, metade ainda é reservada para alunos provenientes de famílias com renda per capita igual ou menor que 1,5 salário mínimo. Ainda entre os candidatos cotistas, em cada faixa de renda, são separadas vagas para autodeclarados pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência.

Referências

*teste do pescoço resumido do Portal Geledés Instituto da Mulher Negra, organização da sociedade civil em defesa de mulheres e negros. O teste completo pode ser acessado no link https://www.geledes.org.br/existe-racismo-brasil-faca-o-teste-pescoco-e-descubra/. Acesso em 25/05/2021

Para ler o artigo, acesse

LOPES, R. A., SILVA, G. H. G. and FERREIRA, E. B. A Lei de Cotas e o acesso à Universidade Federal de Alfenas por estudantes pertencentes a grupos sub-representados. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos [online]. 2021, vol. 102, no. 260, pp. 148-176 [viewed 29 June 2021]. https://doi.org/10.24109/2176-6681.rbep.102.i260.3961. Available from: http://ref.scielo.org/tz77j4

Links externos

Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos – RBEPED: https://www.scielo.br/rbeped

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

MORAES, L. O impacto da Lei de Cotas na universidade “pública, gratuita e de qualidade” [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2021 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2021/06/29/o-impacto-da-lei-de-cotas-na-universidade-publica-gratuita-e-de-qualidade/

 

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