Adriano Firmino V. de Araújo, Doutor em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco, Professor Associado do Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil.
José Luis da Silva Netto Junior, Doutor em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Professor Associado do Departamento de Economia e do Programa de Pós-graduação em Economia da Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil.
Liédje Bettizaide Oliveira de Siqueira, Doutora em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco, Professora Associada do Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil.
A família tem um importante papel no processo de investimento em capital humano. Ao mesmo tempo, sabe-se que as decisões que envolvem investimento em habilidades têm papel decisivo no processo de crescimento e desenvolvimento econômico das nações (LUCAS, 1988). Nesse contexto, a decisão de investimento em capital humano dos filhos é, em grande parte, determinada por escolhas feitas pelos pais e condicionada a fatores associados à estrutura familiar, localização espacial das famílias e conjuntura socioeconômica (BIRCHENALL, 2001). É importante ressaltar que o conceito de capital humano se refere a um conjunto de atributos pessoais, tais como educação, experiência, habilidades, boa saúde, entre outros fatores que repercutem no processo produtivo.
Constata-se, por exemplo, que a dinâmica educacional em áreas mais desenvolvidas economicamente é mais intensa do que em regiões periféricas (BIRCHENALL, 2001; FIGUEIREDO; NETTO JR.; PORTO JR., 2007; NETTO JR.; RAMALHO; ARAGON, 2013). Esta observação sugere a existência de dois efeitos no tocante às decisões de investimento em capital humano: um efeito local, associado ao background familiar; e um efeito externo, relacionado aos fatores presentes no local onde a família reside e a conjuntura econômica (GALOR; TSIDDON, 1997; GALOR; ZEIRA, 1993). Portanto, a interação entre os determinantes familiares (efeito local) e fatores associados à infraestrutura física e dinâmica econômica (efeito externo) determinam as decisões de acumulação de capital humano.
Segundo Barro e Becker (1989), as decisões de natureza familiar sobre investimento na acumulação de capital humano dos filhos também têm um papel relevante na trajetória educacional dos filhos. Os estudos de Ermisch e Francesconi (2001) e Nicoletti e Ermisch (2008), ambos realizados para a Grã-Bretanha, identificaram que a escolaridade e a dotação de riqueza dos pais e a estrutura familiar são variáveis importantes no entendimento da dinâmica intergeracional de educação. Portanto, é fundamental analisar de que forma tais decisões podem ser afetadas considerando características da estrutura familiar que vão além do nível educacional e de renda dos pais.
Dessa forma, o estudo Estrutura familiar e dinâmica educacional entre gerações (Rebep, v.39, 2022) de autoria Adriano Firmino V de. Araújo, José Luis Silva Netto Junior e Liédje Bettizaide Oliveira de Siqueira, professores do Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba, buscou identificar o impacto da estrutura familiar (biparentais e uniparentais) sobre a dinâmica educacional intergeracional e a acumulação de capital humano. A pesquisa usou os microdados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio (PNAD) de 2014. A dinâmica educacional intergeracional foi analisada a partir de matrizes de transição e de processos de Markov.
Um dos objetivos apresentados nesse estudo diz respeito aos fatores associados à mobilidade intergeracional de educação. A análise das matrizes de transição por meio de processos de Markov trouxe evidências de que os lares uniparentais com mãe registraram uma maior mobilidade intergeracional de educação e uma menor persistência no nível educacional mais baixo. Lares biparentais possuem a maior persistência para o nível mais alto de educação (mais de 15 anos de estudo).
Os resultados encontrados indicam que características como famílias uniparentais, famílias que possuem mãe, ser mulher, ser preto, residir na zona urbana e ser filho independente são fatores que contribuem para uma maior mobilidade intergeracional de educação. As regiões Nordeste e Sudeste tiveram uma menor mobilidade em relação às demais regiões.
O segundo objetivo desse estudo foi verificar como a estrutura familiar afeta a acumulação de capital humano dos filhos. Obteve-se a partir da decomposição de Blinder-Oaxaca que os filhos de famílias biparentais conseguem acumular mais capital humano em relação aos filhos de famílias uniparentais. A diferença é da ordem de 0,40 ano de estudo, sendo cerca de 87% dessa diferença explicada pelo modelo estimado.
Considerando apenas as famílias uniparentais, verificou-se que os filhos com mãe acumulam mais capital humano do que as famílias com pai. A diferença foi da ordem de 0,5 ano de estudo, sendo cerca de 74% dessa diferença explica pelo modelo. Em ambos os modelos, a parte não explicada não obteve significância estatística.
Apesar da limitação da pesquisa, por não se tratar de um estudo longitudinal das famílias e por não ter um conjunto completo de informações destas, as quais podem ter ganhado novas configurações com o passar dos anos, observa-se, pelos achados na pesquisa, que a relação de estrutura familiar desempenha um importante papel sobre as escolhas educacionais de cada geração, o que produz dinâmicas geracionais na distribuição dos rendimentos. Estes resultados são importantes, uma vez que se pode separar os fatores circunstanciais responsáveis pela distribuição de renda – cujas mudanças são lentas e refletem um estágio da sociedade – daqueles fatores que podem ser alterados por meio de intervenções de políticas públicas, como investimento em boas escolas, assistência em saúde, segurança e tantos outros que equalizam as oportunidades.
Para ler o artigo, acesse
ARAÚJO, A.F.V., NETTO JUNIOR, J.L.S. and SIQUEIRA, L.B.O. Estrutura familiar e dinâmica educacional entre gerações. Revista Brasileira de Estudos de População [online]. 2022, vol. 39, e0192 [viewed 10 May 2022]. https://doi.org/10.20947/S0102-3098a0192. Available from: https://www.scielo.br/j/rbepop/a/HkjRschP9FCMzpHSVgMJHzQ/
Leia mais
BARRO, R. and BECKER, G. Fertility choice in a model of economic growth. Econometrica. 1989, vol. 57, no. 2, pp. 481-501 [viewed 10 May 2022]. https://doi.org/10.2307/1912563. Available from: https://www.jstor.org/stable/1912563
BIRCHENALL, J.A. Income distribution, human capital and economic growth in Colombia. Journal of Development Economics [online]. 2001, vol. 66, no. 1, pp. 271-287 [viewed 10 May 2022]. https://doi.org/10.1016/s0304-3878(01)00162-6. Available from: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0304387801001626
ERMISCH, J. and FRANCESCONI, M. Family matters: impacts of family background on educational attainments. Economica [online]. 2001, vol. 68, no. 270, pp. 137-156 [viewed 10 May 2022]. https://doi.org/10.1111/1468-0335.00239. Available from: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/1468-0335.00239
FIGUEIREDO, E., NETTO JR., J.L.S. and PORTO JR., S. Distribuição, mobilidade e polarização de renda no Brasil: 1987 a 2003. Revista Brasileira de Economia [online]. 2007, vol. 61, no. 1, pp. 7-32 [viewed 10 May 2022]. https://doi.org/10.1590/s0034-71402007000100002. Available from: https://www.scielo.br/j/rbe/a/PC9h4zqZdDQyNxxDKnLdhTD/
GALOR, O. and TSIDDON, D. Technological progress, mobility, and economic growth. American Economic Review. 1997, vol. 87, no. 4, pp. 363-382 [viewed 10 May 2022]. Available from: https://www.jstor.org/stable/2951350
GALOR, O. and ZEIRA, J. Income distribution and macroeconomics. Review of Economic Studies. 1993, vol. 60, no. 1, pp. 35 [viewed 10 May 200]. https://doi.org/10.2307/2297811. Available from: https://www.jstor.org/stable/2297811
LUCAS, R. E. On the mechanics of economic development. Journal of Monetary Economics [online]. 1988, vol. 22, no. 1, pp. 3-42 [viewed 10 May 2022]. https://doi.org/10.1016/0304-3932(88)90168-7. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/0304393288901687
NETTO JR., J.L.S., RAMALHO, H.M.D.B. and ARAGON, E.K.D.S.B. Transmissão Intergeracional de educação e mobilidade de renda no Brasil. Economia e Desenvolvimento [online]. 2013, vol. 12, no. 2, pp. 6-34 [viewed 10 May 2022]. Available from: https://periodicos.ufpb.br/index.php/economia/article/view/18840
NICOLETTI, C. and ERMISCH, J.F. Intergenerational earnings mobility: changes across cohorts in Britain. The B.E. Journal of Economic Analysis & Policy. 2008, vol. 7, no. 2 [viewed 10 May 2022]. https://doi.org/10.2202/1935-1682.1755. Available from: https://www.degruyter.com/document/doi/10.2202/1935-1682.1755/html
RAMALHO, H.M.B. and NETTO JR., J.L.S. Dinâmica intergeracional de educação e corresidência entre pais e filhos adultos no Brasil. Análise Econômica [online]. 2018, vol. 36, no. 69, pp. 231-266 [viewed 10 May 2022]. https://doi.org/10.22456/2176-5456.52942. Available from: https://seer.ufrgs.br/index.php/AnaliseEconomica/article/view/52942
Link(s)
Perfis nas redes sociais da Rebep: Facebook | Twitter | Instagram
Adriano Firmino V. de Araújo – ORCID: https://orcid.org/0000- 0002-5094-2894
José Luis da Silva Netto Junior – ORCID: https://orcid.org/0000- 0003-0830-209X
Liédje Bettizaide Oliveira de Siqueira – ORCID: https://orcid. org/0000-0002-3673-823X
Revista Brasileira de Estudos de População – RBEPOP: https://www.scielo.br/j/rbepop/
Como citar este post [ISO 690/2010]:
Últimos comentários