Relações entre classe social, raça, gênero e o bullying nas escolas

Cíntia Santana e Silva, doutoranda em sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Belo Horizonte, MG, Brasil. 

Elaine Meire Vilela, professora associada do Departamento de Sociologia da UFMG. Belo Horizonte, MG, Brasil. 

Valéria Cristina de Oliveira, professora adjunta do Departamento de Ciências Aplicadas à Educação da UFMG. Belo Horizonte, MG, Brasil. 

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O artigo Bullying nas escolas públicas e privadas: os efeitos de gênero, raça e nível socioeconômico busca, a partir dos dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) 2015, compreender como os marcadores sociais de classe, raça e gênero se relacionam com o bullying nas escolas brasileiras. Dessa forma, averigua a reprodução das hierarquias de poder estabelecidas na sociedade. Ou seja, alunos integrantes dos grupos sociais privilegiados na hierarquia social (homens, brancos e de nível socioeconômico mais elevado) tendem a praticar mais bullying e estudantes de grupos sociais desfavorecidos (mulheres, negros e de nível socioeconômico mais baixo) tendem a sofrer mais bullying?

Essa abordagem traz um olhar inovador, uma vez que a maioria das pesquisas sobre bullying investiga o desequilíbrio de poder entre agressores e vítimas a partir de atributos individuais, tais como força física, popularidade, autoconfiança, inteligência e atratividade física (Nelson et al., 2019; Olweus, 2013), negligenciando, portanto, em que medida os marcadores sociais que refletem hierarquias de poder estabelecidas na sociedade como um todo se relacionam com o bullying.

As autoras analisam os dados a partir de modelos de regressão logística hierárquica, que permitem captar a variação entre as escolas. As análises são feitas separadamente para escolas públicas e privadas e os diferentes tipos de envolvimento dos alunos com o bullying, seja como vítima, agressor e vítima-agressor.

Jovem negra com tranças apoiando a cabeça nos braços sobre a parte de trás de uma cadeira na sala de aula, enquanto duas garotas, desfocadas ao fundo, parecem ridicularizá-la.

Imagem: Adobe Stock.

Os resultados apontam que o bullying não reflete as hierarquias de poder e status presentes na sociedade de forma generalizada. No que se refere ao gênero, verifica-se que discentes do sexo masculino têm maior propensão ao envolvimento com o bullying que as meninas, seja como vítima, agressor ou vítima-agressor. Os diferenciais são mais expressivos nas escolas privadas que nas públicas. Com relação à raça, ainda que estudantes indígenas tenham maiores chances de vitimização nas escolas privadas, nenhum grupo racial (considerando brancos, pretos, pardos, amarelos e indígenas) destaca-se como principais agressores. Observa-se que o envolvimento com o bullying permeia os grupos raciais em múltiplos sentidos.

Já no que se refere à questão econômica, verifica-se que o bullying retrata uma estrutura de dominação, já que, tanto na escola pública quanto na privada, discentes de maior nível socioeconômico estão mais propensos a praticarem enquanto os de menor nível estão mais propensos a sofrerem bullying

Buscamos interpretar este dado a partir da estrutura de dominação simbólica apontada por Bourdieu (2010). Uma vez que a dominação está corporificada no habitus de estudantes das classes sociais mais altas, é possível que eles se vejam naturalmente em posição de superioridade em relação aos demais e utilizem a prática de bullying como uma forma de expressão dessa superioridade. 

Se, por outro lado, aqueles de classes sociais inferiores sofrem mais bullying, uma possível inferência seria a de que o habitus “dominado” que carregam os coloca em posição de desvantagem nas lutas simbólicas do campo escolar e faz com que não consigam se defender e interromper os ciclos de dominação e violência.

Referências

BOURDIEU, P. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.

NELSON, H.J. et al. Preadolescent children’s perception of power imbalance in bullying: a thematic analysis. PLoS One [online]. 2019, vol. 14, no. 3 [viewed 23 April 2024]. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0211124. Available from: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0211124  

OLWEUS, D. School bullying: development and some important challenges. Annual Review of Clinical Psychology [online]. 2013, vol. 9, pp. 751-780 [viewed 23 April 2024]. https://doi.org/10.1146/annurev-clinpsy-050212-185516. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/23297789/  

Links externos

Educação e Pesquisa – EP: https://www.scielo.br/j/ep/

Educação e Pesquisa – Revista da Faculdade de Educação da USP: http://www.educacaoepesquisa.fe.usp.br/

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Como citar este post [ISO 690/2010]:

OLIVEIRA, V.C., SILVA, C.S.S. and VILELA, E.M. Relações entre classe social, raça, gênero e o bullying nas escolas [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2024 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2024/04/23/classe-social-raca-genero-e-bullying-nas-escolas/

 

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