O fardo da aprendizagem e da reinvenção profissional ao longo da vida

Karla Saraiva, Professora do Pós-Graduação em Educação, Universidade Luterana do Brasil (ULBRA), Canoas, Rio Grande do Sul, Brasil.

Logo do periódico Pro-Posições.

O conceito de aprendizagem ao longo da vida, uma tradução da expressão em língua inglesa longlife learning, surgiu ainda na última década do século XX e foi amplamente disseminado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) como um direito de todos e como uma forma de contribuição para o bem comum. Contudo, seu sentido foi cada vez mais redirecionado para o de estratégia para manutenção das condições de participar do mercado de trabalho, o que transformou o direito em um fardo que pesa sobre trabalhadoras e trabalhadores. 

No artigo A aprendizagem ao longo da vida e a infinita reinvenção profissional, publicado no periódico Pró-posições (vol. 35, 2024), analiso, juntamente ao colega Erinaldo Oliveira, as estratégias que reportagens publicadas no jornal Valor Econômico, entre 2018 e 2022, utilizam para convencer seus leitores a se engajarem em processos de uma aprendizagem infindável, bem como a percepção de quatro entrevistados sobre este tema.

Ilustração de dois homens de terno sentados em uma mesa, usando fones de ouvido enquanto tomam notas em cadernos. Eles olham fixamente para frente, com uma expressão séria.

Imagem: gerada pela IA do Bing a partir de instruções dos autores.

A quantidade expressiva de artigos encontrados sobre o tema nessa publicação, de ampla circulação entre profissionais de diversos campos, em especial, gestores de empresas, mostra a importância que o mercado vem atribuindo a esta busca infindável de novas aprendizagens. Esta importância também apareceu nas falas dos entrevistados, cujas concepções sobre a importância da aprendizagem foram bastante convergentes com as do jornal. Nossa pesquisa foi desenvolvida na perspectiva da análise do discurso foucaultiana. Foram mapeadas três estratégias discursivas, que apresentamos a seguir.

Ilustração de dois homens, um de terno e o outro em traje casual, envolvidos em uma queda de braço em cima de uma pilha de livros com um troféu da balança da justiça entre eles. Ambos seguram pastas com o braço que está livre.

Imagem: gerada pela IA do Bing a partir de instruções dos autores.

A primeira delas é a construção de um imperativo de uma busca desenfreada por atualizações. Os artigos argumentam que estamos em um momento de muitas mudanças e volatilidade, o que exige permanentes atualizações por meio de experiências de aprendizagem curtas e rápidas, focadas nas demandas imediatas do mercado, e que podem ser melhor providas por instituições não formais de ensino. Chama a atenção expressões como microlearning e nanodegrees, que sinalizam esta noção de que a aprendizagem deve ser uma sucessão de infinitos certificados, com pouca coesão, que têm por finalidade atender necessidades imediatas.

A segunda consiste em mostrar a necessidade de adaptações intermináveis. Ou seja, não basta que os trabalhadores aprofundem e atualizem os conhecimentos e competências em sua área de atuação. Eles devem estar prontos para redirecionar sua aprendizagem para que possam atuar em segmentos mais atrativos. O mercado não exige apenas atualizações, mas flexibilidade para abraçar as mudanças, impondo uma fragilidade e precariedade aos profissionais.

Ilustração de um homem branco e loiro disputando uma queda de braço com uma mulher negra. Ambos usam roupas executivas e seguram um livro com o braço que está livre.

Imagem: gerada pela IA do Bing a partir de instruções dos autores.

Por fim, a terceira estratégia trata do direcionamento dos sujeitos para uma competição e individualização desenfreadas. Como já foi possível perceber, aprender já não é pensado como um direito, nem como um elemento de promoção do bem comum, mas sim como uma forma de manter-se em condições de trabalhar. E é por essa razão que a aprendizagem é apresentada como um modo de superar a concorrência em um mercado saturado e com poucas oportunidades. Os sujeitos da aprendizagem ao longo da vida são sujeitos atomizados e que percebem seus colegas como concorrentes, minando a confiança e a solidariedade.

Convidamos a que acessem e leiam nosso artigo!

Para ler o artigo, acesse

OLIVEIRA, E.S. and SARAIVA, K. A aprendizagem ao longo da vida e a infinita reinvenção profissional. Pro-Posições [online]. 2024, vol. 35, e2024c0405 [viewed 30 July 2024]. https://doi.org/10.1590/1980-6248-2023-0040BR. Available from: https://www.scielo.br/j/pp/a/DD7fwPfvyCs3CtXww9Nmj9d/

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Como citar este post [ISO 690/2010]:

SARAIVA, K. O fardo da aprendizagem e da reinvenção profissional ao longo da vida [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2024 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2024/07/30/o-fardo-da-aprendizagem-e-da-reinvencao-profissional/

 

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