Isabel Oliveira e Silva, Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil.
Maria Lidia Bueno Fernandes, Universidade de Brasília, Brasil.
Paulo César Rodrigues Carrano, Universidade Federal Fluminense, Brasil.
O artigo O que crianças e adolescentes fizeram daquilo que a pandemia fez com eles e elas? interpretou dados de duas pesquisas sobre como crianças e adolescentes agiram diante dos desafios sem precedentes impostos pela pandemia de Covid-19. O estudo, publicado na Educação em Revista, foi elaborado pelos pesquisadores dos campos da infância e juventude, Isabel de Oliveira e Silva (UFMG), Maria Lidia Bueno Fernandes (UnB) e Paulo Carrano (UFF).
Utilizando dados de dois distintos campos de pesquisa, o artigo interpretou experiências geracionais e expectativas de crianças e adolescentes durante a pandemia. As pesquisas, realizadas em 2020, abrangeram dados de 33 municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte e 27 regiões administrativas do Distrito Federal, envolvendo participantes de 8 a 14 anos. Nelas, foi utilizada uma abordagem metodológica mista, combinando métodos qualitativos e quantitativos para capturar uma compreensão abrangente das interações sociais reconfiguradas pelas medidas de distanciamento social induzidas pela pandemia.
As descobertas destacam a solidariedade intergeracional, revelando que crianças e adolescentes desafiam as dicotomias tradicionais que separam adultos e crianças e expressam perspectivas críticas sobre as respostas políticas e individuais à crise. Ouvir as gerações mais jovens, também por meio de pesquisas, significa reconhecer suas formas de expressão e comunicação; e, na medida em que temos isso como princípio, conseguimos realizar o reconhecimento de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, conforme destacam as autoras e o autor do artigo.
Autores e Metodologia
O esforço colaborativo entre os autores utilizou uma abordagem de métodos mistos, envolvendo a coleta de dados censitários por meio de questionários complementados por perguntas abertas e observações. Essa metodologia, que combinou dados quantitativos e qualitativos, incluindo o uso de desenhos das crianças e adolescentes, permitiu aos pesquisadores explorar em profundidade as interpretações dos participantes sobre a experiência pandêmica que atingiu a todos.
Na busca de aproximação com os sujeitos da pesquisa, foram adotadas ferramentas tecnológicas para superar os limites impostos pelo distanciamento social na pandemia. O artigo descreve o uso do WhatsApp, de formulários e da metodologia “Bola de Neve”, que acionou diferentes atores sociais, incluindo professores, para possibilitar o acesso às crianças e adolescentes que fizeram parte da pesquisa.
No estudo, são apontados os limites do acesso à tecnologia – uma brecha digital –, em especial, no cotidiano de crianças e adolescentes em situações de vulnerabilidade e desigualdade social.
Descobertas Significativas e Impacto Social
A pesquisa revela uma preocupação significativa com a solidariedade inter e intrageracional entre crianças e adolescentes, e, nesta perspectiva, chama a atenção para a capacidade que possuem de avaliar e opinar sobre suas próprias circunstâncias de vida.
A experiência de pesquisa dos autores mostra que crianças e adolescentes podem desenvolver todas as condições de manifestar os diferentes aspectos da experiência humana, das condições que nos afetam, e que eles e elas se expressam a partir de múltiplas linguagens e de uma cultura infantil e adolescente que o “mundo adulto” não deveria negligenciar.
As crianças e adolescentes ouvidas pela pesquisa desenvolveram respostas diante da crise pandêmica, em especial, procurando criar situações de bem-estar no contexto da pandemia. São muitos os exemplos relacionados com a aquisição de novas aprendizagens, novas habilidades, de aprender, cuidar de seu espaço próprio e valorizar os vínculos afetivos com familiares. O cuidado com os animais foi algo que se destacou no conjunto das respostas de crianças e adolescentes.
São relatadas muitas experiências e situações em que crianças, em interações com adultos e com outras crianças do convívio doméstico, esforçaram-se para reconstituir um centro da vida em meio ao desafio que representou viver na pandemia de Covid-19.
As pesquisas que fundamentam o artigo também identificaram sentimentos dos participantes dos estudos, tais como medo, tristeza e alegria. Em muitas respostas, surgiu o sentimento da falta que fazia a interação com professores e outros profissionais da escola durante a pandemia. Neste sentido, os participantes apontaram a escola como o lugar da aprendizagem, mas também da amizade como elemento fundamental da socialização.
Eles também apontaram que sonhavam com o fim da pandemia, com o término do isolamento social e com a possibilidade de poder abraçar novamente. O artigo destaca que as crianças e adolescentes revelam que a sociedade deveria valorizar o cuidado e os afetos, dimensões societárias significativas que o contexto pandêmico evidenciou.
Os resultados do estudo enfatizam a necessidade crítica de políticas inclusivas que abordem as experiências e percepções únicas de crianças e adolescentes, também durante períodos de crises. Ao dar voz a esses sujeitos, o estudo desafia a perspectiva centrada no adulto, frequentemente prevalente no discurso social e na formulação de políticas.
Direções Futuras
O estudo conclui com um apelo por um maior reconhecimento da agência reflexiva das gerações mais jovens em questões sociais. As percepções obtidas a partir das pesquisas e do tratamento dos dados no artigo dão pistas significativas para informar futuras políticas e práticas destinadas a fomentar uma abordagem mais inclusiva e responsiva às necessidades e contribuições das gerações mais jovens em tempos de crise.
Referências
CARRANO, P.C.R. Juventudes: as identidades são múltiplas. Movimento: Revista da Faculdade de Educação da UFF. RJ: DP&A Editora, n.1, maio, p. 11-27, 2000.
FERNANDES, M.L.B., et al. Geografia do Confinamento: como vivem as crianças e jovens em tempos de isolamento e distanciamento social por ocasião da pandemia de COVID-19? Revista Participação [online]. 2020, ano 19, n° 34, pp. 156-158 [viewed 27 August 2024]. Available from: https://drive.google.com/file/d/1_y95_7QMT_wC8vhwQUCJamcPgTvbjtBC/view?usp=sharing
MARTÍNEZ MUÑOZ, M., RODRÍGUEZ PASCUAL, I. and VELÁSQUEZ CRESPO, G. Hacia una Sociología de Urgencia: por qué escuchar a las niñas, niños y adolescentes confinados. Documentation Social [online]. 2020b, no. 6 [viewed 27 August 2024]. https://www.documentacionsocial.es/6/ciencia-social/hacia-una-sociologia-de-urgencia-por-que-escuchar-a-las-ninas-ninos-y-adolescentes-confinados.
SILVA, I.O., et al. A escola na ausência da escola. Cad. Cedes [online]. 2022, vol. 42, no. 118, pp. 270-282 [viewed 27 August 2024]. https://doi.org/10.1590/CC253117. Available from: https://www.scielo.br/j/ccedes/a/xjdTrfz7GkfkpcpW4jdzhSb/
Para ler o artigo, acesse
SILVA, I.D.O.E., FERNANDES, M.L.B. and CARRANO, P.C.R. O que crianças e adolescentes fizeram daquilo que a pandemia fez com eles e elas? Educação Em Revista [online]. 2024, vol. 40, e45378 [viewed 27 August 2024]. https://doi.org/10.1590/0102-469845378. Available from: https://www.scielo.br/j/edur/a/XQstKHGYFFzk57GK6Shw5HB/
Links Externos
Educação em Revista – EDUR: www.scielo.br/edur/
Educação em Revista: Site | Instagram | Twitter | LinkedIn
Sobre a pesquisa no DF: Geografia do Confinamento: como vivem as crianças e jovens em tempos de isolamento e distanciamento social por ocasião da pandemia de COVID-19?: http://repositoriocovid19.unb.br/repositorio-projetos/geografia-do-confinamento-como-vivem-as-criancas-e-jovens-em-tempos-de-isolamento-e-distanciamento-social-por-ocasiao-da-pandemia-de-covid-19/
Sobre a pesquisa em Belo Horizonte – Publicações e Divulgação: https://infancia-em-tempos-de-pandemia.webnode.page/publicacoes/
Como citar este post [ISO 690/2010]:
Últimos comentários