Por Breno Bringel, Editor da Dados, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Marcelo Medeiros, Universidade de Brasília, Pedro H.G. Ferreira de Souza, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Fábio Ávila de Castro, Auditor da Receita Federal, Brasília, DF, Brasil.
A desigualdade no Brasil é mais alta do que se imaginava e permanece estável desde, pelo menos, 2006. Essas são as principais conclusões de um estudo publicado recentemente em Dados – Revista de Ciências Sociais, por Marcelo Medeiros, Pedro H. G. F. Souza e Fabio A. Castro. Esse estudo coloca em xeque parte do que se sabia sobre o nível de desigualdade no país e como essa desigualdade se comporta no tempo.
O que há de novo é o uso de dados do imposto de renda da pessoa física para calcular a desigualdade. Tradicionalmente, o monitoramento da distribuição da renda no Brasil é feito com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, a PNAD, um levantamento de excelente qualidade, mas que sabidamente subestima os mais ricos. O imposto de renda, no entanto, tem informações mais completas sobre a renda dos ricos.
O estudo destaca algo importante, mas que até o momento recebia pouca atenção: informação detalhada sobre os ricos faz diferença, pois eles detêm uma parcela enorme da renda no Brasil. Seu poder de alavancagem sobre a desigualdade é grande. E isso, responde por boa parte da diferença entre o que sabíamos com as PNADs e o que sabemos agora. Por exemplo, a desigualdade de renda entre os adultos medida com o imposto de renda é substantivamente maior do que aquela que medíamos nas PNADs. Além disso, enquanto nas PNADs a desigualdade de renda cai de 2006 a 2012, com os dados de imposto de renda ela é estável durante esse período, com flutuações mínimas.
A renda no Brasil é extremamente concentrada. Quase metade da renda do país é recebida pelos 5% mais ricos, um quarto pelo 1% no topo. A concentração é tamanha que um décimo de toda a renda de 2012 foi apropriada pelos 0,1% mais ricos, um grupo que tem cerca de 140 mil pessoas. E esse quadro é praticamente o mesmo desde, pelo menos, 2006.
A metodologia para obter esses resultados depende de imputações e combinações de dados de fontes diferentes. Isso tem riscos inerentes e, portanto, as conclusões desse estudo devem ser tratadas com cautela. É possível, por exemplo, que a desigualdade ainda esteja subestimada. É bem provável que, no futuro, novas pesquisas venham a revisar esses resultados, quando houver acesso a dados mais completos do imposto de renda.
O que não há dúvida é de que temos um sinal de que é importante entender os ricos para se entender a desigualdade no Brasil. Até agora nossas pesquisas mediam apenas uma parte da desigualdade. Medíamos bem os pobres. Agora podemos medir melhor o outro lado da desigualdade brasileira, os ricos.
Neste mesmo número de Dados outros artigos contribuem, de maneira inovadora, para o debate sobre renda, relações sociais e classes no Brasil. O professor da UFJF, José Alcides Figueiredo Santos, examina os principais deslocamentos de renda entre as posições de classe que se deram no Brasil entre 1992 e 2011. De acordo com sua análise – que inclui perdas de renda, vantagens de classe e autoridade da estrutura social – a subordinação da distribuição da renda ao ordenamento de classe da sociedade brasileira manteve-se claramente definida.
Já Carlos Antonio Costa Ribeiro, professor do IESP-UERJ, elabora um modelo estatístico para descrever, para além da renda e das condições materiais, os principais fatores correlacionados à “felicidade” da população. Diversas formas de relações sociais e de percepções são apontadas pelo autor para explicar a variação na distribuição do bem-estar subjetivo.
Finalmente, André Salata, professor da PUCRS, ao focar-se nas percepções dos brasileiros sobre a classe média contribui a deslocar o atual debate sobre a classe média no Brasil para as identidades de classe. A pergunta “quem é classe média no Brasil?” é respondida pelos próprios brasileiros e os resultados alcançados mostram que os indivíduos de perfil socioeconômico intermediário não são aqueles que habitualmente se percebem como classe média. Seria apenas entre aqueles mais privilegiados, onde Salata verifica uma identificação mais provável com esta classe.
Para ler os artigos, acesse
MEDEIROS, M.; SOUZA, P. H. G. Ferreira de and CASTRO, F. A. de. O Topo da Distribuição de Renda no Brasil: Primeiras Estimativas com Dados Tributários e Comparação com Pesquisas Domiciliares (2006-2012). Dados [online]. 2015, vol.58, n.1, pp. 7-36. [viewed 01st June 2015]. ISSN 0011-5258. DOI: 10.1590/00115258201537. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0011-52582015000100007&lng=en&nrm=iso
RIBEIRO, C. A. C. Renda, Relações Sociais e Felicidade no Brasil. Dados [online]. 2015, vol.58, n.1, pp. 37-78. [viewed 01st June 2015]. ISSN 0011-5258. DOI: 10.1590/00115258201538. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0011-52582015000100037&lng=en&nrm=iso
SANTOS, J. A. F. Classe Social e Deslocamentos de Renda no BrasilClasse Social e Deslocamentos de Renda no Brasil. Dados [online]. 2015, vol.58, n.1, pp. 79-110. [viewed 01st June 2015]. ISSN 0011-5258. DOI: 10.1590/00115258201539. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0011-52582015000100079&lng=en&nrm=iso
SALATA, A. R. Quem é Classe Média no Brasil? Um Estudo sobre Identidades de Classe*. Dados [online]. 2015, vol.58, n.1, pp. 111-149. [viewed 01st June 2015]. ISSN 0011-5258. DOI: 10.1590/00115258201540. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0011-52582015000100111&lng=en&nrm=iso
Link externo
Dados – Revista de Ciências Sociais – http://www.scielo.br/dados/
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