Cláudia Lemos Vóvio e Rogério de Almeida, Editores assistentes de Educação e Pesquisa, São Paulo, SP, Brasil
Há pelo menos três décadas, no cenário nacional, conforma-se um campo autônomo de estudos, com interesse crescente de pesquisadores em temas relativos ao processo de profissionalização, à constituição identitária e ao trabalho docente, com enfoques diversificados (ANDRÉ, 2009; 2010; DINIZ-PEREIRA, 2013). Em entrevista concedida à Carlota Boto, António Nóvoa afirma que “nunca se escreveu tanto como hoje acerca da formação docente, nunca houve tantos congressos e revistas científicas, tantos doutorados e pesquisas”. Em grande medida, na conformação desse campo, o autor tem sido uma referência fundamental para os estudos sobre a construção histórica da profissionalização docente e seus desafios, bem como sobre as problemáticas da escolarização. Nóvoa, segundo Boto (2018, p. 1) é “uma voz fundamental no debate educacional contemporâneo, abordando aspectos acerca da organização histórica e da atualidade do moderno modelo escolar”. Quando interpelado sobre sua história de vida, reconstrói sua trajetória com vistas a atribuir sentido à sua experiência atual, ao modo como se constituiu professor e às suas contribuições para o campo da Educação. Sem furtar-se ao exercício de reflexão sobre questões que intervêm na profissionalização e trabalho docente, denuncia as dificuldades das instituições que se ocupam desse processo em renovar-se diante das necessidades formativas desses profissionais e a desvalorização da categoria e de seu estatuto profissional, fenômenos de dimensão global. Por fim, encoraja-nos a enfrentar os desafios contemporâneos da ciência e da educação, por meio da reinvenção de modos de ver e pensar.
Nesse sentido, a formação de professores, seja em sua inflexão inicial ou continuada, também se coloca como tema fundamental das pesquisas em Educação Infantil, principalmente diante das importantes e profundas ressignificações pelas quais tem passado. As crianças pequenas já não são mais consideradas como folha em branco, tabula rasa, modelável ao gosto dos adultos, mas produtoras de cultura. O desafio que se impõe é saber até que ponto o adulto está atento às manifestações culturais infantis e às produções culturais para a infância.
Essa questão é enfrentada pelo artigo “Desafios da investigação com crianças na formação de professores: contributos da sociologia da infância”, de Ana Cristina Paios, que contrapõe o que chama de ofício de aluno à competência do investigador em antever os desafios da investigação com crianças e seu potencial para formação de professores. O ofício de aluno é discutido como condição social da criança, definida pelas expectativas de apropriação da cultura escrita, da capacidade de abstração e da disciplina na organização do trabalho, atividades direcionadas pelo adulto, que subalternizam o papel da criança no processo educativo, ignorando a complexidade dos atos que elas desenvolvem, como observado nas brincadeiras. Em contrapartida, a autora propõe a construção, no processo investigativo e, portanto, formativo, de opções teóricas ecléticas, que busquem compreender o ponto de vista das crianças sobre si e sobre o mundo, além de uma perspectiva metodológica plural, capaz de captar as formas de comunicação da criança.
No artigo, “Compartilhar, estudar, ampliar olhares: narrativas docentes sobre formação continuada”, Gabriela Alves de Souza Vasconcelos dos Reis e Luciana Esmeralda Ostetto investem nas narrativas autobiográficas das professoras de Educação Infantil como instrumento metodológico para extrair experiências que contribuem para a continuidade do processo formativo. A docência é tomada como processo que requer a constante reflexão, num exercício cíclico entre teoria e prática. Os resultados da pesquisa apontam que a formação continuada de professores da Educação Infantil potencializa-se à medida que se constitui como espaço-tempo de estudo, a partir da integração de experiências pessoais, da troca de saberes e fazeres e do princípio da escuta das vozes desses profissionais.
Referências
ANDRÉ, M., E. D. A. A produção acadêmica sobre formação de professores: um estudo comparativo das dissertações e teses defendidas nos anos 1990 e 2000. Revista Formação Docente, v. 1, n. 1, p. 41-56, 2009. ISSN: 2176-4360 [acessado 7 dezembro 2018]. Available from: http://revformacaodocente.com.br/index.php/rbpfp/article/view/v1n1_2b
ANDRÉ, M. Formação de professor: a constituição de um campo de estudos. Educação, v. 33, n. 3, p. 174-181, 2010. ISSN: 1981-2582 [viewed 7 december 2018]. Available from: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/view/8075
DINIZ-PEREIRA, J. E. A construção do campo da pesquisa sobre a formação de professores. Educação e Contemporaneidade, v. 22, n. 40, p. 145-154, 2013. ISSN: 2358-0194 [viewed 7 december 2018]. Available from: https://www.revistas.uneb.br/index.php/faeeba/article/view/758
Para ler os artigos, acesse
BOTO, C. António Nóvoa: uma vida para a educação. Educ. Pesqui., v. 44, e201844002003, 2018. ISSN: 1517-9702 [viewed 7 december 2018]. DOI: 10.1590/s1678-4634201844002003. Available from: http://ref.scielo.org/m9wt28
PALOS, A. C. Desafios da investigação com crianças na formação de professores: contributos da sociologia da infância. Educ. Pesqui., v. 44, e182055, 2018. ISSN: 1517-9702 [viewed 7 december 2018]. DOI: 10.1590/s1678-4634201844182055. Available from: http://ref.scielo.org/qf4n5w
REIS, G. A. de S. V. dos; OSTETTO, L. E. Compartilhar, estudar, ampliar olhares: narrativas docentes sobre formação continuada. Educ. Pesqui., v. 44, e180983, 2018. ISSN: 1517-9702 [viewed 7 december 2018]. DOI: 10.1590/s1678-4634201844180983. Available from: http://ref.scielo.org/kvk2rg
Link externo
Educação e Pesquisa – EP: www.scielo.br/ep
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