Joel Birman, Editor de Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
O periódico, especializado na área da psicanálise, tem como objetivo promover uma interação efetiva entre esse e outros campos de saber, constituindo, assim, um espaço aberto para o debate pluralista. Isso não se dá apenas por meio do diálogo entre diversos campos de saber, mas também, em relação à pluralidade institucional e a diversidade regional dos autores, seja do Brasil como de outros países. Visando à internacionalização, a maioria dos artigos do volume 19, número 3, foi publicada em português e em Inglês, o que contribui para a ampliação do alcance de leitores em diversos países.
No que concerne aos temas dos artigos, a constituição do sujeito é abordada por Débora Maria Gomes Silveira e Ângela Maria Resende Vorcaro, no estudo “Da Verneinung ao traço unário” que articularam as considerações freudianas acerca do Verneinung à noção de sujeito como implicada na formulação lacaniana sobre o traço unário. Para fundamentar essa articulação, as autoras realizaram um estudo das identificações e um percurso pelos textos que trabalham a função constitutiva da falta. Fernando Tenório trabalha a hipótese de que a “morte do sujeito” pode constituir uma abertura para a representação ou um limite real para o psicótico. Para isso, o autor parte da formulação lacaniana de que, em Schreber, ocorreu um momento de “morte do sujeito” que possibilitou a construção do delírio.
A constituição do sujeito situada no contexto contemporâneo é tematizada por Tania Coelho dos Santos em “O outro que não existe: verdade verídica, verdades mentirosas e desmentidos veementes” que trabalha a hipótese de que, na contemporaneidade, vivemos sob o imperativo sadiano do gozo que tomou o lugar da economia psíquica kantiana fundada na renúncia ao gozo em nome do Bem. Desse modo, a autora defende que a configuração que prevalece na economia psíquica contemporânea é muito mais ligada ao par sinthoma-pedestal, do que ao par castração-inconsciente.
A relação do sujeito com o corpo é trabalhada no artigo intitulado “O enigma corporal na clínica psicanalítica” de Maria Leonor Sampaio Bicalho pretende evidenciar os desafios colocados pelo trabalho com o corpo na clínica psicanalítica. Considerando que o sujeito tenta dar sentido ao indizível, expresso no enigma corporal, a autora aborda o saber que o sujeito constrói em análise como algo que corresponde a um novo enlaçamento entre a linguagem, o gozo e o real do corpo.
Ainda em relação ao corpo, Cristina Lindenmeyer em “Figuras coreográficas do corpo” faz uma incursão epistemológica que pretende reler do estatuto do corpo na psicanálise freudiana. Partindo do corpo a corpo inicial com o outro, a autora discute as relações entre corpo, sexualidade psíquica e conflitualidade inconsciente, propondo uma concepção do corpo não apenas como limite que separa, mas como algo que abre o sujeito para o contato com os fantasmas. A relação entre corpo e sexualidade é trabalhada, também, por Vladimir Safatle na pesquisa “Permanecer histérica: sexualidade e contingência a partir do caso Dora” que, a partir do caso Dora, retoma o conceito freudiano de histeria para propor uma discussão sobre a sexualidade e a contingência, abordando os conflitos que atravessam a constituição singular de identidades de gênero.
A transferência foi outro tema bastante trabalhado em alguns artigos. Sob o título de “O manejo transferencial em Freud: uma análise da relação entre transferência e sugestão” Diego Diz Ferreira e Christiane Carrijo fizeram uma análise da relação entre transferência e sugestão no texto freudiano. Partindo da categoria de neurose de transferência, os autores buscam responder algumas críticas direcionadas à psicanálise, sobretudo, que esta é uma terapêutica cuja eficácia é assegurada pelo fenômeno da sugestibilidade do cliente na figura do analista.
A relação transferencial também é abordada por Juliana Castro-Arantes, no estudo “Os feitos não morrem: psicanálise e cuidados ao fim da vida” que discute a intervenção do psicólogo em uma unidade de cuidados paliativos, contemplando o lugar da escuta como condição de possibilidade para que o sujeito, situado no limite de sua existência, possa traçar uma escrita de sua história. A transferência relacionada a situações limites também é abordada por Fabiana C. Ratti e Ivan Ramos Estevão, no artigo “Violência, acidente e trauma: a clínica psicanalítica frente ao real da urgência e da emergência”, discute a atuação do psicanalista face a situações de urgência e de emergência. A partir de Jacques Lacan, os autores trabalharam a noção de identificação, o manejo clínico de testemunho e de secretariado e a função de objeto a no ato de analista, como também, o trauma como relacionado ao registro do Real.
A articulação entre psicanálise e arte foi trabalhado no artigo “Psicanálise e arte: uma articulação a partir da não relação em Louise Bourgeois: o retorno do desejo proibido” de Gisele Falbo Kosovski que pretende oferecer alguns balizadores para se pensar a articulação entre esses dois modos de apreender o real pelo simbólico, marcando a importância de se trabalhar a partir da interseção e do entrecorte entre esses dois campos de saber.
A relação entre arte e psicanálise, somada à dimensão política e cultural, é tangenciada por Luciana Torquato e Guilherme Massara Rocha em “A peste no Brasil: a introdução das ideias freudianas no Brasil a partir da medicina e do modernismo”. Os autores debateram a recepção da teoria freudiana no Brasil a partir de duas vias discursivas, a arte modernista e a medicina higienista que, por sua vez, estava ligada ao projeto de nação que ecoava no Brasil desde o final do século XIX.
A relação entre psicanálise, sociedade e política também é contemplada por Eliane Domingues no estudo “Militância no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST): um olhar psicanalítico”, a autora se propõe a pensar a militância política como uma prática que tem a potência de ressignificar o passado do sujeito e promover uma revitalização narcísica. Ainda sobre o diálogo entre laço social, cultura e psicanálise, o artigo “Provas do intraduzível de uma língua para outra” de Rajaa Stitou discute o tema do intraduzível como algo estruturador para o sujeito na sua articulação com o vínculo social. A questão do intraduzível é situada no contexto da globalização e discutida em dois planos: o da violência (ligada ao totalitarismo da língua e ao não reconhecimento do outro) e o da criatividade, como a inventividade através da transferência.
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Ágora (Rio J.) vol.19 no.3 Rio de Janeiro Sept./Dec. 2016 – <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=1516-149820160003&lng=en&nrm=iso>
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