A hemofilia e a exclusão à saúde no Brasil e no Mundo

Cláudio Lorenzo, Docente do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Saúde, Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil.

Mariana Sayago, Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Bioética da Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil.

No artigo “O acesso global e nacional ao tratamento da hemofilia: reflexões da bioética crítica sobre exclusão em saúde”, publicado no periódico Interface — Comunicação, Saúde, Educação (vol. 24), foi examinado, na perspectiva da Bioética Crítica, o problema do acesso global ao concentrado de fator de coagulação por portadores de hemofilia e o programa brasileiro de tratamento para esta enfermidade. A pesquisa foi desenvolvida entre os anos de 2018 e 2019 por meio de uma pesquisa documental cujo corpus foi formado pelo relatório da Federação Mundial de Hemofilia (WFH) de 2017 e por textos de portarias, programas, notícias e relatórios do Ministério da Saúde sobre o tratamento da hemofilia no Brasil. Demonstrou-se um quadro marcado por extremas disparidades de acesso tanto em nível global quanto nacional, implicados em mortes precoces e lesões incapacitantes em milhares de pessoas.

O estudo é resultado da pesquisa de mestrado de Mariana Sayago (2019) e foi motivado pela experiência da mesma na assistência à portadores de hemofilia com lesões graves. Utilizou-se o índice de uso do concentrado de fator per capita por ano para estimar a qualidade da assistência, como preconizado pela WFH. Um índice menor que 1UI per capita/ano é considerado abaixo do mínimo necessário para garantir a sobrevivência dos portadores, e um índice de 3 UI per capita/ano é o mínimo considerado necessário para preservar a função articular e permitir uma qualidade de vida semelhante à de um indivíduo sem hemofilia. Após seleção de dados no corpus documental produziu-se uma reflexão tomando-se como base os parâmetros analíticos da Bioética Crítica, modelo teórico cuja análise dos conflitos éticos em saúde é feita pela articulação entre a Teoria Crítica e os Estudos da Colonialidade.

Foi possível demonstrar, com base na literatura, que a maior dificuldade para o acesso é o custo do concentrado de fator, cujo preço é determinado livremente pelo oligopólio mundial formado por doze empresas localizadas em países centrais. O resultado disso é que apenas 25% dos cerca de duzentos mil  hemofílicos do mundo possuem tratamento apropriado e enquanto o índice de uso per capita de concentrado de fator alcança respectivamente 6 UI/ano e 9,5 UI/ano na Europa e Estados Unidos, ele não ultrapassa 0,04 UI nos países mais pobres da África e Caribe. O Brasil apresenta um índice geral de 3,7 UI, mas mostra-se marcado por acentuadas iniquidades regionais semelhante às globais. Enquanto, por exemplo, no Distrito Federal o índice atingiu 7, 22 UI, ele foi de apenas 0, 27 UI em Roraima.

Concluiu-se, a partir da aplicação dos parâmetros analíticos da Bioética Crítica que esse panorama é causado pela formação histórica de um sistema mundo colonial baseado na dominação pelos países centrais sobre os meios materiais tais como equipamentos e matérias primas; sobre as ideias tais como as que estruturam as regras da propriedade intelectual sobre medicamentos; e  sobre as instituições tais como industrias, universidades e organismos internacionais. Diante desse quadro nós reivindicamos uma produção científica e uma regulação para o desenvolvimento e distribuição de tecnologias comprometidas com o cumprimento do direito fundamental à saúde.

A seguir, assista ao vídeo de Cláudio Lorenzo ampliando a discussão do tema.

Referências

WORLD FEDERATION OF HEMOPHILIA. Annual Global Survey 2017. Montréal, Québec, 2018. [viewed 26 June 2020]. Avaliable from: http://www1.wfh.org/publications/files/pdf-1714.pdf

Para ler o artigo, acesse

SAYAGO, M. and LORENZO, C. O acesso global e nacional ao tratamento da hemofilia: reflexões da bioética crítica sobre exclusão em saúde. Interface (Botucatu) [online]. 2020, vol. 24, e180722, ISSN: 1807-5762 [viewed 26 June 2020]. DOI: 10.1590/interface.180722. Avaliable from: http://ref.scielo.org/spw8pt

Links externos

Interface – Comunicação, Saúde, Educação – ICSE: www.scielo.br/icse

http://fs.unb.br/extensao/saude-coletiva

http://fs.unb.br/pos-graduacao/bioetica

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

LORENZO, C. and SAYAGO, M. A hemofilia e a exclusão à saúde no Brasil e no Mundo [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2020 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2020/07/21/a-hemofilia-e-a-exclusao-a-saude-no-brasil-e-no-mundo/

 

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