Paula Fontana Fonseca, Psicanalista, Doutora em Educação pela FEUSP, Psicóloga do Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da USP, São Paulo, SP, Brasil
Como podemos pensar a articulação entre educar, cuidar e brincar, de modo que essas ações possam ser tomadas como fundamentos para uma presença interessada do educador?
Para dar lastro à pergunta e subsídios à resposta, o artigo “O laço educador-bebê se tece no enodamento entre cuidar, educar e brincar”, publicado no periódico Educação & Realidade (v. 43, n. 4), propõe uma discussão dos termos educar, cuidar e brincar tanto no âmbito dos documentos que fundamentam as políticas de Educação Infantil como na literatura psicanalítica que se debruça sobre a primeira infância.
A literatura psicanalítica propõe que a atenção dada aos bebês na creche seja fruto de uma articulação moebiana entre cuidar e educar (MARIOTTO, 2009). Essa figura topológica tem por característica subverter a lógica espacial por meio de uma semi-troção em uma fita. A superfície que anteriormente tinha dois lados – o direito e o avesso – passa a oferecer uma experiência de continuidade. Assim, cuidar e educar deixam de ser entendidos como duas ações que concorrem no trabalho educativo e passam a comparecer como imbricadas de modo indissociável em uma mesma ação. Cuida-se e educa-se ao mesmo tempo na creche.
Esse entendimento deu lugar para a pergunta acerca do brincar nesse binômio: esses três termos poderiam também ser fundamento para uma mesma ação do educador, ou seja, estariam eles articulados moebianamente? Em caso afirmativo, como demonstrar essa relação?
O artigo busca a forma como o brincar comparece no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI). Publicado pelo Ministério da Educação (BRASIL, 1998), o documento contou com uma ampla divulgação nos estados uma vez que foi um indutor de políticas públicas e programas de Educação Infantil com o objetivo de oferecer parâmetros e orientações para o exercício profissional cotidiano.
O brincar comparece no RCNEI fundamentado dentro da lógica do brincar simbólico. De modo a problematizar esta concepção e ampliar as possibilidades de entendimento do brincar com bebês, a autora recupera a noção de jogos precursores do brincar simbólico e afirma que já nas interações iniciais do bebê há um brincar sendo exercido. O brincar com a criança assume, nessa perspectiva, a possibilidade de “[…] sustentar a condição para que ela possa vir a ser autora de atos criativos, sustentado seu lugar de sujeito ali onde a fala ainda se revela insuficiente, mas que podem ser exercidos na esfera protegida do brincar” (JERUSALINSKY, 2011, p. 260). Esse brincar depende de que um outro prestativo o nomeie enquanto tal e entre no jogo, se ofereça para o bebê ali onde ele o necessita. Isso expande a definição de brincar e jogar no universo da primeira infância e tem consequência direta no que a educação pode propor como função do professor.
O artigo busca nas propriedades da figura topológica da banda de Moebius uma forma de pensar a relação ente os termos na qual não haveria prevalência de um sobre o outro. Conclui, enfim, que a articulação entre educar, cuidar e brincar é moebiana uma vez que o brincar efetiva-se como ato de cuidar-educar.
Referências
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.
MARIOTTO, R. M. M. Cuidar, educar e prevenir: as funções da creche na subjetivação de bebês. São Paulo: Escuta/FAPESP, 2009.
JERUSALINSKY, J. A criação da criança: brincar, gozo e fala entre mãe e bebê. Salvador, BA: Ágalma, 2011.
Para ler o artigo, acesse
FONSECA, P. F. O Laço Educador-Bebê se Tece no Enodamento entre Cuidar, Educar e Brincar. Educ. Real. [online]. 2018, vol.43, n.4, pp.1555-1568. ISSN 0100-3143. [viewed 21 Junuary 2019] DOI: 10.1590/2175-623675614. Available from: http://ref.scielo.org/mmptb3
Link externo
Educação & Realidade – EDREAL: www.scielo.br/edreal
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