A trajetória intelectual de Antonio Paim (1927-2021): vivências de um filósofo brasileiro

Rodrigo Jurucê Mattos Gonçalves, Professor da Universidade Estadual de Goiás, Morrinhos, GO, Brasil. 

O artigo “A longa trajetória de um intelectual brasileiro: Antonio Paim, filósofo e historiador das ideias” apresenta uma síntese da trajetória do intelectual baiano, seguida da última entrevista que o autor concedeu, poucos meses antes de seu falecimento em 30 de abril de 2021.

Paim foi um dos mais destacados historiadores das ideias brasileiros, autor de dezenas de livros, artigos, opúsculos, entre outros, e daquela que é considerada sua obra principal: “A história das ideias filosóficas no Brasil”, publicada originalmente em 1967 e com sucessivas republicações revistas e aumentadas, sendo a sexta e última edição de 2020 (preparada por Antônio Roberto Batista; prefácio de Ricardo Vélez Rodríguez. Campinas: Távola Editorial, 2020).

O filósofo se aposentou da docência universitária no fim da década de 1980, mas permaneceu ativo até os últimos anos de vida com a publicação, em 2019, dos livros “Personagens da Política Brasileira” e “Marxismo e descendência”, neste caso a segunda edição deste que foi um acerto de contas com o passado marxista.

O artigo sobre a trajetória intelectual de Paim traz a lume um dos resultados da nossa pesquisa de pós-doutorado, dando continuidade aos estudos que viemos fazendo sobre os intelectuais que foram ligados ao antigo Instituto Brasileiro de Filosofia (IBF) e seu órgão oficial, a Revista Brasileira de Filosofia, na qual Paim foi um colaborador proeminente.

Imagem: Instituto de Humanidades.

A metodologia empregada partiu da pesquisa bibliográfica das obras de Paim e de seu comentadores, na perspectiva da história dos intelectuais. A entrevista realizada em janeiro de 2021 fez parte do processo de produção e coleta de fontes primárias, que são base do trabalho dos historiadores. Durante a formulação das perguntas, buscou-se centrar nas vivências do filósofo ao longo da história.

Na entrevista, Paim relata a militância quando jovem no Partido Comunista Brasileiro (PCB). Em 1947, quando o registro do PCB foi cassado, ele acabou sendo preso ao resistir ao fechamento do jornal do partido Tribuna Popular, no qual trabalh

ava ao lado de João Saldanha. Cumpriu 2 anos e 2 meses de pena, quando escreveu “A filosofia da Escola do Recife” a partir de leituras realizadas na biblioteca da cadeia.

Outra passagem marcante foi a formação marxista com o doutorado realizado na Universidade Lomonosov de Moscou, Rússia. Na década de 1960, estudou por longos dezesseis anos a “Crítica da Razão Pura”, de Kant, com o professor Leandro Ratsbona, da antiga Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro.

A substituição do marxismo pelo kantismo não deixou de ter contornos dramáticos, pelo fato de que, uma coisa foi sair do PCB nos idos anos 1950, outra coisa foi transformar a forma de pensar, de marxista para kantiana, o que é bem mais complexo e demorado. Neste interim, o ex-marxista se aproximou do IBF, em São Paulo, e fez amizade com Luís Washington Vita, que o incentivou a escrever sua obra principal, na qual se afastou de qualquer resquício materialista.

Nos anos 1980 e 1990, foi assessor de Jorge Bornhausen, que era presidente do Instituto Tancredo Neves – fundação do extinto Partido da Frente Liberal (PFL) –, onde ministrava cursos de formação aos dirigentes partidários. A trajetória de Paim como um eminente liberal já estava assim traçada, sendo reconhecido como um dos principais intelectuais contemporâneos do liberalismo brasileiro.

Estas são apenas algumas passagens da longa trajetória do filósofo baiano. Paim conheceu o que é ser dissidência, quando foi membro do PCB e acabou sendo um preso político, e o que é ser ligado ao establishment, quando foi assessor da presidência do PFL.

A longa trajetória intelectual do filósofo, com suas mudanças e intensidades, se refere à própria História do Brasil republicano, com suas reviravoltas e passagens dramáticas, em paralelo quando se assistiu a ascensão do PCB no pós-Segunda Guerra Mundial e, mais tarde, a ascensão do liberalismo na Nova República. Exemplos de situações vividas por ele. Sendo um relato inédito, a entrevista ajuda a compreender a cultura intelectual brasileira da segunda metade do século XX e como se articulam os intelectuais em relação ao poder.

Referências

CRISÓSTOMO, J.S., ANDRADE, R. and PAIM, A. Crisóstomo e Ricardo Andrade conversam com Antônio Paim sobre Filosofia no Brasil [Entrevista]. Available from: https://www.anpof.org/comunicacoes/entrevistas/crisostomo-e-ricardo-andrade-conversam-com-antonio-paim-sobre-filosofia-no-brasil-1.

GONÇALVES, R.J. A restauração conservadora da filosofia: O Instituto Brasileiro de Filosofia e a autocracia burguesa no Brasil (1949-1964). Goiânia: Gárgula/Kelps, 2020.

GONÇALVES, R.J. and COSTA NETO, P.L. O Instituto Brasileiro de Filosofia e a Revista Brasileira de Filosofia: um exemplo de aparelho ideológico da intelectualidade conservadora. In: COSTA NETO, P.L., MACIEL, D. and GONÇALVES, R.J. (Orgs.). Intelectuais, política e conflitos sociais. Goiânia: Edições Gárgula.

GONÇALVES, R.J. Os Juristas Orgânicos da Ditadura e a Revista Brasileira de Filosofia (1964-1968). São Paulo: Pimenta Cultural, 2022.

MERCADANTE, P. Antonio Paim: a trajetória ao liberalismo. Revista Brasileira de Filosofia [online]. 1997, vol. 44, no. 186.

SOVERAL, E.A. Algumas notas sobre o liberalismo pedagógico de Antonio Paim. Revista Brasileira de Filosofia [online]. 1997, vol. 44, no. 186, pp. 166-169.

Links externos

Site do Centro de Documentação do Pensamento Brasileiro (CDPB), fundado por Antônio Paim: http://www.cdpb.org.br

Site do Instituto de Humanidades, fundado e presidido por Antonio Paim em 1986: http://www.institutodehumanidades.com.br

Página do autor: https://ueg.academia.edu/RodrigoJurucê

Site da Trans/Form/Ação – Revista de Filosofia: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/transformacao/index.

Trans/Form/Ação: Revista de Filosofia: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/transformacao/index